terça-feira, 30 de outubro de 2012

Entrevista sobre imprensa brasileira ao jornal Impressão (Uni-BH)


P: Pesquisa recente do Ibope, que tomou por base a região metropolitana de São Paulo, apontou um aumento na desconfiança do brasileiro nos veículos de comunicação: rádio, TV e jornais impressos. A que você atribui essa percepção do brasileiro perante a mídia? 
R: São dois fatores principais. O primeiro, a emergência da denominada Classe C que tem histórico familiar onde o hábito de leitura é praticamente nulo. Embora não constitua uma classe, mas um segmento de renda que aumentou seu poder aquisitivo, possui características próprias, como o profundo ressentimento em relação ao tratamento que os mais abastados dispensavam aos seus membros no passado (incluindo sua família). A imprensa e os políticos são vistos como parte constitutiva desta rejeição de classe. Portanto, desconfiam da maneira como projetam e interpretam a realidade. O segundo fator é a maneira como a grande imprensa vem se partidarizando que se choca justamente com os valores deste segmento (que, hoje, representa 53% da população brasileira). Grande parte dos editores da grande imprensa ainda focam sua linha editoral a partir dos valores da classe média tradicional, que antes formava opinião no Brasil. Estes emergentes do consumo de massa não se identificam com esta visão de mundo. Daí que os jornais mais vendidos no Brasil são os que adotam uma linha popular, como o Extra, do RJ.

P: Como o senhor avalia o jornalismo que é feito no Brasil? O que os veículos precisam fazer para mudar essa opinião dos consumidores de notícia? 
R: Os veículos se partidarizaram radicalmente, principalmente nos últimos dez anos. As linhas editoriais são claras e disseminam certo rancor com as mudanças que o Brasil sofreu na última década. Tenho a impressão que, muitas vezes, a linha editorial se choca com o fato, com a notícia. As opinião ganham mais relevo que a reportagem. Basta falar com jornalistas de campo para ouvir queixas sobre cortes e mudanças de pauta pelos editores. A famosa editoração. Falta matéria de rua, de leitura sobre o país real. Os jornais estão muito enfornados nos gabinetes. Até 1980, os jornalistas especiais cumpriam esta pauta de ler o Brasil como ele é. Hoje, isto custa caro e se prefere divulgar release de agências de notícias ou emitidas pelo poder executivo.

P: Até que ponto o desenvolvimento do jornalismo na internet pode ter afetado nessa perda de credibilidade dos veículos tradicionais? 
R: O jornalismo na internet não parece ter afetado muito. Mas as redes sociais, sim. Porque as redes são movimentos de construção de notícias  e interpretações. Na prática, se multiplicam instantaneamente e são, quase sempre, acompanhadas de opiniões, perplexidades, novas notícias, rejeições, enfim, o sujeito está ali compondo um mosaico que vai se desenhando a cada acesso novo. Isto, nem mesmo o jornalismo na internet faz. Em outras palavras, a linguagem jornalística é vertical, cujo comando e interpretação já estão embalados na redação. As redes sociais operam de maneira distinta pois disseminam notícias que são checadas e interpretadas como um jogo de quebra cabeças. É muito mais participativo e reflete algo com mais frescor e menos manipulado.

P: O senhor acha necessária a criação de um órgão que fiscalize o trabalho da imprensa, de modo a evitar distorções e propagação de notícias inverídicas? 
R: Tenho profundo receio de controle do trabalho da imprensa, mas nem tanto em relação às empresas. Porque sabemos como muitas redações são cerceadas pelos editores e diretores de jornais. Portanto, a questão é como defendemos a liberdade de imprensa e coibimos a libertinagem de empresas tentarem forçar uma interpretação de uma notícia para formar opinião. É chegada a hora de impormos mais rigor sobre manipulação de informações, censura nas redações pelos quadros superiores da gestão do negócio jornalísticos, substituição da notícia pela opinião de colunistas escalados para disseminar uma leitura comercial. Sou, portanto, contra todo tipo de censura, do Estado ou dos empresários.

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