sábado, 23 de abril de 2011

Pai Lula, Mãe Dilma


Acabo de ler o instigante paper de Tersinha Cruz Pires (PUC-Minas), intitulado "A construção da imagem pública política de Dilma Rousseff (PT) como Mãe do Povo brasileiro".
O texto analisa a construção gradativa da imagem de Dilma, por Lula, como "mãe cuidadosa". O paper de Teresinha inicia com uma frase que Dilma proferiu ao jornal El País, numa entrevista que concedeu em junho de 2010. A então candidata afirmou: "No Brasil, 52% da população somos mulheres e os 48% restantes são nossos filhos". A frase demonstra consciência da imagem em construção.
Teresinha reconstrói a formatação da imagem por Lula. Inicia com a imagem de Mãe do PAC. Num discurso de 2008, ainda diz que ser candidata é outra conversa, "porque aí tem um ingrediente chamado política, que exige outras credenciais".
Contudo, em 2009 já sugere que a capacidade de coordenação e gerenciamento, além do conhecimento sobre o Brasil e economia, qualificavam a Mãe do PAC para governar o país.
Lula escolheu as palavras a partir de então. É o que demonstra o paper. Ainda em 2009, começa a trocar conscientemente a palavra governar por cuidar. Afirma que governar é muito pomposo.
O paper termina analisando o discurso e imagem subliminar do filme "Lula, o filho do Brasil" que tem nas mulheres os personagens mais fortes e decisivos (Dona Lindo/Glória Pires, Lurdes Maria/Cléo Pires e Marisa Letícia/Juliana Baroni). Dona Lindu expressaria, no filme, fé, determinação e persistência.
Coincidência?

Lendo o paper, comecei a divagar. Vou expor as elocubrações que foram surgindo:

1) O paper de Teresinha lembra em muito o estudo de Wilhelm Reich sobre o fascismo ("Psicologia de Massas do Fascismo"). No caso, ele inverte os pólos da análise sobre Dilma ao tentar relacionar a imagem e discurso do nazismo com o discurso paternal;
2) Também há relação com o livro de Sennett ("O Declínio do Homem Público"). Há uma passagem neste livro muito interessante, quando Sennett analisa a crise do governo Nixon (antes mesmo da sua queda) e a forte tentativa de criar uma relação entre a imagem do governante com a do homem comum, gerando empatia. O foco, no caso, é a família e o espaço do domicílio. A imagem forte destacada por Sennett é o pronunciamento de Nixon na TV carregando no colo um cachorrinho que sua família lhe presenteou, usado como âncora de seu discurso contra os que desejam derrubá-lo e se esquecem de "nós, que temos filhos";
3) Muitas pesquisas qualitativas realizadas no segundo semestre do ano passado sugeriam respostas que convergiam para "vou votar na mulher do Lula, a dona Vilma". Dilma, por muito tempo, não era identificada como candidata com luz própria. Era a "mulher do Lula". Havia nítida relação entre o fenômeno Lula (masculino) com um desconhecimento inicial sobre a figura de Dilma (construída como "acolhedora" ou "a que cuida", de natureza feminina). Ora, neste caso, o jogo simbólico é ainda mais complexo. Há uma certa tensão entre a figura de Lula e a de Dilma (pai superior e mãe ou filha de Lula). E esta tensão parece desabrochar nos primeiros 100 dias de Dilma. Não acham? Dilma não está se tornando uma mãe dura e justa? Não descola lentamente da figura do Pai-Lula?
4) Lembro, finalmente, que a região metropolitana de BH descarregou uma montanha de votos em duas mulheres: Marina e Dilma. Sempre defendi que MG é o Estado com traços mais femininos de todo o país. A política mineira é feminina. Nenhum outro Estado tem tantas mulheres de relevância, como Xica da Silva e Dona Beija. Mas há muitas outras. Quando cheguei em Minas, em 93, fiz uma pesquisa no interior do Estado e fiquei espantado com a força da mulher rural na tomada de decisões para investimentos na propriedade agrícola. Nunca havia presenciado algo do gênero em outras pesquisas.

Um comentário:

FABIANA CORSI disse...

ESSE CONSTRUIR E DESCONSTRUIR NO JOGO DA POLITICA ´R MUITO INSTIGANTE. MAIS INSTIGANTE AINDA COMO ISSO É FEITO DE FORMA PENSADA E ESTUDADA.GOSTEI MUITO DA SUA ANÁLISE.