domingo, 16 de outubro de 2011

Os 90 anos de Dom Paulo Evaristo Arns

Conheci Dom Paulo quando ingressei na PUC-SP, em 1980. No ano anterior consegui ficar alguns metros dele, sentado no chão do TUCA, quando Paulo Freire assumiu uma cadeira no pós-graduação à convite de Dom Paulo. Obviamente que ele era muito comentado pela coragem. Mas o mais interessante é que logo depois, já como aluno da PUC, fiquei ainda mais pasmo ao ouvir uma espécie de acolhida que ele nos ofereceu. O que me lembro era ele falar que devíamos acompanhar a efervescência das ruas, conhecer as greves dos operários do ABC paulista, trabalhar em frentes de trabalho social nas periferias. A PUC tinha este ar de liberdade e desafio social. Descer a rampa da entrada era entrar no mundo da juventude, caótico e instigante. Cartazes por todos os lados, faixas, poetas que instalavam mesas e recitavam poesias, aulas de capoeira, debates e seminários. Com Dom Paulo, a biblioteca ficava superlotada nos sábados, com dezenas de grupos de estudos (que não estudavam para provas e exames, mas para compreender o país). As aulas eram debates intensos. Os alunos se alinhavam às correntes teóricas. A PUC exalava liberdade e engajamento. O silêncio que Dom Paulo se impôs nos últimos quatro anos combina com o silêncio da CNBB em relação ao seu histórico engajamento político e social.
Mas até o silêncio de Dom Paulo é mais ouvido que os bispos conservadores da atualidade.
Aproveito para reproduzir um breve comentário de Ricardo Kotscho:


Em meio a tantas notícias desanimadoras, é com muita alegria que registro aqui o aniversário de 90 anos do meu amigo D. Paulo Evaristo, cardeal Arns, um brasileiro da melhor qualidade que me ensinou a nunca perder as esperanças e a vencer o medo em nome de um compromisso maior com o nosso tempo e a nossa gente. Convivemos quase diariamente durante os piores tempos da ditadura militar quando ele me convidou a fazer parte da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo. Sempre sereno, mesmo nos momentos mais graves, com sua voz baixa e passos miúdos, ele conversava de igual para igual com mendigos e generais. Sob o comando dele e do reverendo Jaime Whrigt, tive a oportunidade de participar do projeto editorial Brasil Nunca Mais, um inventário dos crimes praticados contra a dignidade humana pelos militares que se mantiveram no poder de 1964 a 1985. Talvez tenha sido esta a chave de ouro de uma carreira toda dedicada a ajudar na construção de um Brasil mais justo. Hoje, enfrentando problemas de saúde, mas lúcido e intelectualmente ativo, D. Paulo mora no Instituto Paulo VI, em Taboão da Serra, onde está recebendo a visita de seus familiares de Forquilhinha, a cidade onde nasceu, em Santa Catarina. Heródoto Barbeiro e eu devemos fazer-lhe uma visita ainda esta semana.

6 comentários:

Marcelo Delfino disse...

"O silêncio que Dom Paulo se impôs nos últimos quatro anos combina com o silêncio da CNBB em relação ao seu histórico engajamento político e social."

Eu sei que silêncio é esse de Dom Paulo e dos outros bispos da CNBB. É vergonha de terem criado o PT e terem levado ao poder o Filho Bastardo do Brasil e seus asseclas. A CNBB é a mãe do PT e o pai é o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. O que acontece quando juntam aqueles macacões com batinas enfeitadas de vermelho ou roxo é impublicável.

Rudá Ricci disse...

Está enganado, Marcelo. Este é o problema de opinar sobre quem não conhece. Eu conheci Dom Paulo. Ele não ajudou a criar PT nenhum. Era amigo de Mário Covas.
E você foi agressivo em demasia no seu comentário. Somente Freud explicaria.
A Igreja Católica faz parte da alma brasileira. Gostemos ou não. E o melhor da história dos católicos foi o engajamento no período da ditadura militar, lutando pela vida, pela justiça social. Hoje é este conservadorismo, cópia desbotada da igreja católica européia. Ao menos era original. Agora, é uma falácia.

BLOGUEIANDO disse...

Concordo com Rudá. D. Paulo merece todo o respeito pela sua vida e militância pelas causas sociais...O Marcelo Foi infeliz em suas colocações e perdeu uma boa oportunidade de ficar calado

Marcelo Delfino disse...

A Igreja Católica faz parte da alma brasileira. Concordo. E digo mais: o cristianismo em geral (não só o católico) faz parte da gênese da nacionalidade brasileira. Houve uma primeira Missa com os membros da esquadra de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro, e um primeiro culto protestante na França Antártica, na Baía de Guanabara. Tanto que o movimento nacionalista MV-Brasil (grupo secular presente até no Fórum Social Mundial) costuma espalhar cartazes no Rio de Janeiro na época do Haloween, assim: "Haloween é o cacete! Brasil, país cristão!". Mas tem gente que não concorda com a natureza cristã da nacionalidade brasileira. Blogueiros progressistas, como Zé Carlos e Raphael Tsavkko Garcia. Agora, essa de igreja europeia, igreja brasileira é que é uma falácia. A Igreja é uma só, a Santíssima Trindade é uma só, o credo apostólico é um só, e o Papa é um só. Fora do campo da fé, cada fiel pode escolher o que bem entender. Tanto que há os esquerdistas, os direitistas, os nacionalistas, os internacionalistas, os progressistas, os conservadores e os reacionários. Nesse sentido, há muito mais liberalidade na Igreja que os detratores costumam dizer. Basicamente, apenas o liberalismo, o comunismo e o socialismo foram formalmente condenados por vários Papas. É óbvio que os adeptos das três ideologias tem a liberdade de não integrarem a Igreja, ao invés de fingirem serem fiéis que não são.

Não é só sobre o Dom Paulo que faço observações. Mesmo porque, como dito, não o conheço pessoalmente (como Covas conhecia) e ele está acima da média na dita igreja progressista. É sobre a ala vermelha da CNBB que faço observações (vermelha de esquerda, não o vermelho escarlate dos cardeais). Bispos como os de Guarulhos, de Porto Alegre e da Paraíba são minoria. A Santa Sé já devia ter decretado intervenção na CNBB, entidade ainda vista erroneamente como "A Igreja". Passando por cima das dioceses. Mas nada indica que haja uma intervenção, durante o atual Pontificado.

Agora, fico indignado com essa versão utilitarista da Igreja. Pra muita gente da esquerda, ela só prestou quando tinha muitos membros com afinidade ideológica e enquanto foi foco de resistência ao Regime de 1964. Foi só acabar o regime militar e mudar o perfil político do conjunto dos fiéis que passaram a trata-la como um objeto descartável. Como um bagaço sem suco.

Por fim, agradeço pelo "agressivo em demasia". E olhe que fui, mais uma vez, bastante comedido. Se eu fosse membro da esgotosfera de direita ou da blogosfera progressista, você veria o que é de fato ser agressivo em demasia.

Marcelo Delfino disse...

Onde está escrito "versão utilitarista da Igreja" leia-se "visão utilitarista da Igreja". É óbvio que essa palavra é que combina com o restante do texto. Admito que errei a digitação no texto anterior.

Marcelo Delfino disse...

Só pra completar: hoje o PT e os governistas preferem muito mais os cumpanhêros Macedo e Crivella. Eu vi sindicalistas do Rio de Janeiro fazendo campanha pela reeleição do senador Crivella em 2010.