De partido de bases a um partido da ordem
ANÁLISE: Rudá Ricci, cientista político da UFMG e diretor-geral do Instituto Cultiva, em Belo Horizonte - O Estado de S.Paulo
O PT nasceu prometendo ampla participação dos seus filiados no processo de decisão interna. Ele começou assim. A decisão de não participar da eleição indireta, que fez de Tancredo Neves presidente da República, teve origem num veto da base partidária, contra a vontade de grande parte dos parlamentares petistas.
A eleição interna desta semana revela profundas mudanças. A participação direta de Lula e medalhões do partido na convocação de eleitores filiados; a direção quase exclusivamente nas mãos de políticos profissionais; o índice de abstenção, que no Rio de Janeiro foi muito superior a 50%; e as críticas generalizadas de dirigentes sobre um processo desgastante, fratricida e pouco participativo indicam que o partido da participação direta vem se transmutando em partido da ordem. Mais um partido governista.
A legenda que foi baseada nos chamados núcleos de base hoje tem na sua presidência um parlamentar que consegue se reeleger com 70% dos votos, o que demonstra um grande desequilíbrio interno. Cabe destacar que Rui Falcão nunca foi o dirigente mais popular no interior do PT.
Mesmo assim, como parte de uma corrente majoritária, tendo o apadrinhamento dos principais líderes, consegue essa vitória acachapante. O partido da democracia interna se tornou um partido previsível em que a alternância do poder é cada vez mais questionada pelo próprio processo de escolha de seus dirigentes.
'PT pragmático' amplia sua hegemonia
Com apoio de Lula, Rui Falcão é reeleito presidente da sigla com votação recorde e deve submeter alianças estaduais a projeto de Dilma
Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo
O quinto Processo de Eleição Direta (PED) do PT terminou nesta terça-feira, 12, com uma vitória consagradora do pragmatismo eleitoral, mas escancarou a perda de entusiasmo da militância com a vida partidária. Ungido pelo ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, o deputado estadual paulista Rui Falcão foi anunciado vencedor da disputa interna no meio da tarde, quando ainda faltavam 20% das urnas para serem apuradas.
Mas certamente não chegará perto do resultado que elegeu José Eduardo Dutra em 2009.Ele recebeu 70% dos votos válidos dos petistas, o que significa a maior votação que um presidente do PT já recebeu desde a instituição das eleições diretas internas em 2001. Por outro lado, o comparecimento às urnas foi significativamente menor. No último PED, realizado em 2009, 520.417 petistas votaram. Em 2013 foram 367.298. Esse número deve aumentar até que as últimas urnas sejam conferidas, o que não aconteceu até o fechamento desta edição.
Falcão, que comandará a máquina partidária petista até dezembro de 2017, não fez concessões à linha pragmática implementada por José Dirceu em 2001 e foi o único entre os seis postulantes que defendeu enfaticamente durante a campanha a prioridade total da aliança entre PT e PMDB. Seus adversários revelam que nunca antes na história do partido o ex-presidente Lula se engajou tanto em uma eleição interna.
"A costura da chapa do Rui Falcão foi feita pelo Instituto Lula. Essa nova direção é mais alinhada e tem um grau de aderência maior com o ex-presidente", diz Markus Sokol, que disputou o PED pela corrente "O Trabalho". Pela primeira vez desde a fundação do PT, Lula participou ativamente de uma campanha interna.
Salomônico. Rui Falcão disse ontem que a crise com o PMDB, que ameaça se desgarrar do PT nas eleições estaduais, está equacionada. "O quadro está mapeado e o processo será civilizado e sem rupturas. Em vários Estados teremos duas candidaturas", afirmou.
Além do embate com os peemedebistas, em vários Estados, como Goiás, Espírito Santo e Amapá, os diretórios regionais petistas têm planos que não coincidem com a estratégia nacional. Para ajustar a "sintonia fina" e evitar intervenções, Falcão convocou uma reunião para o próximo dia 2, em São Paulo, com todos os presidentes estaduais do partido eleitos no PED. "Queremos avaliar onde há descompasso e falta de sintonia", disse.
Um dos casos mais emblemáticos é o do Maranhão, onde o PT está dividido entre apoiar o PMDB de Roseana Sarney e a candidatura de Flávio Dino, do PC do B ao governo. A solução no Estado, segundo Falcão, pode ser "salomônica": o PT apoiaria Roseana para o Senado e Flávio Dino para governador.
A crise entre o ex-prefeito Gilberto Kassab, presidente do PSD, e o atual, Fernando Haddad (PT), foi minimizada pelo presidente do PT, Falcão revelou que está articulando com Kassab um grande evento ainda esse ano para formalizar o embarque oficial do PSD na coligação eleitoral da presidente Dilma Rousseff
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