domingo, 24 de julho de 2011

A política dos oriundos da ação da igreja católica

Estive ontem e hoje assessorando um encontro dos membros da Congregação Filhas de Jesus. O tema central era políticas públicas e a participação social na política. Falarei mais sobre este encontro em outro post. Mas você que acompanha este blog deve ter percebido que recentemente assessorei outro encontro sobre Fé e Política. Há uma retomada desta relação entre religiosidade católica e atuação política. Reação ou afirmação. Um embate surdo entre forças e concepções teológicas no interior da igreja católica brasileira. Pode ser.

Mas o que me fez escrever estas linhas é a lembrança de um seminário organizado pelo Instituto Pólis, em São Paulo. Eu havia feito algumas investigações sobre gestões petistas, assim como outros pesquisadores sociais, num programa de pesquisas do instituto. O seminário procurou socializar os estudos que realizamos. Lembro que uma das conclusões foi que prefeitos petistas oriundos do movimento sindical ou organizações de esquerda tinham capacidade técnica, mas eram centralizadores e autoritários. No caso de prefeitos oriundos de movimentos sociais de base ou vinculados às organizações pastorais da igreja católica eram exatamente o inverso.

Nas minhas andanças percebo que estas características permanecem. Prefeitos oriundos da ação e organização da igreja católica sentem-se acuados num mundo político agressivo e instrumental. Sem saber como reagir, acabam virando comida para tubarão. Não compreendem o jogo bruto e temem agredir e se isolar ainda mais. Acabam desmoralizados e com a pecha de inseguros.

Para eles, vale algumas lições clássicas da política. Citarei três: uma de Maquiavel e duas de filósofos chineses. Podem parecer contraditórias, mas não são. Maquiavel, embora no texto abaixo pareça propor um espírito violento o tempo todo, afirmava que o bom Príncipe nunca precisava utilizar a força, apenas ameaçando utilizá-la. Mas, como veremos, entre duas opções, não titubeava em escolher uma delas.

Vamos às citações.

N'O Príncipe, Maquiavel cita diversas vezes César Bórgia (Príncipe italiano, 1475-1501). No capítulo intitulado "DA CRUELDADE E DA PIEDADE; SE É MELHOR SER AMADO QUE TEMIDO, OU ANTES TEMIDO QUE AMADO" escreve:
(...) Um príncipe não deve, pois, temer a má fama de cruel, desde que por ela mantenha seus súditos unidos e leais, pois que, com mui poucos exemplos, ele será mais piedoso do que aqueles que, por excessiva piedade, deixam acontecer as desordens das quais resultam assassínios ou rapinagens: porque estes costumam prejudicar a comunidade inteira, enquanto aquelas execuções que emanam do príncipe atingem apenas um indivíduo. (...)

Nasce daí uma questão: se é melhor ser amado que temido ou o contrário. A resposta é de que seria necessário ser uma coisa e outra; mas, como é difícil reuni-las, em tendo que faltar uma das duas é muito mais seguro ser temido do que amado. Isso porque dos homens pode-se dizer, geralmente, que são ingratos, volúveis, simuladores, tementes do perigo, ambiciosos de ganho; e, enquanto lhes fizeres bem, são todos teus, oferecem-te o próprio sangue, os bens, a vida, os filhos, desde que, como se disse acima, a necessidade esteja longe de ti; quando esta se avizinha, porém, revoltam-se. E o príncipe que confiou inteiramente em suas palavras, encontrando-se destituído de outros meios de defesa, está perdido: as amizades que se adquirem por dinheiro, e não pela grandeza e nobreza de alma, são compradas mas com elas não se pode contar e, no momento oportuno, não se torna possível utilizá-las. E os homens têm menos escrúpulo em ofender a alguém que se faça amar do que a quem se faça temer, posto que a amizade é mantida por um vínculo de obrigação que, por serem os homens maus, é quebrado em cada oportunidade que a eles convenha; mas o temor é mantido pelo receio de castigo que jamais se abandona.

 

Já Sunzi (ou Sun Tzu, IV a.C.), em A arte da Guerra afirma que o objetivo de toda estratégia militar seria conseguir vencer sem lutar. Sustenta:
“Em cem batalhas, cem vitórias não são a excelência das excelências; não batalhar e subjugar as tropas do outro é a excelência das excelências”

Laozi (ou Lao Tzu, taoísta, século VII a.C.) vai na mesma direção:
“suavidade vence violência” e “o flexível e o fraco vencem o duro e o forte”

Enfim, astúcia, antes da força. Mas astúcia para impor respeito. E, ainda: a Corte nunca deve susbstituir a base social, o povo que sustenta e legitima um poder político.
 

Um comentário:

José Américo de Carvalho Alcântara disse...

Em complemento à conclusão do artigo, vale lembrar que Maquiavel, na mesma obra, assevera que, em citação livre, ao fazer o cerco a uma cidade (Estado), o príncipe deveria deixar, sempre, uma saída, para que o subjugado, possa fugir sem oferecer resistência. É o que se denomina hoje, de saída honrosa.
Parabéns pela análise.
Abraços,
Zé Américo