sexta-feira, 25 de maio de 2012

ENEM, outra vez

O inverno começa no dia 20 de junho. Mas, faltando menos de um mês, já começamos a entrar nos temas que gelam a alma de qualquer educador.
O ENEM foi uma construção intelectual, baseada nas Inteligências Múltiplas (conexões nervosas relacionadas à processos específicos de decisão humana - lógico matemático, intrapessoal, linguístico, espacial, entre outros - identificados pelo Projeto Zero, de Harvard). As questões nele contidas inicialmente (coordenadas pelo matemático da USP, Nilson José Machado) se concentravam em situações-problema e não questões por área do conhecimento. Uma inovação e tanto e uma vitória de educadores preocupados com o processo de aprendizagem e desenvolvimento humano (de piagetianos a vygotskyanos, da psicologia à neurologia).
Mas, aí, o governo federal tentou nacionalizar o ENEM. A nacionalização do vestibular é uma vitória política porque desmercantiliza o sistema de acesso à universidade brasileira. Se aproxima, inclusive, no modelo norte-americano, o SAT. Nosso vestibular, por universidade, não afirma o que o Brasil considera como conhecimento válido para o jovem candidato, mas o que uma unidade específica acredita que é básico, criando toda uma cadeia produtiva a partir daí (de apostilas a palestras, visitas técnicas, negociações etc).
Mas o fato é que nas negociações para as universidades federais adotarem o ENEM como instrumento de seleção, o ENEM foi se desconfigurando. Se aproximou nas questões por áreas de conhecimento. Uma pena.
Há, contudo, possibilidades de retomada do projeto mais ambicioso. Obviamente que podem ser adotadas se a educação não ficar presa nas mãos de economistas que só pensam em formação para o mercado de trabalho. Se ser  humano não for tratado como número, até dá.
Como?
Primeiro, se adotarmos a proposta de Cristovam Buarque, criando o processo de avaliação sequencial. No final de cada ano do ensino médio, um ENEM. No primeiro ano, a nota teria peso 01; no segundo ano, peso 02; no terceiro, peso 03. Esta metodologia possibilitaria matarmos vários coelhos. Forçaríamos a vinculação do ENEM com todo conteúdo ensinado nos três anos do ensino médio, e não apenas no último ano. Com isto, mataríamos outro coelho: os cursinhos preparatórios para o ENEM, uma vergonha nacional que revela a falência do ensino médio, seriam substituídos pela aula regular, sem cursinho. Um terceiro coelho que poderíamos matar é a avaliação da própria política educacional. Porque poderíamos ter uma série histórica do desempenho dos alunos ao longo do ensino médio. Se uma parte considerável dos estudantes tiver avaliação baixa no ENEM do primeiro ano e esta situação não for alterada ao longo dos dois anos seguintes, saberemos que o problema é da política educacional e não apenas da sala de aula.
Há, entretanto, outra inovação interessante. Inclui, também, o direito do candidato que presta este exame. Em virtude da Lei de Acesso à Informação Pública, o ENEM deste ano possibilitará que o candidato acesse a correção da sua redação. Ponto positivo. Mas ocorre que o MEC não faculta o direito de pedido de revisão. Para tanto, o candidato terá que acessar a justiça comum. Ora, por qual motivo não pode exercer este direito? Justamente porque criaria uma avalanche de pedidos de revisão. Mas e se adotarmos a metodologia do SAT norte-americano? Lá, o aluno pode agendar seu exame. Um país de dimensões continentais como o nosso. Penso que poderíamos adotar uma caminhada nesta direção, aumentando as datas de aplicação do ENEM. O aluno poderia agendar duas possibilidades. Na medida em que uma data é preenchida até um teto máximo de provas, o aluno que se inscreveu depois seria automaticamente agendado para a segunda data. Assim, diminuiríamos a pressão para processos de revisão das correções.
Se avançarmos nesta direção, poderemos avançar na construção das questões do ENEM. Talvez, até retornarmos às questões situações-problema.
O que não dá é para continuarmos discutindo se o ENEM está sendo bem aplicado e esquecermos de analisar o mérito desta avaliação. Algo, aliás, que vem empobrecendo as discussões dos pais e grande imprensa sobre este tema.

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