terça-feira, 14 de agosto de 2012

Minha entrevista ao jornalista Renato Dias (sobre o mensalão)



Qual o impacto do julgamento do Mensalão nas eleições de outubro?
Rudá Ricci - Fico com a opinião do Gaudêncio Torquato, da USP: ele terá algum impacto nos grandes centros urbanos, mas passará ao largo de 90% dos municípios. Entre outros motivos, porque envolve a figura do personagem mais popular da política brasileira, Lula, porque o julgamento é muito longo e porque dificilmente serão muitos punidos. Mas se o julgamento encerrar muito próximo das eleições (menos de duas semanas antes) a exploração na televisão será muito grande.

O Mensalão do PSDB (MG) acabou em pizza?
Rudá Ricci - Claro. Existe um acordão tácito envolvendo PSDB, PMDB e PT em relação a estes temas. Dificilmente eles chegarão a um termo completo no que tange às deliberações das casas parlamentares. Os três partidos constituem a garantia da ordem política estabelecida ou hegemônica.

Qual será o fim da CPMI do Carlinhos Cachoeira?
Rudá Ricci - Pizza. Talvez um punido, um boi de piranha, além de Demóstenes Torres. Mas nada além disto. Pelos motivos que citei na resposta anterior.

Qual real motivo da ruptura em Belo Horizonte entre PSB e PT?
Rudá Ricci - E uma situação peculiar. O prefeito Lacerda sempre foi próximo de Aécio Neves. Quando de sua posse, citou eufemismos para afirmar que faria o choque de gestão, adotando princípios empresariais. Durante o último ano, oscilou em dar mais poder ao PT e ao PSDB. Mas o estopim foram os cálculos a respeito do coeficiente eleitoral. O PSB percebeu que se coligando com o PT teria poucas chances de eleger vereadores; já o PT, a projeção era inversa: sem coligação, reduziria pela metade a sua bancada atual. Foi um pretexto, digamos, muito concreto para o PSB. Adicionaria, ainda, uma avaliação negativa sobre a maneira como Lula tentou conduzir a aliança nacional com Eduardo Campos. Valorizou em demasia o partido aliado e o preço foi subindo às alturas, a ponto de indicar a Eduardo Campos que poderia dar saltos maiores do que projetava para 2012. Foi neste contexto que Lacerda percebeu que teria mais liberdade para se aliar com quem já tinha afinidades.

O que muda na postura do Palácio do Planalto em relação às greves com Dilma Rousseff? [Em relação a Lula]
Rudá Ricci - Muda tudo. Primeiro, não existe mais a intervenção direta do Presidente e de seu hábil ministro, Luiz Dulci. Segundo, não vivemos um período de bonança. Finalmente, não há mais a ameaça latente de confronto ideológico, como ocorreu em 2005 e 2006, no auge da crise aberta pelo mensalão. Há, ainda, uma conjuntura em que o sindicalismo do funcionalismo público aumenta consideravelmente e ocupa espaço significativo no interior da CUT (tensionada nos últimos anos por outras centrais sindicais), forçando uma guinada para uma pauta mais exigente. Somam-se, enfim, uma conjuntura sindical, econômica e perfil governamental bem distintos do período Lula.

Lula volta em 2014?
Rudá Ricci - Hoje parece mais difícil que parecia em 2011. Lula está mais fragilizado fisicamente, está sem palanque diário, cometeu erros de condução nos acordos políticos, se desgastou em vários Estados com lideranças petistas. Dilma navega com mais facilidade junto à grande imprensa. E verdade que sofre com a economia em banho maria. Mas ainda não chegamos ao ponto de afetar significativamente o consumo de massas, o principal fator que abalaria, de fato, o governo de Dilma Rousseff.

O PIB de 2012 será um "pibinho"?
Rudá Ricci - Sim. Deve girar ao redor de 2%. Pífio. Mas tudo leva a crer que haverá recuperação em 2013.

Barack Obama vence?
Rudá Ricci - E bem possível. Também em virtude de certo polo ultraconservador no interior do Partido Republicano, que esgarça as relações internas e provoca contradições no discurso do candidato oposicionista. De qualquer maneira, o governo Obama foi decepcionante. Já se dizia que Clinton teria sido o presidente democrata com maior perfil republicano da história recente. Não sabiam que ainda viria Obama. Falta aos EUA uma perspectiva mais estratégica. Por anos, a guerra se tornou sua principal referência. Mas poucas nações (talvez a Alemanha seja uma exceção) se constituíram historicamente a partir da ameaça externa. Obama era a esperança de superar este déficit.

O que esperar das eleições na Venezuela?
Rudá Ricci - O problema político da Venezuela é a oposição, dividida e frágil. A grande imprensa brasileira procura vender a versão que o problema é Chavez. Mas uma mudança política, e os problemas de saúde de Chavez podem aumentar as chances de mudança, revelará um país sem alternativas reais de liderança.

O que o senhor anda lendo?
Rudá Ricci - Leio "Coligações Partidárias na Nova Democracia Brasileira", organizado por Silvana Karuse, Humberto Dantas e Felipe Miguel; "Sociologia da Infância", de William Corsaro; e "A Visita Cruel do Tempo", de Jennifer Egan. Vou comentando estas leituras no meu blog.

Projeto de novo livro?
Rudá Ricci - Sim, sobre a política mineira e sobre o fordismo lulista.

Qual o balanço de sua experiência com o blog/site?
Rudá Ricci - E um aprendizado constante. No ano passado, uma fundação fez uma proposta para sediar meu blog. Cheguei a ter apenas 100 acessos por dia, quando o normal são 1.700. Descobri que os internautas querem fidelidade. Voltei rapidamente para o que foi sempre. Também descobri que as redes se interligam. Cada vez que posto algum comentário no blog e jogo no twitter, em poucos minutos a nota já ultrapassa mais de 100 acessos. Digressões ou teorizações não atraem muito os internautas, mesmo em notas pequenas. E há, ainda, pouca interação (embora grande número de visitas) em relação aos temas que são mais frequentes no meu blog (política, literatura e educação). Finalmente, sinto que as redes sociais estão se polarizando, em muitos casos, se partidarizando aceleradamente. Formam-se grupos que se apoiam diariamente, que se auto-promovem ou se protegem. As tags, no twitter, são usadas como armas de ataque diariamente.  

Um comentário:

kivas Arquitetura disse...

Boa entrevista !
eu gosto de digressões e teorizações:)