segunda-feira, 15 de abril de 2013

Pesquisa no Reino Unido procura inovar identificação de classes sociais

As discussões brasileiras sobre a Nova Classe Média (ou Classe C) podem ser um bom momento para socializarmos (ou aprofundarmos) as discussões a respeito dos critérios válidos para dividirmos a sociedade em classes sociais. Neste sentido, o Reino Unido pode servir como apoio. Tenho a impressão que a Folha procurou se espelhar nesta pesquisa para criar uma classificação social similar.
Reproduzo, abaixo, uma breve exposição dos pesquisadores Mike Savage e Fiona Devine sobre a recente pesquisa (e classificação) que realizaram: a Great British Class Survey, parceria entre a BBC e seis universidades:


A Great British Class Survey foi organizada a partir do consórcio da BBC com seis universidades e definiu critérios de classificação a partir dos estudos e proposições de Pierre Bourdieu.
O sociólogo francês Pierre Bourdieu desenvolveu pela primeira vez sua abordagem de capital social em 1984, sugerindo que existem diferentes tipos de capital que dão às pessoas uma vantagem na vida. As dimensões econômica, cultural e social, podem se sobrepor, embora sejam distintas. Usando essa abordagem, temos uma distinção entre agrupamentos sociais.

A Pesquisa
Queríamos encontrar formas concretas de medir a quantidade de pessoas a partir das três dimensões (econômico, cultural e social).
As perguntas que fizemos sobre os interesses de lazer de pessoas, gostos musicais, o uso dos meios de comunicação e as preferências alimentares nos ajudou a construir uma imagem de consumo cultural da Grã-Bretanha.
Para investigar o capital social, foi utilizado um "gerador de posição", desenvolvido pelo sociólogo americano Nan Lin  em 2001 para medir a extensão das relações sociais das pessoas.Pedimos aos nossos participantes se eles conheciam alguém em 37 diferentes ocupações.
As perguntas sobre o capital econômico concentraram-se sobre a renda familiar, se você é o dono da propriedade, quanto vale e poupança. Isto significava que tínhamos medições extremamente detalhadas dos diferentes tipos de capital econômico.
Também coletamos informações detalhadas sobre composição do agregado familiar de pessoas, educação, mobilidade social e atitudes políticas. 

Capital Cultural

"Ir a concertos é uma forma emergente de atividade cultural"

Foi difícil trabalhar a forma de medir o capital cultural objetivando compreender como algumas atividades culturais tendem a se agrupar. Para saber quais as atividades culturais se articulam, produzimos estatísticas denominadas “análise de correspondência múltipla” sobre 27 atividades culturais listadas na pesquisa[1]. Esta análise baseia-se nos interesses que os participantes disseram que gostam e atividades que nos disseram que frequentaram ou se envolveram.
A partir desta análise, determinamos os interessados ​​em cultura "elitizada", como ir ao teatro ou ouvir música clássica; os interessados em cultura mais "popular"; e os interessados em cultura "emergente", tais como o uso de meios de comunicação social ou ir a concertos. 
Decidimos destacar a participação na cultura "elitizada" e "emergente", como medidas de capital cultural. 

Capital Social
As 37 diferentes ocupações listadas na pesquisa on-line para que as pessoas se identificassem se basearam no rol definido pela Escala Cambridge de Interação Social e Estratificação (CAMSIS)[2]. A partir daí, medimos a média de contatos sociais das pessoas e o número que identificavam as ocupações listadas (e que possuíam relação com elas).

Capital Econômico
Pedimos que as pessoas informassem sobre a renda e poupança familiar, e o valor de sua casa. Combinamos esta informação para fazer um "score" que representou a capital econômica de cada participante.
As  descobertas foram publicadas na revista Sociologia  e foram apresentados em uma conferência da Associação Britânica de Sociologia. 

A Classificação que emerge da Pesquisa

Mais de 161 mil pessoas participaram da pesquisa da British Class. A partir dos critérios definidos, a pesquisa identificou sete classes sociais:

Elite

Grupo mais privilegiado do Reino Unido, conta com mais alto nível em relação aos três indicadores (econômico, cultural e social). Representam 6% da população do Reino Unido.

Classe Média Tradicional

Segundo grupo mais rico, possui o segundo maior capital cultural. É o maior grupo social. Representa 25% da população do Reino Unido.

Classe Média

Grupo pequeno e distinto. Próspera, mas que possui baixas pontuações em relação ao capital social (considerada socialmente isolada) e cultural (considerado culturalmente apática). São 6% da população.

Novos Ricos

Grupo de jovens , social e culturalmente ativa, mas com níveis medianos de capital econômico. 15% do total.

Classe Trabalhadora Tradicional

Possui baixas pontuações em todas formas de capital (critérios adotados nesta pesquisa). Seus membros possuem padrões de moradia razoavelmente altos e se enquadram em faixas etárias mais elevadas. Envolve 14% da população do Reino Unido.

Trabalhadores de Serviços Emergentes

Novo grupo, formado por jovens urbanos, relativamente pobres, mas que possuem alto nível de capital social e cultural. Representam 19% da população.

Proletariado Precarizado

Mais pobres, formam a classe mais desfavorecida, possuem baixos níveis de capital social e cultural. Envolve 15% da população do Reino Unido.



[1] Os pesquisados responderam questões sobre relações sociais como esta: “com que tipo de pessoa você se relaciona socialmente?” Algumas das opções apresentadas foram: secretária, enfermeiro(a), professor(a), artista, presidente de empresa, cientista, motorista de caminhão, operador de telemarketing e contador. Sobre capital cultural, responderam a questão: “qual dessas atividades culturais você costuma praticar?” A lista de respostas compreende: visitar casas imperiais, , frequentar óperas, ouvir jazz, ouvir rock, ir a shows, jogar videogame, assistir a esportes, ir ao teatro, praticar exercícios/ir à academia, usar Facebook/Twitter, receber amigos em casa, ir a museus e galerias, ouvir música clássica, fazer trabalhos artísticos e/ou artesanais, assistir a espetáculos de dança ou balé e ouvir hip hop/rap.
[2] O projeto CAMSIS é uma avaliação internacional comparativa das estruturas de interação social e estratificação. Os valores de escala representam a posição relativa de uma unidade de trabalho dentro da ordem nacional de interação social e estratificação.

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