domingo, 9 de outubro de 2011

O livro de Frei Betto sobre Minas Gerais

Sempre que leio livros de Frei Betto fico com a impressão que faltou pesquisa, que se trata de leitura rápida. Este é o caso de Minas de Ouro, seu último livro. Há vários erros históricos e se resvala em certo lugar comum. Este é o caso da feijoada, que logo de início o autor cita aquilo que já virou folclore, ou seja, que sua origem teria sido fruto de restos de porcos que os senhores de engenho jogavam na senzala. Carlos Augusto Ditadi publicou artigo na revista Gula (maio de 1998) em que deixa claro que a feijoada nunca teria nascido de restos de comida e que não há nenhum registro documental sobre o fato. Pedro Nava, em Baú de Ossos, relata como o prato era servido, em camadas. Numa entrevista, afirma que o prato nasceu do cassoulet francês.
A base das refeições dos escravos era farinha (de mandioca ou milho). Faziam três refeições por dia (8 da manhã, 13h e 20 horas) e a base era angu de farinha e feijão temperado com sal e gordura. No período de colheita de café, não era raro que um porco inteiro fosse oferecido aos escravos. Afinal, a base da riqueza do complexo rural monocultor era justamente a mão-de-obra escrava.
Por outro lado, a elite rural comia exatamente estas partes que a lenda afirmava constituir os "restos" que se transformavam em feijoada nas mãos calejadas dos escravos negros. A elite comia língua, miolos, molhos de tripas, fígado, linguiça de sangue. Debret destaca o ofício de tripeiro no Rio de Janeiro, no início do século XIX. Miúdos de porco e vaca eram acrescentados ao angu.
A origem da feijoada (segundo o Portal São Francisco) situa-se na tradição portuguesa, na culinária das regiões da Estremadura, das Beiras e de Trás-os-Montes, além do Alto Douro, onde ao feijão são acrescentadas linguiças, orelhas e pé de porco.
Enfim, estranhei este equívoco no livro de Frei Betto, justamente porque é autor de livro de culinária ("Comer como um Frade").


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