segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Minha entrevista à Folha de SPaulo de hoje


Entrevista para Uirá Machado:

1) Em seu livro, o senhor afirma que os movimentos sociais trocaram as ruas pelos gabinetes governamentais. Como seu deu essa transformação e de que maneira ela alterou a pauta reivindicatória?

R: Um dos fatores foi a crise de financiamento externo que decaiu bruscamente a partir da década de 1990. A partir daí, as chamadas parcerias com o Estado aumentaram. Foram assinados muitos convênios. Antes, contudo, já havia um processo de crise de representação que ocorreu em duas etapas. A primeira, quando a partir do final dos anos 1980 grande parte das lideranças apoiadas e assessoradas por organizações confessionais (como pastorais sociais) criou sua própria organização nacional, caso da CUT e MST. As pastorais sociais passaram a viver um dilema sobre o novo papel a assumir. As entidades financiadoras de grande parte dessas organizações começaram, por seu turno, a exigir resultados quantitativos que foi desarmando parte do seu ideário. Um exemplo é o resultado quantitativo que se exigia das romarias pela terra. As romarias são instrumentos de valorização social, de afirmação da identidade rural. Como exigir resultado concreto? A segunda etapa foi a vitória gradativa de candidatos ao parlamento e executivo oriundos dos movimentos sociais. Aos poucos, muitas lideranças foram alçadas à condição de assessores. Outros se elegeram vereadores, prefeitos, deputados. A partir daí, o ideário anti-institucionalista dos anos 1980 entrou em colapso. Como os movimentos sociais eram quase todos comunitaristas, não conseguiram construir uma nova instucionalidade pública. Rejeitavam a vigente, mas não conseguiram propor algo alternativo. Este é o caso dos 30 mil conselhos de gestão pública existentes no Brasil. Existem, organizam conferências nacionais, mas não conseguem alterar um milímetro da estrutura burocrática (anti-participativa) do Estado brasileiro. Enfim, estratégia de sobrevivência e mudança de ideário: estes foram os dois principais fatores que afastaram os movimentos sociais das ruas. Mas, para ser rigoroso, diria que muitos dos antigos movimentos sociais são, hoje, organizações e não movimentos. Possuem estrutura administrativa regular, direção profissionalizada, porta-voz, processo de tomada de decisões a partir de sua hierarquia interna, fonte de financiamento próprio, programas e instituições de formação de quadros exclusivos. Esta lógica não é a de um movimento social e cria forte competição de mercado, reforçando a busca pela sobrevivência.

2) O senhor argumenta no livro que o "lulismo" superou o petismo e teve trajetória coincidente com a dos movimentos sociais. Em que sentido isso se deu? O que é causa e o que é consequência?
R: São trajetórias paralelas que se encontram no governo Lula. A trajetória dos movimentos sociais foi a que descrevi anteriormente, que os leva a busca de novas estratégias de sobrevivência. A trajetória do lulismo é mais tortuosa. O lulismo não se resume à Lula. Então, temos um primeiro momento que é a constituição de um núcleo formulador, que começa com o Instituto da Cidadania (que formulava para as campanhas de Lula, mas não para o partido, detalhe pouco observado, mas muito importante na mudança de percurso do petismo), mas se consolida com a eleição de Lula. A partir daí, um corpo de gestores públicos constrói, aos poucos, uma formulação de gerenciamento político do Estado brasileiro. Houve uma alteração importante a partir de 2006. Na verdade, o lulismo, enquanto concepção gerencial de Estado, se forjou na adversidade. E se construiu num processo de depuração importante. Cito o caso emblemático da saída de Frei Betto e Ivo Poletto da condução do programa Fome Zero. Os núcleos de controle social elaborados por Frei Betto foram substituídos pela entrega do Bolsa-Família aos prefeitos. Foi uma escolha clara que redundou no pedido de afastamento dessas duas lideranças da maior importância para a organização popular dos anos 1980 apoiada pela Teologia da Libertação. O lulismo se constituiu inicialmente a partir da fusão da matriz pragmática do sindicalismo metalúrgico, do centralismo burocrático de organizações de esquerda muito específica que estavam no núcleo duro do governo federal em sua primeira versão e de um elemento inusitado para o petismo que é a busca do mercado. Este último item foi se configurando num projeto estatal-desenvolvimentista apoiado na expansão do mercado interno e no financiamento indutor do BNDES. Enfim, o lulismo, já em sua segunda e mais acabada versão, se aproxima de uma vertente do que a Escola da Regulação denominou de fordismo. Nada mais emblemático para um presidente metalúrgico. Portanto, movimentos sociais e lulismo alteraram simultaneamente sua referência e prática originais paralelamente. Até Lula se eleger Presidente não havia uma relação causal entre os dois pólos.

