A foto na capa da revista, você já deve ter percebido, não é a minha, mas do Marcelo Adnet. E a entrevista abaixo também não saiu na íntegra. Mas a matéria ficou interessante.
1 - Como você vê o projeto de fundar um partido com o nome da Arena?
R: Seus idealizadores são bastante jovens e não viveram o período do regime militar. Sua idealizadora, a estudante de direito Cibele Baginski, possui 23 anos. Refutam o fascismo e se dizem “direita democrática”. O mais interessante é que querem resgatar valores como o nacionalismo e o direito à propriedade. Enfim, um programa não muito definido. O fato é que existe efetivamente traços de cultura política conservadora em nosso país. Basta lembrarmos da reação fundamentalista no final do primeiro turno das eleições presidenciais passadas. Nos Estados do sul, bispos católicos chegaram a pregar uma “Santa Aliança” com bispos evangélicos, contra a agenda de ampliação de direitos civis, como casamento entre homossexuais e legalização do aborto, entre outros. As pesquisas de opinião, realizadas pelo IBOPE e Datafolha corroboram um pensamento conservador em termos de comportamento. Todo este caldo de cultura não se expressa, até o momento, na estrutura partidária e está sendo capitaneado, eventualmente, por setores das igrejas cristãs.
2 - A nova Arena é formada por jovens que assumidamente são muito identificados com a direita e o regime militar. O que explicaria essa identificação, do ponto de vista político e sociológico? Geralmente os jovens são muito mais ligados a partidos de esquerda.
R: Há certo mito sobre a politização da juventude no Brasil. Afirma-se, muitas vezes, que a juventude era muito engajada nos anos 1960. Se havia grande engajamento, também havia uma parcela significativa de jovens que se envolviam com hábitos prosaicos, como o estilo playboy que se expressava pelo modo de comportamento da Jovem Guarda. Os dados recentes revelam que grande parte da juventude brasileira, que conforma a Geração Y, é refratária às regras e hierarquia, é imediatista e procura se comunicar via redes sociais. Não é, portanto, o perfil dos jovens que fundam a ARENA. Enfim, não temos que mitificar esta ala mais conservadora da juventude. Ao contrário, a grande maioria da juventude brasileira não se identifica com partido político. As redes, cuja relação é mais afetiva e efêmera, levam mais sua cara e identidade.
3 - Muitos desses jovens não viveram a época da ditadura. Isso pode influenciar na posição ideológica deles?
R: Na busca por uma identidade própria e, talvez, em função da rejeição à lógica política dominante (o que inclui os casos recentes de corrupção), estes jovens podem estar procurando sugerir uma estrutura social mais normatizada, mais regrada moralmente. São, obviamente, intolerantes à diferença, mas não me parecem ideologicamente preparados ou mesmo conscientes do que significou a ARENA no regime autoritário, ditatorial. Muitos dos valores que pregam foram justamente conspurcados pela ARENA. Enfim, acho que estes jovens propõem mais uma intenção romântica e um porto seguro que ideologia.
4 - De certa forma, a ideia de criar um partido de direita preenche um vazio ideológico, já que praticamente não há partidos assumidamente de direita hoje em dia e os que existem estão enfraquecidos?
R: Só preencheria se conseguisse se articular com o conservadorismo difuso que envolve grande parte dos brasileiros. Em outras palavras, somente se tornando partido de massas, enraizado no cotidiano de grande parte dos brasileiros e se tornando expressão da visão de mundo conservadora é que preencheria este vazio. Contudo, não me parece que esta seja a intenção e estratégia (se há, de fato alguma) dos criadores desta ARENA. Acredito que alas ultraconservadoras das igrejas cristãs brasileiras são mais potentes nesta tarefa.
5 - Quais podem ser as consequências de um partido como a Arena no cenário político atual, levando-se em consideração que eles optam por uma linha muito conservadora e alinhada aos ideais do regime militar?
R: O sistema partidário brasileiro não tem ideologia alguma. Aliás, estudos recentes demonstram que coligações partidárias heterogêneas (no Brasil) conseguem muito maior sucesso eleitoral que as coligações mais homogêneas do ponto de vista ideológico. Um conjunto de estudos sobre este fenômeno se encontra no livro organizado por Silvana Krause, editado pela UNESP e que leva o título “Coligações Partidárias na Nova Democracia Brasileira”. Parece ocorrer uma
tendência à desideologização partidária em função do processo eleitoral brasileiro. Não vejo, portanto, um caminho seguro para a ARENA a partir do atual sistema partidário. O PT rompeu, por um momento, esta lógica, mas voltou ao caminho natural com o advento do lulismo.
6 - Independente de qualquer ideologia, temos um fato novo na política?
Não. A política brasileira voltou ao seu veio tradicional, clientelista. Houve uma nítida atualização das figuras de tipo coronelísticos, caciques partidários e comando da política por políticos profissionais. Em todos partidos, são os deputados que comandam os diretórios. As lideranças sociais não encontram espaço, nem mesmo os filiados, nestas estruturas de tipo empresarial, altamente centralizadas e controladas. Só isto explica como são escolhidos e eleitos “postes”, figuras jejunas da vida política que, não raro, disputam sua primeira eleição.
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