Aliados atribuem a Dilma desarticulação da coligação
Ao tomar posse, em janeiro, Dilma Rousseff desfrutava no Congresso de um cenário que fazia inveja aos antecessores. Escorada numa coligação de 14 partidos, dispunha, pelas contas do Planalto, dos votos de cerca de 400 dos 513 deputados e de 50 dos 81 senadores.
Em tese, a nova presidente cercara-se de uma tropa de aliados capaz de aprovar –com folga— os projetos de lei e as emendas à Constituição que desejasse. A derrota do governo na votação do projeto do novo Código Florestal e o bate-cabeças que se seguiu ao ‘Paloccigate’ subverteram essa lógica matemática.
Passou-se a apregoar a tese segundo a qual falta coordenação política ao Planalto. Foi ao cadafalso o ministro petê Luiz Sérgio (Relações Institucionais). Nesta segunda (14), a ex-senadora petê Ideli Salvatti vai à poltrona do colega de partido. Boa de briga, ela recolhe os punhos. E promete acionar os ouvidos.
Ainda que se confirme, a metamorfose de Ideli não será suficiente para eliminar o fosso que se abriu entre o Planalto e seus apoiadores, dizem os aliados de Dilma. Por quê? O problema não está na sala que passa a ser ocupada por Ideli, mas no gabinete onde despacha a presidente da República.
Entre sexta-feira (10) e domingo (12), o repórter ouviu lideranças do PMDB, do PT e de partidos que frequentam a periferia do condomínio governista. De oito políticos consultados, sete disseram que Luiz Sérgio foi vítima. Atribuíram a Dilma a culpa pela desarticulação.
As críticas à presidente soaram mais fortes nos lábios dos entrevistados que falaram sob o compromisso do anonimato. Porém, mesmo quem opinou sem pedir ao repórter a ocultação do nome deixou antever que o êxito de Ideli depende de Dilma.
“O nome do articulador importa pouco”, disse, por exemplo, o deputado Henrique Eduardo Alves, líder do PMDB, segundo maior partido da coligação. “Pode ser Joaquim, Manuel ou Ideli. Se não tiver linha direta com a presidente, não funciona. Tem que saber se Ideli vai ter o telefone vermelho da Dilma. O Luiz Sérgio foi mais vítima do que culpado. Ele não tinha o telefone vermelho. E pagou o pato.”
Para Henrique, a coisa fluía melhor sob Lula. Ele citou Alexandre Padilha, o petê que chefiou a coordenação política antes de virar ministro da Saúde de Dilma. “Fui relator do projeto do pré-sal, do Minha Casa, Minha Vida. Muitas vezes liguei para o Padilha à meia-noite, uma hora da manhã. Negociávamos um artigo, uma cláusula. O Padilha ligava para o Lula e, meia hora depois, vinha com a solução. Articulação é isso: linha direta, poder.”
Espremendo-se o que disseram os líderes que conversaram com o repórter à sombra, verifica-se que a encrenca envolve mais do que a simples negociação de artigos de projetos. O nó da encrenca é a distribuição de verbas e cargos. Na fase em que Antonio Palocci lipoaspirou os poderes de Luiz Sérgio, ergueu-se na Casa Civil um dique.
As comportas do Planalto seguram mais de uma centena de cargos de segundo escalão e R$ 250 milhões em emendas orçamentárias de congressistas. Um auxiliar de Dilma disse ao repórter na noite deste domingo (12):
“A presidenta Dilma não se opõe às nomeações, mas não aceita qualquer nome. Havia o compromisso de liberar R$ 750 milhões em emendas. Desse total, R$ 500 milhões já foram empenhados. Tudo isso exige cuidado, análise criteriosa”.
O problema é que, onde o Planalto enxerga critério, seus aliados vêem descaso. Falam de Lula, mais concessivo que Dilma, com indisfarçável saudade. De resto, proliferam nos porões do condomínio governista queixas quanto à inapetência de Dilma para lidar com questões políticas.
Um grão-petê da ala de Cândido Vaccarezza disse que, sob a liderança dele, o governo colecionou êxitos na Câmara. “Na votação do Código Florestal, único tropeço, Dilma surtou. Saiu distribuindo broncas”.
Foi mais grave do que se noticiou o princípio de incêncio nascido da ameaça de demissão de ministros do PMDB. Irritada com o comportamento dos deputados da legenda, que votariam contra o governo no código, Dilma acionou Palocci.
Noite alta, o então chefe da Casa Civil disparou três telefonemas ao vice-presidente Michel Temer. Ameaçou demitir o ministro Wagner Rossi (Agricultura). Na primeira ligação, Temer levou na esportiva. Na segunda, tomou-se de brios. Aconselhou a demissão de todos os ministros do PMDB. Quanto a Rossi, seu apadrinhado, Dilma nem precisaria se dar ao trabalho. Ele entregaria a carta de exoneração.
Na terceira ligação, Palocci abafou a fumaça. Pediu desculpas. “Nós somos amigos”, disse a Temer. E o vice: “Não Palocci, nós nunca fomos amigos íntimos”. No início da madrugada, Dilma ameaçava convocar Temer ao Alvorada. Queria passar uma carraspana no vice.
“Imagine as dimensões da crise se naquela noite a presidente não tivesse sido contida”, rememorou uma testemunha dos destemperos. Desde então, Dilma manuseia panos quentes. Recebe políicos em almoços. Nesta semana, trançará garfos com os senadores do PR e do PP. Seus “apoiadores” olham para ela de esguelha. “Ninguém muda o jeito de ser depois dos 40 anos”, disse ao blog um ex-ministro de Lula.
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