sexta-feira, 1 de março de 2013

Ainda sobre a biografia de Lincoln

Com o filme e a provocação de Lula, Lincoln nunca esteve tão em pauta no Brasil como agora. Citei, no blog, a biografia escrita por Doris Kearns que serviu de base para a elaboração do roteiro do filme. Expus algumas observações no início da leitura (inclusive certo veio esquerdista deste Presidente que liderou o Partido Republicano, quando tinha posturas mais democráticas e progressistas) e prometi que retornaria a comentar o livro quando concluísse a leitura. E... esqueci. Volto à promessa. Antes, uma breve observação sobre a provocação de Lula. Ainda não entendi por qual motivo freudiano a oposição e quem odeia Lula cair em todas provocações do ex-operário. Ele não faz nada e com uma simples frase, desperta os ódios mais recônditos (nem tão recônditos assim) que despejam nas redes sociais toda sua amargura. Lula se comparou, obviamente, com a história de Lincoln ter sido madeireiro na juventude (na verdade, ele foi advogado na vida adulta). Lincoln foi espezinhado e ridicularizado até por seus pares de partido, por ser um interiorano (um sertanejo, digamos), mas deu a volta em tudo, com muita calam e perspicácia, até ser uma unanimidade como um dos mais importantes e generosos Presidentes que os EUA teve.
E não é que a oposição cai na provocação?
Mas, deixe para lá.
Vou reproduzir duas das famosas anedotas que Lincoln adorava citar em momentos de tensão ou alegria e que constam no livro.
Quando das eleições parlamentares na metade do primeiro mandato de Lincoln, em plena guerra civil, em que os republicanos perderam em muitos Estados, o Presidente republicano foi questionado por um jornalista que queria saber como se sentia. A resposta:
"Mais ou menos como aquele rapaz do Kentucky, que deu uma forte topada enquanto corria para se encontrar com a namorada. Ele disse que já era grande demais para chorar e estava sentindo dor demais para rir."

Mais adiante, quando acompanhava os movimentos de traição de seu ministro e correligionário Salmon Chase, teria dito:
"As ambições de Chase me fazem lembrar da época em que lavrava um campo numa fazenda no Kentucky com um cavalo preguiçoso que de repente ganhou velocidade e seguiu com vigor para o fim do sulco. Quando alcancei o cavalo, descobri que uma mosca enorme estava grudada no seu focinho. Arranquei a mosca por não querer ver o velho cavalo ser picado daquela maneira. Mas um companheiro disse que foi um erro tirar a mosca, porque foi só por causa dela que ele ganhou disposição. Pois bem, se o sr. Chase tem uma mosca presidencial a picá-lo, não vou livrá-lo dela, desde que ela faça seu ministério funcionar."
 
Lincoln foi, talvez, o Presidente mais habilidoso que os EUA teve. Vou reproduzir uma última passagem que revela esta qualidade. O ministro Chase começou a se reunir com senadores e destilou ataques contra outro ministro (Willlian Seward) , responsável pela condução da guerra civil. Dizia que o gabinete ministerial estava em disputa eterna e que Lincoln não conseguia coordenar, por ser simplório, sendo conduzido por Seward. Os senadores reagiram e escreveram um documento solicitando a demissão de Seward. Ao saber do que ocorria, Seward se antecipou e entregou sua carta de renúncia ao cargo. Antes de se reunir com os senadores, Lincoln convocou uma reunião de gabinete, urgente, sem a presença de Seward e apresentou a situação, sem citar Chase. Então, pediu que os ministros reafirmassem se concordavam ou não com esta descrição feita pelos senadores, contra Seward e em função dos desencontros entre ministros. Os ministros, perplexos, defenderam Seward e juraram unidade, constrangendo o ministro Chase, que foi obrigado a ceder. Em seguida, Lincoln convocou reunião dos ministros com os senadores, para receber oficialmente o documento. Finalmente, deu a palavra para os ministros que, um a um, reafirmaram a unidade e o valor de Seward. Humilhados, os senadores se retiraram e passaram a atacar Chase, por tê-los usado num jogo sórdido e particular, além de revelar sua covardia durante a reunião com ministros e Presidente. Chase não teve outra alternativa que entregar carta de demissão. E aí, finalizando o jogo astuto, Lincoln convocou Seward e Chase e negou, aos dois, seus pedidos de renúncia, tornando-os devedores políticos.
Desconcertante, não?
Vale citar que mais tarde, Lincoln demitiria Chase.

Um comentário:

SENÔ BEZERRA disse...

Inteligente,sagaz, habilidoso.