A primeira parte trata do conceito de fordismo, tal como sugerido pela Escola da Regulação.
O CONCEITO DE PACTO FORDISTA
O
pacto fordista, ou fordista-keynesiano, foi sustentado como hipótese
explicativa pela Escola da Regulação a partir da tese de Michel Aglietta
defendida em 1974, intitulada “Régulation et crises du capitalisme”. Logo
adiante, formou-se um núcleo de pesquisadores que concentraram suas
preocupações acadêmicas a partir do marco teórico sugerido por Aglietta,
envolvendo Robert Boyer, Alain Lipietz, Jacques Mistral, J. P. Benassy, J. Muñoz
e C. Ominami. Era o período da crise capitalista do período 1973/1974, para
alguns, desencadeada pelo aumento do preço do barril de petróleo forçada pelas
deliberações políticas da OPEP, mas que para outros já estaria instalada no
seio da estrutura lógica do Estado de Bem-Estar[1]. Há, contudo, uma linha convergente que se
aproxima das teses centrais de Keynes e Kalecki[2].
Sinteticamente,
todos teóricos desta linhagem sugerem uma periodização dos movimentos cíclicos
do capitalismo a partir das transformações do trabalho assalariado, das
tecnologias de produção e da emergência do consumo de massas. Os anos 1930
marcariam a emergência do fordismo nos EUA, fundado no consumo de massas a
partir da indústria automobilística e da construção civil, pedra de toque do
modelo rooseveltiano. Com o custo reduzido de bens de consumo os trabalhadores
passaram a participar de um pacto produtivo, fundado na intervenção do Estado
regulador. Para tanto, os custos da cesta básica de consumo dos trabalhadores
passaram a ser administrados e até subvencionados pelo Estado-demiurgo que, na
outra ponta, regulava o crédito para a indústria de maneira seletiva e setorial.
Um ingrediente fundamental foi a domesticação do trabalho a partir do ritmo de
produção definido pela esteira elétrica e pela disseminação de princípios da
poupança e consumo familiar (lembremos que Ford foi o primeiro empresário de
ponta que investe em ações programadas de orientação das famílias operárias a
partir de visitas programadas de um exército de assistentes sociais que, mais
tarde, dará origem aos princípios da psicologia industrial), aumentando
significativamente a produtividade e aumento do lucro observado nos segmentos
produtivos com alto valor agregado.
O
ciclo mais vigoroso do fordismo teria ocorrido entre os anos 1930 e 1950, a
partir do qual se espraiou para os países da Europa Ocidental e o Japão,
entrando em crise ao final dos anos 1970.
David
Harvey[3]
propõe uma síntese do pacto fordista que pode ser sintetizado como modelo que se apoia num Estado centralizador e
orientador, que implanta um aparato regulatório que tem por finalidade garantir
um ambiente estável de investimentos e consumo. Assim, as políticas
anticíclicas adotadas promovem, na prática, um pacto desenvolvimentista,
envolvendo agentes econômicos e políticos. Os instrumentos principais do
aparato regulatório, por seu turno, são: subsídio da cesta básica de consumo
dos trabalhadores e crédito controlado e seletivo para segmentos produtivos,
buscando regular o grau de endividamento setorial.
Harvey
sugere que a data simbólica de surgimento do fordismo é 1914, com a introdução
do dia de oito horas e cinco dólares como recompensa aos trabalhadores da linha
automática de produção de automóveis. Tais inovações propiciaram controle
absoluto sobre a produtividade do setor e possibilidade de transformar o custo
dos salários em investimento para a emergência do mercado consumidor de massas
nos EUA. O geógrafo norte-americano retoma Gramsci para afirmar que os novos
métodos de trabalho são inseparáveis de um modo específico de viver e de pensar
e sentir a vida, envolvendo formas de sexualidade, família, coerção moral,
consumo e ação de Estado.
A
inovação fordista gerou, para Harvey, forte disciplina operária, não apenas na
produção, mas na organização dos hábitos de consumo. Com efeito, o segundo foco
passou a ser, já em 1916, educar o consumo das famílias operárias. Neste ano,
Ford enviou um exército de assistentes sociais aos lares dos trabalhadores para
compreender a dinâmica familiar e sua
capacidade de consumo.
O
sistema fordista foi se engendrando ao longo de meio século, ganhando seu
formato definitivo com os programas anticíclicos do New Deal[4].
