quinta-feira, 28 de março de 2013

Igreja conservadora, católicos liberais

Importante, em tempos de profilaxia na igreja católica, compreendermos qual é efetivamente o grau de identidade dos católicos com sua igreja. No momento, há alívio após a crise aberta com a renúncia do Papa anterior. Mas este momento de namoro não tem garantias de ser renovado, em especial, caso a intenção explícita do Papa Francisco bater no muro de concreto da Cúria (ainda não está claro até que ponto as relações políticas do novo pontífice são amistosas ou conflitivas).
O Datafolha realizou pesquisa que indica que em termos de comportamento social, existe um hiato entre fiéis e igreja. A Folha, ao analisar os dados desta recente pesquisa, sugere que católicos brasileiros são mais liberais em quase toda pauta: 64% apoiam mulheres celebrando missas (índice superior à opinião de evangélicos, que estaria abaixo de 58%) e 41% aprovam a união homossexual (só menor que espíritas, onde 64% apoiam a união). O uso de camisinha e o uso de pílula anticoncepcional são apoiados por mais de 75% (chegando a 93% de apoio).
Faço uma leitura distinta da que a Folha publicou.
Os católicos brasileiros parecem se filiar às conquistas sociais que o mundo secular apresentou nas últimas décadas e não absorveu a leitura da igreja. Se a igreja articula a defesa da família com sexo apenas com função reprodutiva, a pesquisa do Datafolha sugere um ideário muito distinto em relação aos fiéis.
Contudo, não se trata de total liberalismo. Entre 60% e 70% dos católicos brasileiros não são favoráveis à união homossexual ou fim do celibato para padres ou aborto.
Parece evidente que a igreja não convence ou até mesmo não tem qualquer função pedagógica no campo do comportamento sexual. Seria necessário a realização de outras pesquisas complementares para entendermos a partir do que o católico se identifica com a religião que professa.
Tenho a impressão que a igreja enquanto instituição passa por certo desgaste ou limitação de sua influência como várias instituições modernas (como partidos políticos, a própria família e até mesmo as escolas) indicam deslegitimação neste início de século XXI.
Sei que alguns dirão que partidos e família são anteriores à Era Moderna, mas aqui, vale um registro. Os partidos, como organizações perenes e que atuam fora dos períodos eleitorais, se fiando por um programa, só apareceram no século XIX (antes, eram espécies de clubes ou ação entre amigos, denominados de partidos de notáveis). A família, por seu turno, como demonstram os estudos de Philippe Ariès, assumiram seu papel protetor como conhecemos somente a partir do final do século XVII. O emaranhado entre instituições modernas que se complementam formando um sistema parece fadado ao desmanche nesses tempos acelerados de relações fluidas e em recomposição permanente, ao estilo redes sociais.
A igreja pode ser um porto seguro, uma referência emocional (despertando necessidades atávicas), mas não tem função pedagógica como antes, não forma. Como uma relação filial, entre um filho adulto e seus pais que já se repetem, mas que acolhem, sempre que apita o sinal de alerta.

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