Entenda a ideologia por trás da quebradeiraClassificados de vândalos, jovens que promovem destruição nos protestos seguem o Black Bloc, movidos por ideais anarquistas
Publicação: 30/06/2013 06:00 Atualização: 30/06/2013 08:32
Daniel Camargos e Alessandra Mello
Durante a batalha de quarta-feira, com os rostos cobertos, manifestantes orientados por gritos combinados dos Black Blocs queimaram concessionárias na Avenida Antônio Carlos e usaram tapumes como escudos |
Pouco depois das 23h da última quinta-feira, durante a quarta Assembleia Popular que acontecia embaixo do Viaduto Santa Tereza, em Belo Horizonte, um jovem pediu a palavra e falou ao microfone: “Se vocês querem mudar e enfrentar a repressão, não será com cartaz. Tem que ter tropas para combater os cassetetes. Nós somos a tropa de choque do povo, somos o Black Bloc. Eu sou um vândalo, se é assim que a mídia me chama”. A fala do jovem, que se identificou como João, assustou as cerca de 200 pessoas que ainda estavam na assembleia e é uma das poucas faces nítidas de um movimento que intriga a polícia. Investigações tentam entender como atuam e quem são os mineiros alinhados com o grupo que tem ideologia anarquista.
Na última quarta-feira, durante a batalha que ocorreu nas avenidas Abrahão Caram e Antônio Carlos, foi possível identificar um grupo de manifestantes que partiram para o embate com a polícia e seguiam táticas definidas. Classificados como vândalos pela polícia, eles se orientavam com gritos combinados, usavam tapumes como escudos, escondiam o rosto e não hesitavam em devolver as bombas de gás lacrimogêneo em direção aos militares.
Saiba mais...
Movimento antipacifista atua em protestos em BH Avenida Antônio Carlos pode ter debandada de comerciantes após protestos Custo já estimado da depredação no país ultrapassa R$ 6 bilhões Rio deve ser o cenário hoje do maior ato desde o início dos protestosOutro ponto identificado nas investigações é que os alvos principais do Black Bloc são os patrocinadores da Fifa, entre eles a fabricante de automóveis Hyundai e o Banco Itaú. Na batalha de quarta-feira em BH, a depredação foi iniciada numa revenda Hyundai e numa concessionária da Kia Motors, do mesmo grupo empresarial da Hyundai na Coreia, sede das duas. Porém, no Brasil, são representadas por grupos distintos.
“Esse grupo é organizado, mas existem pessoas que chegam lá por causa do calor e da emoção. Outros com passagens pela polícia que aproveitam para furtar. Tem de tudo nessas manifestações”, entende Paloma, mostrando que o grupo não consegue controlar os ataques traçados antes das manifestações.
O Black Bloc é hostil à imprensa. Um e-mail enviado pela reportagem com várias perguntas foi respondido com um texto panfletário. “Somos o grupo que está na frente das grandes manifestações em momentos de conflito. Não somos nós que iniciamos, somos nós que seguramos a bomba e tomamos tiro para que o restante possa correr. Enquanto a maioria corre, nós retardamos o opressor ao máximo”, informa o grupo.
O texto destaca que não existe uma organização fixa e que o grupo pode ser visto como “coletivo temporário de anarquistas”. O grupo nega que existam líderes e também diz que não há reuniões e que os integrantes têm entre 17 e 30 anos. “A corporação policial torna-se nossa inimiga somente a partir do momento em que suas ações tomam caráter opressor ou repressor. Somos pessoas como quaisquer outras, temos vida, temos que estudar e trabalhar”, conclui o texto.
Referências
Um dos guias para os seguidores é um manual de 397 páginas chamado The Black Bloc Papers, disponível on-line, com um histórico dos principais confrontos e também um detalhamento das estratégias recomendadas para os manifestantes radicais. O manual ensina noções de primeiros socorros, o que fazer em caso de prisão e recomenda dicas básicas, como sempre levar uma camisa diferente na mochila, para não ficar marcado pela polícia e poder fugir após os conflitos.
O BB não remete a movimentos anarquistas da década de 1980, mas, depois da onda de protestos, ganhou novos adeptos no Brasil e muitas páginas nas redes sociais. Caso do Black Bloc mineiro, que abriu seu canal de informação no Facebook no dia 21, quatro dias depois da segunda manifestação na capital mineira, que reuniu cerca de 30 mil pessoas. Hoje já existem páginas do movimento em pelo menos nove estados, todas criadas depois do início dos protestos pela redução das tarifas na capital paulista.
