quarta-feira, 5 de agosto de 2009
Memórias do Senado
Quando da crise aberta pelo Caso Renan Calheiros, no Senado, escrevi um breve artigo a respeito. Indolente ou vidente, resolvi reproduzir uma das passagens do artigo nestse blog:
"Constitucionalmente, os senadores zelam pelos direitos constitucionais, julgam o Presidente da República, ministros do Supremo Tribunal Federal, o procurador-geral da República e o advogado-geral da União. É considerada uma Câmara Alta, com função moderadora. Os três senadores por Estado são eleitos por princípio majoritário e possuem um mandato dos mais dilatados: oito anos. Assim, teriam por competência do cargo, que procurar despartidarizar seus julgamentos, porque estariam numa câmara especial, de representação dos interesses éticos e determinações constitucionais da nação. O artigo 52 da Constituição Federal define as competências dos senadores. Além das já citadas, destacam-se:
a) aprovar a escolha de magistrados, ministros do tribunal de contas, presidente e diretores do Banco Central, procurador-geral da República;
b) aprovar chefes de missões diplomáticas;
c) dispor limites globais de operações de crédito de governos;
d) dispor de limites globais para dívida mobiliária;
e) eleger membros do Conselho da República.
São competências nobres, mas que podem perfeitamente ser atribuídas à Câmara Federal. Mesmo porque, o escândalo envolvendo o Presidente do Senado e o modo como este caso vem sendo conduzido por seus pares, não chega a legitimar uma diferença de competências tão distinta entre senadores e deputados federais.
Com efeito, mais que o escândalo, o caso Renan, por revelar como os senadores (em especial, do Conselho de Ética) não se comportam de maneira distinta daquele comportamento típico dos deputados federais, coloca em xeque o sistema bicameral da estrutura parlamentar brasileira. Na prática, não há motivos para a diferenciação. Não há motivos para um mandato de oito anos, o maior mandato parlamentar nacional. Não há motivos para a escolha de três senadores por Estado, sendo um deles, oriundo de casuísmo, que chegou a ser denominado de biônico.
Há pouco, a ONG Transparência Brasil divulgou que o parlamento brasileiro gasta 11 reais por minuto para manter parlamentares, assessores, verbas de gabinete, combustível e passagens aéreas. Cada um dos 513 deputados federais custa 6,6 milhões por ano. Mas os senadores são ainda mais caros: 33 milhões de reais por ano, por cabeça. Só os EUA gastam mais com seus parlamentares.
Parece evidente que passar o Brasil a limpo como se acostumou desejar frequentemente, significa questionar a própria existência do Senado e os gastos fabulosos de recursos públicos que ele enseja.
E, daí, abrir um amplo debate público sobre as condições efetivas de funcionamento dos parlamentos brasileiros. As candidaturas avulsas, sem necessidade de filiação partidária, poderiam oxigenar o sistema de representação política. Poderia criar o que as eleições dos conselhos de fábrica causaram na Europa. Como as chapas poderia ser filiadas ou não à uma central sindical, esta possibilidade acabou por obrigar as centrais sindicais a se inserirem com mais dinamismo no interior das fábricas, sob pena de serem eliminadas do sistema de negociação fabril. A lógica de negociação e articulações de cúpula tinha, assim, um contrapeso das eleições avulsas dos conselhos de fábrica.
A eleição avulsa para os parlamentos brasileiros poderia gera o mesmo efeito, obrigando as burocracias partidárias a cederem espaço político à militância de base. A representação política retomaria o fluxo natural, iniciada mesmo antes do próprio processo eleitoral, inserido no cotidiano do cidadão comum.
Mas ainda é pouco. Com adoção do sistema distrital misto seria possível adotar o recall, que poderia cassar o mandato de parlamentares que demonstrassem não cumprir o desejo do seu eleitor.
O parlamento precisa, ainda, se embeber nas práticas participacionistas que atingiram o Executivo no Brasil. A criação de conselhos ou câmaras temáticas ou de representação de segmentos sociais, poderiam gerar um vínculo maior entre o parlamentar e a dinâmica social real.
O fato é que o parlamento brasileiro é o que se mantém mais atrasado e apegado a uma liturgia ultrapassada, academicista, que encobre bastidores pouco convenientes à ética política e ao desejo dos brasileiros. Os parlamentares, em seus pronunciamentos, começam a sentir a desaprovação nacional à sua conduta e grande desilusão com a possibilidade do sistema político de representação poder se renovar. São tantos casos explícitos de descontrole, acordos que encobrem erros grosseiros entre colegas parlamentares, renúncias e casos de conduta duvidosa, que parece esgotar a crença, ainda que mínima, na capacidade de convalescença dos parlamentares. "
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