3) Qual o papel político dos movimentos sociais hoje em dia e de que maneira se diferencia do papel nos anos 80?
R: Como afirmei, se utilizarmos do rigor analítico dificilmente encontraremos com nitidez um movimento social no Brasil lulista. O MST, por exemplo, não é mais um movimento social, uma mobilização que demanda um direito não respeitado ou inexistente, sem estrutura hierárquica permanente. O MST é uma organização popular que eventualmente mobiliza uma base social cada vez mais reduzida em função da diminuição da pobreza rural. Segundo Marcelo Neri (FGV-RJ), de 2003 até 2009, 3,7 milhões de pessoas passaram a fazer parte da agora predominante classe C. E sustenta que mais 7,8 milhões de brasileiros do campo podem virar classe média em breve. Ora, esta nova classe média rural era a base social mobilizada pelo MST. Esta situação é uma senha para se entender o momento atual de grande parte dos movimentos sociais brasileiros. Mas há alguns novíssimos movimentos ainda se consolidando no Brasil, que carregam uma pauta pós-materialista (não fundada em necessidade básica), como movimentos por direitos de segmentos sociais específicos (crianças e adolescentes, LGBT e outros) e o movimento ambientalista. Contudo, são ainda restritos e não envolvem parte significativa da classe social mais importante no Brasil lulista: a classe C.

4) Lula foi um ícone das ruas nos anos 80 e dos gabinetes nos anos 2000. Qual o papel de seu governo na transformação dos movimentos sociais? É correto dizer, como alguns críticos afirmaram, que o governo Lula cooptou os movimentos sociais?
R: Em parte. Não foi necessariamente uma cooptação porque o outro lado desejava esta aliança. Eu diria que se trata de um pacto social não explícito. A política de Estado lulista é orientada para o pacto estatal-desenvolvimentista. No que tange ao movimento sindical, orienta-se para a construção de um modelo neocoporativo, onde as centrais indicam ministro, definem políticas públicas, participam de arenas que definem uso de recursos de fundos públicos. Isto ocorreu, por exemplo, com a CGL e a CISL na Itália, afastando-as da base sindical, o que provocou uma reação em cadeia de parte das comissões de fábrica daquele país. Outras lideranças de movimentos sociais urbanos e rurais encontram-se espalhados em muitas instâncias governamentais, em muitos ministérios e estatais. Não se trata de uma situação clássica de cooptação, mas da convergência de interesses políticos. Não há ingênuos em nenhuma das duas partes.

5) O primeiro grande embate de Dilma tem sido com as centrais sindicais. Quanto desse choque é explicado pela pura ausência de Lula? O "estilo Dilma" ajuda ou atrapalha nas negociações com sindicatos? A "falta de biografia" e de carisma é um problema ao lidar com movimentos sociais?
R: Acho que se trata de uma situação das mais complexas. O movimento sindical brasileiro é, quase todo, sindicalismo de resultados. É negociador por natureza e não contestador. O reajuste do salário mínimo é um aríete visível e popular, mas que será utilizado para negociações mais amplas, envolvendo agências reguladoras, tabela de isenção do IR e outros temas relevantes para o mundo sindical. Marco Maia é oriundo do mundo sindical e extremamente flexível. Por este motivo, recebeu apoio do governo federal. Vou, novamente, fazer uma analogia com o que faz o MST. O “Abril Vermelho” é um esforço de aumento ocupações de terras para negociar, a partir de maio e junho, o Plano Safra. Mas é evidente que o perfil de Dilma, marcado pelo estilo gerencial empresarial (a proposta de comitê gestor se aproxima em muito da Nova Gestão Pública do Reino Unido, que aqui no Brasil foi denominado de Estado Gerencial) influencia nesta relação. Vamos perceber como um gestor público tem que, necessariamente, saber ter jogo de cintura. A habilidade política é muito mais importante na liderança política que a capacidade gerencial. Mas há quem pense o contrário. Vamos tirar a prova dos nove nos próximos meses. Lebremos que Dilma Rousseff não é petista histórica e nem foi membro de destaque em nenhuma corrente interna do PT. Justamente num partido que vive a disputa interna diariamente.

