segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Um breve diálogo com Zander Navarro

Gostaria de retomar a parte inicial da contribuição de Zander sobre a origem pouco democrática da nossa esquerda tupiniquim. Lembremos que a origem foi positivista. O pensamento linear e a dificuldade de compreensão do conceito de dialética pela nossa esquerda foi analisada por um interessante livro de Leandro Konder. Desde sempre fomos alinhados à uma leitura postiça, exógena, da Segunda e Terceira internacionais. O caso mais escandaloso foi a noção de "resquícios feudais" que o processo de colonização lusitano teria deixado em terras brasileiras. Muito tempo depois, ouvi de José Gomes (Presidente do INCRA no governo Sarney, pai de José Graziano, presidente da FAO) que somente com o cadastro oficial de terras em suas mãos, abandonou a ideia que o empresariado industrial era mais progressista que os latifundiários. Nas mãos, a história de uma simbiose quase genética. E José Gomes nem se considerava de esquerda, embora dialogasse com ela.
A tragédia petista dos últimos anos é, também, herdeira deste pensamento postiço. O etapismo (este conceito linear e evolutivo, em que aparece apenas a força condutora como existente no jogo político), focado no Estado como demiurgo da Nação, é a base do pensamento e crença dos dirigentes que assaltaram o partido em meados da década de 1990. Há algo de reconfortante, admitamos, nesta linha de pensamento. Trata-se de um raciocínio simplório e, portanto, autoritário. Porque, como o mundo social não é simples, acreditar na linearidade política facilita tudo, cria certezas, crenças, esperanças. Enfim, o que se reveste de racionalidade é, na verdade, um singelo sentimento de poder, um poder quase divino, de compreender o mundo num piscar de olhos, bastando mexer as peças certas.
Daí o Estado ser o grande timão da mudança. Porque basta capturá-lo e tudo gravita ao redor do bunker que administra as condições para realização do capital. Enfim, o pacto desenvolvimentista, sob a batuta da esquerda, estaria garantido. Tudo simples, muito fácil, bastando existir dirigentes experimentados e com QI acima da média. O problema é esta formulação veio da Rússia que, como sabemos, não tem tradição de forte sociedade civil. Ao contrário, sua história é marcada pela cultura mongol, aldeã, onde o centralismo é a única vertente política conhecida. Reinhard Bendix nos ofereceu um estudo detalhado sobre esta tradição político-antropológica. Daí a esquerda tupiniquim se ressentir da popularidade. Porque se alimentou historicamente de algo que não é brasileiro e que, portanto, dificulta a construção de um discurso hegemônico, casado com a identidade nacional.
Por ser autoritário, o pensamento tipicamente de esquerda de nosso país, desconsidera o outro. Primeiro, desconsidera a capacidade política da direita. Sempre está à espreita para instrumentalizar aliados de centro-esquerda ou mesmo da esquerda, seus vizinhos. E não tolera até mesmo divergências em suas próprias organizações. O tal centralismo democrático é, de fato, um interregno para a lavagem de roupa suja que acaba redundando em novo período de silêncio. Metodologia militar que revela a ordem unida, a falta de crença na democracia e no raciocínio divergente, a convicção do preparo para a guerra, sem dúvida, sem sentimento.
Obviamente que, assim, falta criticidade. O que transforma a atual quadra da história política do país uma das mais pobres. Tanto se criticou o pensamento único que acabamos resvalando em mais um desses espécimes.

Um comentário:

Fernando Nogueira disse...

Foi basicamente isso que alguns anos de experiência na universidade me ensinou sobre a parte, digamos, mais representativa do "movimento estudantil". O que particularmente me deixou descrente quanto as futuras classes dirigentes. O pragmatismo e a vontade de poder da ala petista do ABC virou modelo para muitos setores (populares ou de classe média).