Além dos perfis nas redes sociais, o grupo tem como canal de comunicação um programa de computador usado para conversas on-line entre jogadores de videogame ou o TwitCasting, que permite transmitir um vídeo ao vivo a partir de aparelhos de telefone celular. Também trocam fotos, sempre imagens de confronto com a polícia ou cenas de depredação, mensagens de solidariedade entre os grupos, instruções sobre como agir nos protestos, vídeos e textos doutrinários.
Somente o Black Bloc Brasil, grupo criado no Facebook em 2012, já tem quase 200 mil seguidores. Na página, uma foto de manifestantes quebrando uma estação de metrô e uma citação do Jack Kerouac, escritor norte-americano, símbolo da geração beatnik, autor de On the road: “Aqui estão os loucos. Os desajustados. Os rebeldes. Os criadores de caso. Os pinos redondos nos buracos quadrados. Aqueles que veem as coisas de forma diferente. Eles não curtem regras. E não respeitam o status quo. Você pode citá-los, discordar deles, glorificá-los ou caluniá-los. Mas a única coisa que você não pode fazer é ignorá-los. Porque eles mudam as coisas”.
Estudo
O BB não remete a movimentos anarquistas da década de 1980, mas, depois da onda de protestos, ganhou novos adeptos no Brasil e muitas páginas nas redes sociais. Caso do Black Bloc mineiro, que abriu seu canal de informação no Facebook no dia 21, quatro dias depois da segunda manifestação na capital mineira, que reuniu cerca de 30 mil pessoas. Hoje já existem páginas do movimento em pelo menos nove estados, todas criadas depois do início dos protestos pela redução das tarifas na capital paulista.
Além dos perfis nas redes sociais, o grupo tem como canal de comunicação um programa de computador usado para conversas on-line entre jogadores de videogame ou o TwitCasting, que permite transmitir um vídeo ao vivo a partir de aparelhos de telefone celular. Também trocam fotos, sempre imagens de confronto com a polícia ou cenas de depredação, mensagens de solidariedade entre os grupos, instruções sobre como agir nos protestos, vídeos e textos doutrinários.
Somente o Black Bloc Brasil, grupo criado no Facebook em 2012, já tem quase 200 mil seguidores. Na página, uma foto de manifestantes quebrando uma estação de metrô e uma citação do Jack Kerouac, escritor norte-americano, símbolo da geração beatnik, autor de On the road: “Aqui estão os loucos. Os desajustados. Os rebeldes. Os criadores de caso. Os pinos redondos nos buracos quadrados. Aqueles que veem as coisas de forma diferente. Eles não curtem regras. E não respeitam o status quo. Você pode citá-los, discordar deles, glorificá-los ou caluniá-los. Mas a única coisa que você não pode fazer é ignorá-los. Porque eles mudam as coisas”.
Estudo
Jeffrey Juris é professor de antropologia do Departamento de Sociologia e Antropologia da Northeastearn University, em Boston, nos Estados Unidos, e estudou os Black Blocs após os conflitos em Gênova, na Itália, em 2001, durante encontro dos oito países mais ricos do mundo, o G-8, quando um manifestante foi morto atingido por uma arma de fogo.
Juris explica que o Black Bloc não é uma organização, mas um conjunto de táticas editadas e difundidas pela internet por grupo de jovens militantes durante os protestos. Geralmente, mas sem ser uma regra, eles vestem calças e blusas pretas, botas e máscaras ou bandanas para cobrir o rosto. Aas máscaras servem para esconder a identidade, mas também tem outra função: “Expressar solidariedade coletiva através do anonimato e retratar imagens típicas da rebeldia juvenil”, afirma Juris. Ainda segundo o acadêmico, eles têm uma postura anticapitalista e rejeitam o mercado e o Estado.
Juris explica que o Black Bloc não é uma organização, mas um conjunto de táticas editadas e difundidas pela internet por grupo de jovens militantes durante os protestos. Geralmente, mas sem ser uma regra, eles vestem calças e blusas pretas, botas e máscaras ou bandanas para cobrir o rosto. Aas máscaras servem para esconder a identidade, mas também tem outra função: “Expressar solidariedade coletiva através do anonimato e retratar imagens típicas da rebeldia juvenil”, afirma Juris. Ainda segundo o acadêmico, eles têm uma postura anticapitalista e rejeitam o mercado e o Estado.