quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Erundina, a companheira sem aspas

A deputada Luiza Erundina envia a vários de seus admiradores uma mensagem de agradecimento. Por iniciativa de cada um, foram doados recursos para que ela pagasse uma absurda condenação por ter apoiado a greve geral quando era prefeita de São Paulo. Como se este seu "crime político" fosse muito mais urgente que os inúmeros casos de corrupção que gastam tinta nas gráficas dos grandes jornais brasileiros.
Como é do feitio de Erundina, a mensagem de agradecimento não é barroca, não se percebe escorrer uma baba de moça a cada linha. Veja e julgue você mesmo:

Agradecimento por uma ação coletiva de solidariedade política
Por Luiza Erundina

Entre os acontecimentos que marcaram o ano de 2009, destacaria um fato inusitado, de profundo significado político, que nos surpreendeu a todas e todos, sugerindo que algo novo e transformador começa a despontar na sociedade brasileira, relacionado à política. Refiro-me ao extraordinário e espontâneo movimento de solidariedade política que envolveu milhares de pessoas pelo país afora que, movidas por forte sentimento de justiça, se mobilizaram para reparar uma injustiça de que eu fui vítima. É incompreensível que exatamente quem sempre se comportou, como era do meu dever, de forma ética e absolutamente fiel aos meus compromissos com a população, esteja sendo punida com tanto rigor. Suponho que, além do sentimento de justiça, um outro teria motivado tão amplo e plural movimento de solidariedade, que seria o de indignação diante de um fato insólito na história política brasileira, ou seja, minha condenação, pelo Poder Judiciário, a pagar uma dívida à Prefeitura de São Paulo de mais de R$350 mil reais, correspondentes ao valor reajustado, ao longo de vinte anos, da publicação, em alguns jornais, de uma nota informando à população sobre a posição do governo a respeito da greve geral dos trabalhadores, ocorrida em março de 1989. Foi uma decisão de um governo eleito pelas e pelos trabalhadores e que tinha compromissos claros com eles e com os setores populares da sociedade. Além disso, na época vivia-se uma conjuntura caracterizada por desemprego, arrocho salarial e inflação superior a 80%, exigindo, portanto, posicionamento claro a respeito de que lado se estava. Se do lado do governo federal, cuja política econômica impunha enormes sacrifícios aos trabalhadores, ou do lado destes, apoiando suas justas e legítimas reivindicações. E o nosso Governo optou por esta posição, pois tinha lado. Não era neutro, até porque a neutralidade não existe, pois ela sempre serve ao interesse de um dos lados em disputa. Tenho refletido e procurado julgar a mim mesma sobre aquela decisão e cheguei à conclusão de que era exatamente a que deveríamos tomar. E mais do que isso estou convencida de que, em situação semelhante, assumiríamos a mesma posição, fossem quais fossem os riscos que tivéssemos que correr. Aquela condenação provocou, como se viu, perplexidade e indignação em muita gente, resultando em um movimento de solidariedade política que envolveu milhares de pessoas, grupos, organizações populares, empresários, lideranças sindicais, parlamentares, dirigentes e militantes dos mais diversos partidos políticos; lideranças religiosas e de movimentos sociais e tantos outros que de forma anônima materializaram seu apoio depositando na “Conta:Luiza, apóio você” importâncias de dois, cinco, vinte, cinqüenta ou até valores de milhares de reais, o que possibilitou o “milagre” que só a solidariedade generosa e desinteressada é capaz de operar. O fato é que hoje, 4 de janeiro de 2010, já dispomos do montante suficiente para saldar essa dívida que a justiça me impôs.
Como explicar tão surpreendente reação? Senso de justiça? Afirmação e valorização da ética na política? Que lição tirar de tudo isso? Gestos de tamanha generosidade e solidariedade, não só me comovem, profundamente, como também me dão a certeza de que a política é mais do que a organização de pessoas em torno de um projeto de poder que disputa com outros projetos de poder, mas, a política é também ação coletiva de sujeitos livres que, juntos, constroem a cidade de todas e todos, como espaço de convivência fraterna e democrática. Finalmente, desejo expressar minha profunda gratidão a todas e todos que, de forma anônima e generosa, e muitos até com sacrifício, me ajudaram a sair da situação constrangedora em que me encontrava. Com os meus cumprimentos de fim de ano, formulo votos para que 2010 seja pleno de paz e de grandes realizações. Com abraços afetuosos.
Luiza Erundina
Contato: Brasília/DF - Câmara dos deputados - Anexo IV - Gab. 620 - CEP: 70160-900 Fone: 61 3215-5620 • Fax: 61 3215-2620

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