6) Qual a "herança" que Dilma recebe de Lula no que diz respeito aos movimentos sociais, sindicatos incluídos? O senhor afirma (página 157): "Se o petismo se apoiou nas classes trabalhadoras organizadas em estruturas tradicionais, o lulismo se apóia nas classes trabalhadoras desorganizadas, desidesologizadas e pragmáticas." Quais os efeitos desse processo sobre Dilma?
R: O primeiro grande problema é como conduzirá o financiamento da inclusão social pelo consumo que o lulismo montou. E aí está parte das dificuldades de relacionamento com o mundo do trabalho. É a classe média tradicional que financia as políticas de transferência de renda. Um estudo da economista Beatriz David (UERJ) sugere que se as classes D e E receberam os recursos do Estado para ascender à classe C (tendo no aumento real do salário mínimo, crédito consignado e bolsa-família como principais iniciativas governamentais), isto não ocorreu com a classe B ou parte dela. E sabemos que a porção maior dos impostos em nosso país é oriunda dos impostos indiretos. Em nosso país, não são os ricos e abastados que pagam, proporcionalmente, mais. Enfim, é daí que vem a motivação para parte do discurso anti-lulista. Ora, se a política tributária brasileira é regressiva (quem ganha menos paga mais), se a política de transferência de renda está com seu financiamento no limite, e se o lulismo é um pacto pelo estatal-desenvolvimentismo de tipo fordista (conciliando interesses de várias classes e grupos sociais), como resolver esta equação? A adoção de política tributária progressiva destruiria a engenharia política lulista. E o aumento de consumo já faz com que 60% da população estejam endividadas, sendo que quase metade não sabe como pagar suas dívidas. Criou-se uma expectativa em relação ao aumento real do salário mínimo para o ano seguinte, salvando parte do orçamento familiar cada vez mais comprometido com o parcelamento no cartão de crédito. Não temos uma bolha imobiliária, mas já se discute como resolver o salto de oferta de crédito imobiliário dos atuais 3,8% do PIB para a estimativa de 10% em 2014. Enfim, há uma espécie de bomba relógio a ser desativada pelo governo Dilma. Por que cito este problema? Porque esta é a herança e expectativa de lideranças sociais e consumidores da Classe C, vorazes consumidores. O lulismo está intimamente vinculado à inserção pelo consumo. Parte significativa da classe C, lembremos, rompeu nos últimos anos com um ciclo de pobreza familiar secular. Agora viajam de avião e compram nos shoppings que até pouco tempo os expulsava. São conservadores e pragmáticos. Seria coincidência que estas duas características são justamente as mesmas da maioria das lideranças sociais de hoje?

7) Já é possível fazer comparações entre Lula e Dilma no que diz respeito ao trato com os movimentos sociais? O fato de Dilma "bater o pé" indica maior conservadorismo nesse aspecto, embora ela nitidamente tenha uma pauta menos pragmática e mais progressista com os direitos humanos?
R: Dilma faz um discurso mais progressista, mas adota uma prática mais conservadora que Lula. Interessante como formadores de opinião elogiam diariamente sua performance. Alguns dizem que se surpreenderam positivamente, revelando que não era sua opção eleitoral. Lula era um negociador nato, possui a memória de um líder sindical. Mais: falava a linguagem da nova classe C, pragmática e, muitas vezes, cínica. Lula liderou o consumo no final de 2008, momento em que a crise dos EUA invadia o mundo. Dilma é técnica e ascética como a classe média tradicional. Não se trata apenas em um líder carismático e outro racional. Trata-se de empatia política, de qual segmento social é liderado. Lula falava para a nova classe média, ou a nova composição da classe C. Dilma parece falar a língua da classe média tradicional. Mas o Brasil ainda vive um momento de transição na sua composição social. A forte ascensão social é muito recente, algo similar ao que ocorreu nos anos 1950 nos EUA. E a classe média tradicional perdeu seu poder de formar opinião num país com mobilidade social mais enrijecida. Enfim, temo que Dilma não tenha feeling político para entender este momento de transição.

