Engajamento horizontal
Aluisio Junior
"Estudante de Jornalismo da UFMG e criador do Blog Juventude Ativa"
Aqueles que acreditavam no naufrágio das manifestações,
ainda apostando nas antigas formas de
representação e em pautas centralizadas, começam a ver as mobilizações conseguirem
conquistas que ultrapassam sua causa inicial, as reduções nas tarifas do
transporte público. Mas ainda há uma dúvida para muita gente, afinal, esse
movimento possui lideranças?
Sim e não. Existem grupos organizados com algumas
reivindicações mais centrais, como o MPL (Movimento Passe Livre) em São Paulo e
a COPAC (Comitê Popular dos Atingidos pela Copa) em Belo Horizonte. No último sábado (23) integrantes da COPAC e
de outros movimentos sociais realizaram um segundo plenário que chamaram de "Assembleia
Popular Horizontal", com participação livre (os convites foram enviados
pelo Facebook) e aberto o direito de fala aos presentes, com inscrições e tempo
delimitado. As propostas foram passadas por votação do público e um novo
encontro foi marcado para a próxima quinta-feira (27), às 19h, no viaduto Santa Tereza. Entre as
reivindicações aprovadas na pauta estava a "revogação do último aumento
das passagens em Belo Horizonte", o
"fim da repressão violenta e indiscriminada dos manifestantes pela
PM" e "a saída do deputado Marco Feliciano da Comissão de Direitos
Humanos da Câmara dos Deputados".
Apesar desses encontros serem abertos e defenderem
causas comuns a ampla maioria dos manifestantes presentes nas passeatas, a
Assembleia não tem a pretensão de apresentar uma agenda "oficial" de
Belo Horizonte, de acordo com o convite compartilhado pelo Facebook. Não se trata de uma representação do
movimento, não foram eleitos para isso e
o número de pessoas presentes (500, segundo o UOL) é ínfimo se comparado aos
mais de 60 mil que ocuparam as ruas.
As manifestações em alguma medida continuariam mesmo
sem o MPL ou a criação da Assembleia Popular Horizontal pela empolgação e apoio
que conquistou. A derrubada da PEC 37 na noite de ontem pelo Congresso e a
aprovação do projeto de lei que destina 75% dos royalties do petróleo para
educação e 25% para saúde foram reivindicações que ouviram o grito das ruas,
mesmo sem engajamento político. No entanto, continua necessário que sejam
discutidas ideias para que mudanças mais profundas e estruturais aconteçam.
Grupos organizados são legítimos e ao se abrirem a multidão compõem uma força com
imenso potencial de transformação.
Um comentário:
Confesso, Rudá, que não estou tão surpreso que algumas demandas estejam sendo atendidas. A despeito de suas características únicas, como essa horizontalidade, que eu inclusive questionei de início - não no que diz respeito às lideranças, mas quanto à centralidade dos objetivos - a presença popular nas ruas surtiu efeitos imediatos. Isso é bom? De princípio diria que sim. Contudo, algo mais precisa ser feito e não me refiro a novas mobilizações em massa. Acredito que o passo a tomarmos agora seja uma transformação - lenta e gradual, certamente - em direção a uma participação política mais sólida de todos os brasileiros. Entendo essa situação - as passeatas e os protestos - sempre recordando Hannah Arendt em seus apontamentos em "A Condição Humana". Os Estados atuais elevaram as características econômicas e 'políticas' típicas da vida familiar e privada à esfera pública. Comparo os protestos às reivindicações de filhos insatisfeitos, zangados com a atuação de sua nação, sua pátria-mãe, porque despertaram no arrebol de condições propícias para sua adolescência política. Resta-nos esperar que essas mudanças não se assemelhem ás intempéries típicas de qualquer adolescência e cessem sem deixar seus frutos. De preferência, nas urnas.
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