domingo, 3 de abril de 2011

As grandes obras para as Olímpiadas e Copa no Rio de Janeiro


Luiz Mário Behnken é coordenador da Rede de Mega Eventos Esportivos e membro do Fórum Popular do Orçamento do Rio de Janeiro. Economista, é um dos expoentes do Fórum Brasil do Orçamento. Na entrevista abaixo, destaca a preocupação a partir do desastre que foram os Jogos Panamericanos para a cidade: “os Jogos Panamericanos não deixaram nada de bom para o Rio de Janeiro. A grande herança foi o agravamento da desigualdade social da cidade”.



Quanto o Brasil, através do BNDES, vai investir para a realização da Copa e das Olímpiadas?

Esse valor ninguém sabe com certeza, até mesmo porque há muitas indefinições. Em relação as Olimpíadas, fala-se em torno de R$ 30 bilhões. É explícito que o financiamento será todo público, que não haverá financiamento privado. Apesar de que na época da candidatura da Copa, em 2007, dizia-se que não teria dinheiro público nenhum, hoje já se diz o contrário. Inclusive os estádios, serão financiados com dinheiro público. O que não faz o menor sentido, sob a perspectiva do interesse da sociedade brasileira, mas a acumulação de capital – de poucos privilegiados - é o único interesse que importa. Em São Paulo, por exemplo, não tem a menor lógica construir um novo estádio, já que a cidade já abriga três estádios com capacidade para cinqüenta mil pessoas. Em momento algum na história deste País haverá a lotação dos três estádios ao mesmo tempo. Se não há essa necessidade, por que construir, então? Ainda mais com dinheiro público! A acumulação de capital é a única e inaceitável explicação.



Qual o legado que os Jogos Panamericanos deixaram para o Rio de Janeiro? A tendência é que os problemas ocorridos se repitam com a Copa e as Olímpiadas? Por quê?

O Pan não deixou nada de bom para o Rio de Janeiro. A grande herança foi o agravamento da desigualdade social. Dinheiro público foi colocado a serviço da acumulação de capital de empresas privadas e milionárias, ao invés de ser investido para melhorar a vida da parcela da população com pouca renda. Por exemplo, a prefeitura bancou sozinha a construção de um estádio que custou cerca de R$ 500 milhões. Os recursos utilizados foram os do contribuinte, mas hoje quem lucra é a iniciativa privada. Hoje, o Rio tem três estádios que nunca foram utilizados simultaneamente. Isso é fruto de uma combinação feita entre as elites locais, como as imobiliárias, empreiteiras e de comunicação, que se favorecem enormemente desses grandes eventos. Soma-se a isso os interesses políticos dos governantes locais e nacionais que se associam aos interesses do capital internacional, que sempre vêm junto com os mega eventos. Na verdade, a escolha da sede dos eventos é muito mais definida de acordo com os interesses de expansão das atividades econômicas do que por qualquer outro critério. Por isso, esses mega eventos estão saindo do “primeiro” mundo e vindo para países como África do Sul e o Brasil. Uma postura recorrente é deixar as definições para a última hora, desse modo, tenta-se justificar, pelo atraso e a necessidade de conclusão rápida da obra, o não cumprimento de realização de licitações, por exemplo. Um dos maiores problemas foi a falta de identificação de gastos. A urbanização em torno de um estádio era catalogada como gasto comum, feito na cidade. Isso dificulta muito saber quanto foi o gasto real. Além disso, houve remoção de comunidades para “limpeza social e visual” e a privatização de equipamentos públicos.



Quais são as reivindicações dos movimentos e organizações sociais em relação ao financiamento para estes dois eventos?

Uma carta de princípios está em discussão, mas alguns princípios são consenso, como a necessidade de transparência da informação. A identificação do gasto é muita básica e tem que ser feita. Não haver nenhuma remoção é outro consenso, afinal ninguém pode perder sua moradia porque a cidade vai sediar uma competição esportiva. Outra proposta ainda a ser consensuada é de que toda a obra que receber financiamento público, posteriormente, terá natureza pública, não podendo ser privatizada. Considerando que em 2011, o Rio receberá os Jogos Mundiais Militares, que reúne mais atletas que o Pan; em 2012, sediará a Rio + 20 (grande evento mundial sobre meio ambiente); em 2013, a Copa das Confederações; em 2014, a Copa do Mundo; e, em 2016, as Olimpíadas, não é difícil perceber que a cidade será totalmente transformada pela gigantesca aplicação de recursos e pelas intervenções urbanísticas, principalmente. Portanto, é fundamental fortalecer os movimentos sociais e as articulações parceiras para interferir de modo positivo. No momento, estamos ampliando o movimento de resistência formado para intervir diante do processo do PAN. Esta articulação, chamada Rede de Mega Eventos Esportivos (Reme Brasil), pretende envolver atores da sociedade que atuem em todas as cidades que sediarão a Copa do Mundo. Estamos preparando um seminário para o final do ano que terá caráter nacional e internacional, contando com a presença de representantes da África do Sul, Canadá, Londres e Grécia, de modo que possamos trocar muita experiência. Os brasileiros precisam ser melhor informados sobre as conseqüências de abrigar estes mega eventos. O Canadá, por exemplo, passou 30 anos endividado após sediar as Olimpíadas. Na África do Sul, na Copa deste ano, dez mil pessoas foram colocadas para morar em conteiners, na Cidade do Cabo. Havia até mesmo um muro para impedir que saíssem da área determinada. Esse processo já começou no Rio , de modo sutil, mas já começou. No trajeto para o aeroporto do Galeão, por exemplo, não se vê mais as comunidades. Construíram um muro “bonitinho”, com material meio acrílico. A desculpa é que o sono dos favelados não pode ser incomodado pelo barulho dos carros.

Um comentário:

Marcelo Delfino disse...

Em 2008, a população do Rio de Janeiro defenestrou Cesar Maia e sua turma, que torraram recursos públicos no Pan 2007. Torçamos para que o trio Dilma-Cabral-Paes não façam a mesma coisa para a Copa e a Olimpíada. Se fizerem, tem um remédio: detonaremos os três e seus aliados em 2014 e 2016. Ou, quem sabe, já a partir de 2012.