terça-feira, 22 de novembro de 2011

Os encapuzados da USP



RAYMUNDO DE LIMA*
Os encapuzados da USP, invasores da reitoria cuja bandeira de luta é o direito de uso de maconha e contra a presença da PM no campus, nos remete a uma pesquisa com 4.395 alunos realizada em 1998: a maconha havia se transformado num hábito tão comum como fumar cigarro no campus. De cada 100 alunos, 20 fumavam maconha com frequência; 27 costumam fumar cigarro. “De cada 100 alunos de medicina no sexto ano da faculdade, 82 bebem com frequência – o que não significa um caminho inexorável ao alcoolismo; 20% disseram usar com frequência algum tipo de tranquilizante quando estão no último ano do curso”. Próximo do final do curso aumenta o número de usuários e a propensão ao vício de drogas e álcool entre alunos. Os motivos para esse aumento são diversos: pressão dos estudos, estresse, solidão, depressão, convivência grupal pró-relax.
Alarmado com o envolvimento dos alunos da USP com as drogas e álcool, o reitor da época, Jacques Marcovitch, convocou um seminário multidisciplinar, para uma discussão sobre a descriminação da maconha e medidas de prevenção e tratamento. O narcotráfico já dominava a USP/capital, e os demais campi do interior de São Paulo em 1998.
Fiz meu doutorado na USP, entre 2001 e 2005: notícias corriam que cidade universitária era insegura, havia assaltos e estupros, o cheio de maconha era forte, os narcocapitalistas se vestiam como estudantes politizados. O crack ainda não tinha invadido o campus. O movimento estudantil estava esvaziado de alunos e de bandeiras de lutas. Depois dos ataques aos EUA, em 2001, o dito marxista “a religião é o ópio do povo” virou algo como “religião pode ser arma contra o capital”. Pior, alguns admiravam os narcoguerrilheiros das Farcs. O movimento estudantil uspiano – entre outros – teriam se rendido ao vício e à barbárie?
Ninguém duvida que boa parte do movimento estudantil é braço dos micro-partidos de vocação anti-democrática (a maioria odeia a democracia “burguesa”). Também há os independentes, pró-democracia. Há os que defendem o direito de fumar maconha, crack, cheirar coca, liberar bebidas em torno das universidades – como já aconteceuem Maringá. Ora, uma das funções dos cursos universitários é também praticar “extensão”: prevenção e tratamento aos drogadictos, alcoolistas, doentes psíquicos e somáticos. Há professores que se omitem; outros fazem discurso com um olho só (O Diário, 15/11/2011-Opinião e Cx Postal 17/11).
No episódio da USP/2011, um professor pediu na imprensa fazer vistas grossas aos grupos, principalmente na FFLCH e nas moradias do CRUSP, fumando maconha ou crack? O falso argumento que só a comunidade pode vigiar, só reforça o riso dos narcotraficantes. As comunidades dos morros do Rio vigiavam com medo do poder dos narcocapitalistas que criaram um governo paralelo. É isso que eles querem que ocorra com a USP? Alguns fazem discursos cínicos do tipo: “maconha inspira ideias filosóficas”; “fumar maconha é um delito menor”, “a juventude é a fase do experimento”,”o cigarro mata mais do que a maconha” (frases de professores respeitáveis). O mais surpreendente discurso veio do ex-presidente FHC, com cara de bem intencionado.
A exemplo do Rio, há pedidos de uma UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) para a USP. Mas parece que a PM paulistana não tem força moral-estratégica para enfrentar o conluio entre alunos e narcocapitalistas. Até porque a história desta PM remete ao tempo da ditadura: reprimia as liberdades políticas no campus. Que fazer quando a resistência é fundadaem paranóia. Blá!
As universidades públicas hoje passam pelo dilema: autorizar o policiamento no campus, ou deixar o narcotráfico mandar? Universidades públicas bem investem no ensino e pesquisa, mas ignoram a sabedoria e são reféns dos interesses político-ideológicos. A cultura uspiana é arrogante, se pensa numa ilha, alunos, professores e funcionários exigem privilégios de burgueses, mas se imaginam proletários. Imagine: o pai ou mãe contente de ter o filho estudando numa boa universidade fica sabendo que ele foi adotado pelos os narcocapitalistas, ou é laranja de um micro-partido fundamentalista. O movimento estudantil uspiano – entre outros – precisa ser mais razoável e estar sintonizado com o movimento estudantil mundial, no mínimo.
Obs.: os alunos que invadiram a reitoria da USP consideram “de direita” o PSOL e o PSTU.

* RAYMUNDO DE LIMA é Doutor em Educação (USP) e Professor do Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Estadual de Maringá (DFE/UEM).

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