Assisti um dos episódios da série Memórias de Chumbo, produzida pela ESPN Brasil. O de hoje foi sobre o Chile, da ditadura Pinochet e a colaboração dos regimes militares, usando o futebol como ópio (para retomar a velha e gasta analogia de Marx). Emocionante, principalmente o relato final, de um dos jogadores da seleção chilena que teve sua mãe torturada e que se recusou a dar a mão para Pinochet, quando foram recebidos na sede do governo.
Lembrei de alguns anos atrás, quando fui até Talca, governo socialista, participar de um evento internacional. Falei sobre mecanismos de gestão participativa. No encerramento, os organizadores pediram que cada estrangeiro fizesse sua saudação final. Eu disse que seria importante recordar que aquelas propostas que estávamos discutindo era um projeto de esquerda. Não era liberal, de centro ou algo do gênero, mas da história da esquerda democrática do nosso continente. Ao descer, percebi uma fila de senhores e senhoras que me aguardavam. Todos estavam emocionados. Me abraçaram. E me agradeceram, sem falar muito.
A juventude brasileira não tem a menor ideia do que foi o período dos regimes militares no Cone Sul da América Latina. Em 1973 ou 1974, estive no Chile com minha família. Além de um leve terremoto, o que ficou marcado em nós eram os militares armados até os dentes, nas ruas, em barricadas, nos telhados. Não é exagero. Aliás, o exagero era todo deles. Lembro da Plaza de Las Armas em que se distribuíam rapidamente alguns panfletos contra a ditadura. Tudo muito rápido. Eu tinha 11 ou 12 anos de idade. Logo depois da distribuição dos panfletos, coisa de minutos, apareciam peruas de onde saíam policiais à paisana e fardados, todos armados, encarando a todos.
Anos depois, estava lá outra vez, falando num evento organizado por um governo socialista. Não dava para ser meramente protocolar ou acadêmico. E parece que quem sofreu na pele a ditadura só espera isto: recordação e solidariedade.
Um comentário:
Olá Rudá,
considero muito importante este seu breve relato. Do alto dos meus 23 anos, me é permitido apenas vislumbrar, quase no campo da fantasia, o que foram as ditaduras militares. Tive um professor na UnB, Uruguaio e (ex)Sandinista, que em alguns relatos dizia ter sido a ditadura no Brasil uma "ditabranda" (termo que ele usou) em comparação com as outras do cone sul. Tenho a impressão que ele, vindo ao Brasil em 73/74, tenha pego um período de arrefecimento da repressão ostensiva, uma vez que as instituições que combatiam a ditadura haviam sido neutralizadas e já estávamos no período da luta armada. Um outro professor com o qual tive aulas (de história em Goiânia e que, inclusive, foi o candidato do PSOL à prefeitura neste ano, Reinaldo Pantaleão) contava das torturas, das atividades "subversivas", de uma amiga torturada que do exílio nunca mais voltou.
De todo modo, deixo aqui minha recordação e solidariedade em forma de música:
https://soundcloud.com/julianoberquo/brasil-nunca-mais
Abraço,
Juliano Berquó.
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