Do blog de Marcos Lourenço Capanema de Almeida:
A suplência de mandato não é do partido, nem da coligação! É da soberania popular!
A ordem de suplência nas listas abertas oriundas de coligações partidárias. Há algum tempo o TSE interpretou a constituição de modo a reconhecer norma que comandava o que se convencionou chamar de infidelidade partidária. Assim, criou-se o fetiche de que o grande problema do cenário político brasileiro seria a ausência de fidelidade partidária, sendo tal a solução para a crise de credibilidade e de moralidade que ainda permeia principalmente as casas legislativas. De tal pensamento, os imaginários jurídico e popular criaram a seguinte regra não-escrita que de certa forma é equivocada: o mandato é do partido (e ponto final!). Posto que bem intencionado, o entendimento de que o mandato é do partido guarda equívocos que andam se multiplicando em diversas decisões judiciais na seara do direito eleitoral e político. Atribulações e insegurança jurídica são criados; falsas expectativas alimentadas em eleitores, parlamentares, seus suplentes e agremiações partidárias.
A última e mais atual delas é fruto de decisão do pleno do STF no Mandado de Segurança 29988, a qual entendeu que após a eleição, extingue-se a coligação, sendo a ordem de suplência dos mandatos parlamentares estabelecida entre os filiados ao mesmo partido político e não entre os candidatos de todos os partidos que formaram a coligação segundo a ordem de votação. Vale dizer: se determinado partido “A” se coligou ao partido “B” e a coligação obteve coeficiente eleitoral para ocupar três vagas na casa legislativa, acaso os três mais votados na coligação forem do partido “A”, a vacância da vaga por qualquer motivo não dará ao suplente do partido “B” o direito de ocupá-la. A regra expressa no Código Eleitoral para o preenchimento das vagas pelos candidatos eleitos no sistema proporcional dispõe que tal ocorrerá pela contemplação de cada “partido ou coligação” pelo coeficiente partidário e pela média na ordem de votação recebida pelos seus candidatos (art.109, §1º do Código Eleitoral). Há previsão, ainda, de que apenas estão aptos a concorrer à distribuição dos lugares os “partidos e coligações” que tiverem obtido quociente eleitoral (art.109, §2º do Código Eleitoral). Apenas tais dispositivos, os quais são plenamente constitucionais, bastariam para tornar equivocada a recente conclusão do STF, sequer precisando adentrar a argumentação a essência do sistema eleitoral. A eleição para a Câmara dos Deputados, para a Câmara Legislativa do Distrito Federal, para as assembléias legislativas e câmaras municipais dá-se pelo sistema eleitoral proporcional de lista aberta, ou seja, a eleição a ser certificada pela diplomação dos eleitos segue a lista na ordem de votação dos candidatos que a formam. A lista, como se abstrai do artigo 109 do Código Eleitoral, por sua vez, forma-se pela votação obtida pelo partido ou pela coligação. Assim, seria mais correto dizer que o mandato é da lista e não do partido político que a compõe, pouco influindo se a coligação extingue-se logo quando findo o processo eleitoral. Entender que a ordem da suplência dá-se apenas dentro do partido em virtude da extinção da coligação com o fim do processo eleitoral seria tão absurdo quanto concluir que o candidato perderia o cargo se houvesse a extinção do partido político durante o período do mandato.
Falta à jurisprudência do TSE e do STF entender que o mandato não é do partido, nem da coligação. Em verdade, o mandato é fruto da soberania popular, a qual tem os sistemas eleitorais como balizas de sua representatividade e autenticidade. No sistema proporcional de lista aberta, no qual são eleitos em lista os candidatos na ordem de sua votação, o mandato deve obedecer à ordem desta sob risco de violarmos a vontade popular. Se o cálculo da lista é realizado levando-se em conta os votos da coligação e não dos partidos isoladamente, por óbvio serão os suplentes eleitos e diplomados na ordem da mesma lista como um todo e não se levando em conta apenas sua colocação em relação aos colegas de partido. O fatídico leading case do STF foi decidido por maioria de cinco a três, ausentes os ministros Celso de Mello e Ellen Gracie e, ainda, o futuro ministro Luiz Fux. Celso Mello já deu sinais de que pode contrariar o entendimento do pleno ao indeferir a liminar sobre o mesmo objeto no Mandado de Segurança n. 30321. Cabe agora à comunidade jurídica torcer para que os ministros ausentes naquela assentada sejam iluminados e realinhem a jurisprudência do STF com a melhor interpretação dos sistemas eleitorais e a ordem de suplência nas listas abertas oriundas de coligações partidárias.
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