A partir de então, segundo Harvey, forjou-se um sistema social e produtivo, que
começará a ruir a partir de 1973/1974, com a crise aberta pela OPEP com aumento
do preço do barril de petróleo. Um período de consolidação do que o autor
denomina de indústrias portadoras de tecnologias amadurecidas do pós-Guerra:
carros, construção de navios e equipamentos de transporte, aço, produtos
petroquímicos, borracha, eletrodomésticos e construção civil. Afirma o autor
O Estado assumiu novos papéis e construir novos (keynesianos)
poderes institucionais; o capital corporativo teve de ajustar as velas em
certos aspectos para seguir com mais suavidade a trilha da lucratividade
segura; e o trabalho organizado teve de assumir novos papéis e funções
relativos ao desempenho nos mercados de trabalho e nos processo de produção.
(...) A derrota dos movimentos operários radicais que ressurgiram no período
pós-guerra imediato, por exemplo, preparou o terreno político para os tipos de
controle do trabalho e de compromisso que possibilitaram o fordismo[5].
O
Estado passou a patrocinar a produção de massa, as condições de demanda
relativamente estáveis e controlar os ciclos econômicos. Em outras palavras, o
centro político desta lógica é a construção da paz social e pacto
desenvolvimentista.
[1]
Não há consenso sobre a unidade conceitual que envolveria os vários autores que
se valeram das teses centrais da Escola da Regulação. Alguns autores sustentam
uma corrente liderada por Grenoble, uma segunda corrente de Amsterdã, uma
terceira dos alemães “derivacionistas”, uma quarta norte-americana. Ver JESSOP, Bob. Regulation Theories in Retrospect and
Prospect, Barcelona, 1988. Ver, ainda, AGLIETTA, Michel. Accumulation et régulation du capitalisme
en longue période. L’exemple des États-Unis (1870-1970), Paris:INSEE, 1974;
e BOYER, Robert. A teoria da
regulação. Uma análise crítica, São
Paulo:Nobel, 1990.
[2]
Michel Kalecki estudou as flutuações cíclicas das economias capitalistas
desenvolvidas, tendo o estudo de 1933, intitulado "Esboço de uma Teoria do
Ciclo Econômico", como o mais completo por ele produzido. Neste e em
estudos posteriores, sustenta que as economias capitalistas se desenvolvem
dentro de um padrão cíclico, se expandindo, mas formando um movimento
ondulatório, flutuante, ao longo do tempo, relacionado ao nível de investimento
e consumo. Num segundo momento, entre 1950 e 1960, estudou as economias
denominadas naquele período de subdesenvolvidas, tendo em seu estudo "O
Problema do Financiamento do Desenvolvimento Econômico" um marco em suas
análises (publicado no México em 1954). Comumente se afirma que Kalecki era um
autor keynesiano, embora o correto seja o contrário: várias de suas teses foram
incorporadas aos estudos e plataformas de tipo keynesiano.
[3]
Ver HARVEY, David. Condição Pós-Moderna,
São Paulo:Edições Loyola, 1993.
[4]
O debate acadêmico sobre as origens do New Deal permanece até hoje. Nos seus
primeiros cem dias, o New Deal implantou o Emergency Banking Act, transferindo
recursos federais para bancos privados; o Federal Deposit Insurance
Corporation, que garantia depósitos bancários; o Securities Act, que regulava o
mercado de ações para combater especulações; o Home Owners Refinincing Act, que
regulava os pagamentos de hipotecas. Uma gama de leis regulatórias. Também
foram normatizadas a produção industrial e agrícola, ale de ser montada uma
ampla rede de assitência social, como a Civilian Conservation Corps. No final
de 1933, criou a Civil Works Administration para alicerçar obras públicas. O
diagnóstico governamental se pautava pelo desequilíbrio entre produção e
capacidade de consumo. Ver LIMONCIC. Flávio. Os inventores do New Deal. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2009.
[5]
HARVEY, David. Condição Pós-Moderna,
op.cit., p. 125.
Um comentário:
Amigo está muito contextualizado, porém o que Lula segue são os comandos do clube de Roma, em que líderes mundias se reunem anualmente e as famílias mais ricas traçam as diretrizes pro imenso gado humano e burro, em que esses luciferanos ditam as leis a serem seguidas a ferro e fogo.
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