8) De maneira geral, o senhor diz que o lulismo se aproxima das práticas conservadoras na política e rompe com o que há de mais inovador no petismo. Como o senhor vê Dilma nesse processo?
R: O lulismo fecha um ciclo da modernização conservadora iniciada por Getúlio Vargas. Moderniza a economia sem alterar em nada a estrutura de poder, tendo no apoio às oligarquias regionais a sua expressão mais visível. Dilma vem para corrigir o financiamento desta trama, tornando-a sustentável. Começa, portanto, pelo signo dos cortes e do rigor fiscal. Ao menos é o que parece anunciar. Esta é uma fase delicada e arriscada de ajustes do lulismo, enquanto modelo fordista. O petismo tinha como inovação a construção de uma cultura política fundada no controle social, na cidadania ativa. O lulismo, enquanto pacto, desmontou esta possibilidade e se aproximou do modelo americano de relacionamento fragmentado com as organizações populares e de representação social. Mas este é o dilema da presidente Dilma: como tornar sustentável um pacto fechado, em que os interesses múltiplos foram atendidos em quase sua totalidade? A leitura conservadora em nosso país afirma que o lulismo foi populista e aliciou as classes menos abastadas. Mas fez o mesmo com as classes mais abastadas. E também com todo sistema partidário, desfigurando-o totalmente. Não se fala que nosso sistema partidário de frágil retornou ao modelo de partido de notáveis do século XVIII. Os partidos governistas perderam qualquer traço de identidade e adotam os programas governamentais nas intervenções públicas. A oposição perdeu seu eixo. Até mesmo os municípios perderam sua autonomia como ente federativo. Um prefeito, hoje, é administrador de programas conveniados com os ministérios. O lulismo é altamente centralizador e refuta sistemas de controle social, diluindo-os em câmaras de negociação e consulta. Estamos falando de um modelo de tutela social, que Claus Offe denominou, anos atrás, de “estatalização”, ou o avanço dos tentáculos do Estado por todos os poros da sociedade civil. Será difícil desmontar esta trama sendo uma criatura do seu criador.

9) O seu livro também trata da ascensão da nova classe média brasileira. O sociólogo Jessé Souza procurou mostrar, com base em uma pesquisa empírica, que esse contigente populacional que subiu de vida sob Lula tem características diferentes da classe média tradicional. Como o senhor avalia essa questão? Embora o senhor mantenha o nome tradicional (classe média) e a compreenda em sentido relacional, não deixa de perceber que o novo contigente tem características diferentes da classe média tradicional (pág. 76)...
R: A série histórica que temos no Brasil e que segue o Critério Brasil é baseada na estratificação social fundada no poder aquisitivo. Estamos presos, para efeito de análise comparativa, a esta base de dados. E o Critério Brasil fragmenta a classe média em subgrupos. Neste caso, a classe C seria a base de uma mini-pirâmide que compõe a classe média. Mas há um duplo equívoco de Jessé. O primeiro é que ele não percebe que se trata de uma transição na composição das classes sociais a partir da forte ascensão social dos últimos anos. Portanto, estamos falando de mudança de ideário e hábitos sociais no interior das classes sociais, em especial, da classe C. Isto já ocorreu outras vezes em nosso país, particularmente com o processo acelerado de urbanização a partir do final da 2ª Guerra Mundial. Francisco Weffort analisou a emergência do populismo a partir desta mudança de perfil que a urbanização causou naquele período. Tentei, com meu livro, fazer o mesmo. O segundo equívoco é que os conceitos de ralé e batalhador são impressionistas e partem de um juízo de valor. Batalhador sempre houve no Brasil. E me assusta esta vertente conservadora de definir o país a partir do empenho (ou empreendedorismo) individual e o não empenho. Não houve mudança na estrutura de classes. Houve a ruptura de uma história familiar de pobreza que se dá pelo consumo. É uma via passiva e tutelada de ascensão social. A nova classe C é desconfiada e tem na família seu porto seguro. Afinal, foi sua família que sofreu a pobreza. Mais, ainda: o conservadorismo comportamental aparece como elemento de negação do passado. O caso do aborto é emblemático. Muitos membros desta nova classe C se dizem contra o aborto. Mas têm muitos casos de aborto na família. Negam com todas as forças o passado e procuram se projetar com valores que afirmam o sucesso e a estabilidade familiar. Daí o conservadorismo comportamental. E também sua peculiar religiosidade. Weber sustentava que as classes menos abastadas não têm em seu passado algo a se identificar positivamente e se jogam para o futuro, para um futuro mágico para se justificar. Há, portanto, uma situação sociologicamente nova em curso, em que a inserção social se dá pelo consumo a partir de uma fração de classe ressentida. Ressentida, desconfiada e cínica politicamente. O ideário conservador e pragmático está fincado nesta âncora de sobrevivência. Mas é um segmento de classe individualista, que se finca nesta nova ordem, que não quer transgredir (mesmo transgredindo, de fato, tantas vezes na vida, para sobreviver), que não lê (mesmo porque, desconfia deste hábito das classes tradicionais), que quer "saltar fases de consumo" (da fome para o celular e tv de plasma). Enfim, esta é a expressão cultural da nova classe C. Que obviamente se distingue da classe média tradicional, segmento da classe B. Mas não temos uma nova divisão de classe, apenas uma nova composição em virtude da ascensão social de momento. Ao invés de analisar uma foto, temos que ter uma visão mais ampla e visualizar o filme desta transição.

