Sandra Regine Nunes, da USP e do Laboratório de Estudos da Intolerância da FAAP, destaca em entrevista concedida ao Terra que os ataques que Lula sofreu pelo twitter e facebook nos últimos dias tem relação com a ascensão social que ele representa. Para quem não acompanhou, logo após o anúncio do tumor, alguns internautas postaram mensagens afirmando que Lula deveria se tratar no SUS e não no Sírio Libanês. O preconceito e desrespeito foi comentado até pela CNN.
Sandra afirma:
Sandra Regina Nunes - O que me parece é que tem algo bastante próprio daqui do Brasil. As críticas se apoiam no fato de Lula ter sido analfabeto e se tornado presidente, de ele ter ascendido. Isso é visto quase como uma afronta. Faz com que as pessoas acreditem que necessariamente ele deveria ser fiel àquilo que ele pregava. Por muitas vezes ouvi pessoas dizendo "Ah, ele era trabalhador, não podia estar usando Armani". Agora dizem que o Lula tem que usar o SUS. Não me parece que aconteceu isso quando alguém do PSDB tem algum tipo de problema de saúde. Por que não se faz uma manifestação para que todo mundo use o SUS? A questão é menos de fidelidade com os ideais políticos e mais um preconceito. É como se questionassem: "Por que Lula tem que se tratar no Sírio Libanês? O lugar de onde ele veio não permite que isso aconteça".
Compartilho desta avaliação. Defendi a tese, no meu livro sobre o lulismo, que Lula espelhou (ele próprio) a ascensão social de 40 milhões de brasileiros à Classe C. Se Getúlio falava para os operários e emergência de classes urbanas, Lula fala para a classe C, também emergente.
E o mesmo preconceito destilado contra o consumo da Classe C ("descabido", "sem planejamento", "exagerado", "que transforma os aeroportos em rodoviárias") é o que motiva os ataques - revelando ausência total de respeito e solidariedade humanas - contra Lula.
Mas há um elemento adicional: parte da Classe C alimenta o mesmo preconceito como maneira de se afastar de todo passado de penúria, ainda que muito recente. Um forte conservadorismo é alimentado como fuga do passado.
Finalmente, não há como esconder que parte da oposição (incluindo eleitores anti-lulismo) temem o uso político do adoecimento para fortalecimento do mito e o consequente retorno do "queremismo".
Estamos diante, portanto, de uma reação que alimenta os piores sentimentos de diversos segmentos sociais, ainda que fração da sociedade brasileira. Algo que já se expressou publicamente no final do primeiro turno das eleições passadas.
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