UM ANO DE DILMA: SURPRESAS
E DESAFIOS
balanço, de uma perspectiva da cidadania. Claro que é um ponto de vista
a partir do lugar que ocupo numa organização de cidadania ativa
Não é aquele encontro entre povo e nação encarnado por Lula, migrante
nordestino, operário, identificado com a cultura popular. Mas é fundamental que
se reconheça o quanto Dilma representa para o enfrentamento e a ruptura do
estrutural patriarcalismo do poder no Brasil. Pelo que sei, ela não tem uma
história de militância cidadã no feminismo, mas está se portando como se assim
tivesse, o que torna a sua atitude extremamente relevante na perspectiva
democrática de transformação do Brasil, de inclusão, justiça social,
participação e sustentabilidade.
Relações internacionais
Lula teve o grande mérito de instaurar uma agenda de Brasil emergente,
numa estrutura mundial muito polarizada pelos países desenvolvidos, sob o manto
da hegemonia dos EUA. Ele deu atenção especial às relações Sul-Sul e às
possibilidades de mudança no quadro de poder global. Só que Lula nem sempre se
portou pautado por uma agenda de condicionalidades democráticas e de direitos
humanos. Ele atropelou e agiu pragmaticamente. Dilma é mais coerente e tem
cuidado com a legitimidade democrática da atuação brasileira, um grande país
emergente, sem bomba atômica, vale a pena ressaltar.
Faxina nos ministérios
É bem verdade que muitos ministros foram substituídos por causa da
corrupção. Mas esse fato em si não me parece indicar uma grande mudança na
Política (com P maiúsculo mesmo). O poder no Brasil – nos três Poderes, diga-se
de passagem – é visceralmente tomado pela corrupção, com raízes profundas no
patrimonialismo e clientelismo.
(...) A cidadania não está nesse jogo e por isso a tentativa de recriar
algo parecido ao movimento de ética na política está dando com os burros
n’água.
Participação cidadã
Com Lula, o palácio de “portas abertas” à diversidade brasileira e o
estímulo à participação em mais de 50 conferências nacionais e não sei quantos
conselhos mobilizou milhões de brasileiras e brasileiros, mesmo que esses
espaços tenham tido pouco poder real. Geraram muitas frustrações, pois eram e
são, acima de tudo, espaços consultivos para construir consensos e agendas
possíveis. Porém, em termos democráticos o Brasil ganhou do governo Lula a
maior escola do mundo de aprendizado da cidadania política
O poder político não mudou por isso e ainda vai demorar a mudar, mas a
democracia se fortaleceu como estratégia e processo capaz de operar mudanças
sustentáveis no longo prazo, como são as revoluções democráticas.
Nesse campo fundamental da democracia, onde a contribuição do PT fez
diferença Dilma parece que não se move com facilidade e com visão
estratégica. O combate à corrupção sem participação cidadã não passa de
maquiagem no governo. A presidenta Dilma passa uma imagem de executora e que o
mais importante no governo é a eficiência em si, quase algo tecnocrático.
Erradicação da miséria
Trata-se de uma tarefa ética incontornável e inadiável, porque
possível, dada a pujança de nossa economia. Salta aos olhos, porém, e explica
uma não empolgação com o “Brasil Sem Miséria” a falta de participação cidadã no
desenho dos objetivos e na execução do programa. Também me incomodou a ausência
da presidenta Dilma na recente Conferência Nacional de Segurança Alimentar,
apesar da participação do ministro Gilberto Carvalho ter mitigado o problema.
Agenda desenvolvilmentista
Por fim, destaco o modo como Dilma e seu governo dão continuidade a uma
agenda desenvolvimentista, baseada nos grandes projetos e grandes corporações
empresariais, sem ao menos discutir tal agenda com amplos segmentos da
cidadania ativa. Outro lado igualmente ruim nessa agenda é a sua elaboração e
defesa com renovado ímpeto.
A muita riqueza que ele gera se concentra em poucas mãos e é feita às
custas da destruição ambiental, com ameaças à sustentabilidade da vida no
planeta. Trata-se de produção de luxo e lixo em benefício de poucos (os
movimentos de indignados, que se espalham pelo mundo, martelam no 1%,como o
tamanho dos verdadeiros beneficiados).
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