10) Qual o peso da ascensão da nova classe média na sustentação do lulismo?
R: Total. O discurso de Lula, e até mesmo a sua imagem, criam uma forte empatia com esta nova classe média (na verdade, nova composição da classe C). A história de Lula é a expressão de sucesso e ascensão social dos pobres do Brasil. Não apenas a expressão dos pobres, mas da sua ascensão pelo consumo e poder. Lula soube traduzir como ninguém esta empatia ao fazer analogias com o futebol, ao dar sorrisos irônicos, ao se comover em público, ao carregar o isopor de cerveja em suas férias. Lula era a afirmação destes hábitos e valores populares que invadem o mundo das elites e chegam ao cargo máximo do poder público do país. E os pobres do país aguardam sua vez para ingressar neste mundo mágico. Por este motivo o enfrentamento com a grande imprensa faz sentido para este segmento de classe. Porque a grande imprensa não fala dela e nem para ela. Mas Lula falou e a cortejou. Interessante que no filme Entreatos, em determinado momento Lula diz que não era peão há tempos e se diz classe média. No mesmo filme, se regozija em utilizar ternos e saber fazer bem o nó de uma gravata. Lula foi e é a expressão maior da ascensão desta nova classe C.

11) O senhor também descreve o lulismo como uma engenharia política. Trata-se de uma ferramenta à disposição de Dilma ou é uma prática personalista, dependente do carisma? Como o lulismo se formou?
R: O carisma é parte integrante do lulismo porque a partir dele cimenta socialmente um projeto político. Mas não é populismo porque o populismo desconsidera as representações formais e as elites. O lulismo se apoiou nestas representações e elites. Ao contrário do populismo, o carisma é um instrumento estético do lulismo. O seu fundamento é o estatal-desenvolvimentismo apoiado no financiamento público do alto empresariado, na transferência de renda, na coalizão presidencialista (que minou o já frágil sistema partidário) e na criação de arenas neocorporativistas (envolvendo o mundo sindical e organizações populares). Esta lógica se revelou poderosa e fragilizou qualquer oposição real ao seu governo. Acredito que a motivação política sempre esteve no centro das ações do governo Lula. Mesmo toda política desenvolvimentista parece sempre motivada pela engenharia política que forjou. Daí acreditar que comparar os oito anos de gestão Lula com os dos outros governos pós-regime militar não tem muito sentido. Nenhum outro gerou uma estrutura de poder desta magnitude. O que será uma imensa sombra sobre os quatro anos de gestão Dilma.

Um comentário:

AF Sturt Silva disse...

Uai, acabei de ler um link de uma entrevista sua a Caros Amigos agorinha.Será que a mesma?

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