1) No primeiro semestre muito se falou a respeito da formação do PSD, e agora, um grupo de empresários trabalham para a formação do Partido Novo. Além destes, cerca de 9 partidos estão na fila em fase de organização. O que explica a formação de novos partidos no atual contexto político do país.
R: Uma total desorganização do sistema partidário brasileiro. Este sistema sempre foi frágil, ou seja, teve pouca inserção no cotidiano dos brasileiros, baixa representatividade, alta rotatividade de seu quadros. Mas desde o governo Lula, o sistema ficou ainda mais fragilizado porque se tornou pró ou anti-lulista. Não há escapatória. Ainda mais porque centrais sindicais e várias organizações de representação de interesses se alinharam partidariamente (ou melhor, se tornaram governistas, em busca de financiamento com a terceirização de serviços sociais no Brasil). Muitos segmentos sociais não se sentem representados nos partidos atuais. O que me pergunto é se criando novos partidos haverá alguma representação política real deste país fragmentado em que numa mesma semana 2 milhões de pessoas se juntam na Avenida Paulista para propor agendas absolutamente opostas e até se confrontando.
2) Alguns cientistas políticos defendem o pensamento de que após o período de redemocratização do Brasil as instituições e os partidos políticos ficariam mais sólidos, o que culminaria em uma maior polarização partidária (aglutinação dos mesmos em dois pólos principais) a exemplo dos Estados Unidos e Inglaterra. Qual a visão do senhor respeito dessa tese?
R: Tivemos um esboço de polarização do PT com PSDB, dois partidos social-democratas ou social-liberais. Mas o lulismo destruiu tal polarização. Temos, hoje, mais governismo que partido dominante ou polarização. É um retrocesso política, na verdade. As lideranças partidárias são maiores que seus partidos, o que faz da prática política algo próximo dos partidos de notáveis do século XVIII. Veja que as lideranças de todos partidos fazem acordos com aparentes adversários e mudam de lugar ao sabor dos dividendos políticos. Veja o caso de Minas Gerais que iniciou o ano com uma bancada oposicionista ao governo federal no Senado e agora possui dois senadores governistas e apenas um oposicionista. O eleitor votou nesta configuração? Como pode dois senadores serem eleitos por chapas oposicionistas e, assim que deixam a suplência para assumir a titularidade bandeiam para o outro lado, às vésperas das eleições municipais? O eleitor foi consultado?
3) O Partido Novo busca fundamentação na construção de gestões públicas eficientes. "Um partido político sem políticos", como diz o slogan. Já o PSD se fundamenta em políticos que já possuem carreira política, e que estariam insatisfeitos com os rumos de seus respectivos partidos políticos. O senhor acredita que a população percebe os reais motivos que levam à criação de partidos políticos e toda essa movimentação?
R: Em primeiro lugar, uma gestão pública eficiente não tem relação alguma com a gestão privada. Porque exige capacidade política. Os dois atributos básicos da gestão pública e governança e governabilidade. Sem a capacidade de fazer acordos, nenhum governo se sustenta por muito tempo. No caso do PSD, ele nasce justamente sob a égide do que há de mais conservador no país, travestido de governismo. Enfim, os dois novos partidos são exemplo certo de como o discurso, em político, não se relaciona com a prática e a realidade. Em política, é verdade, a versão é mais importante que o fato.
4) Os partidos que têm surgido, especificamente o PSD, acabaram abocanhando parte da oposição. Isso seria um indicativo de que partidos como o PSDB e o DEM passam por uma espécie de crise de identidade a nível nacional?
R: É evidente que sim. Perderam as eleições presidenciais por mais de uma vez. O DEM está desidratado e o PSDB está em disputa interna. Não parece estranho que o maior personagem tucano atual seja o ex-Presidente Fernando Henrique? Justamente um tucano que não disputará eleição alguma? E que paira sobre seu partido? O que faz um conjunto de lideranças tucanas não conseguir unir seu partido e liderar efetivamente um projeto para o país? O lulismo simplesmente diminuiu os espaços de movimentação das oposições em nosso país. A coalizão presidencialista, o financiamento do alto empresariado via recursos do BNDES, o bolsa-família e aumento real do salário mínimo criam um conjunto de ações políticas que sufocaram as oposições. Se somarmos a estes fatores a concentração orçamentária nas mãos da União (60% do orçamento público nacional), temos uma atração quase irresistível ao governismo. Principalmente às vésperas das eleições municipais que impelem deputados federais a defender as bases municipais e garantirem a eleição de prefeitos aliados. Como garantir esta base sem obras garantidas com convênios com ministérios e órgãos federais?
5) O senhor acredita que a ex-candidata à presidência Marina Silva irá trabalhar para a formação de um novo partido?
R: Sim. Mas ela diminuiu consideravelmente seu capital eleitoral conquistado nas eleições do ano passado. Começa a aparecer como política permanentemente marginal, outsider, que não consegue se estabelecer em lugar algum. O problema é que não está nas ruas, não esteve presente nas manifestações populares de rua dos últimos dias, nem na Parada Gay, nem nas lutas por direitos civis, nem na Marcha com Jesus. Enfim, está presa no sistema partidário que caduca. Saiu da campanha como novidade e se enredou no velho.
6) O Partido Novo possui como cerne principal o discurso de que é preciso construir governos técnicos, com secretariados que venham do setor empresarial e acadêmico. Este mesmo discurso t foi difundido antes por partidos como o PSDB e ganha força a cada eleição. Porque este discurso tem aparecido tanto?
R: Por falta de estratégia política dessas lideranças. Querem criar um clima de inovação sem criar qualquer empatia com a maioria do eleitorado. A maioria do eleitorado é classe C. E esta classe deseja sucesso e garantia de consumo e estabilidade social. O discurso de governos técnicos e de natureza empresarial é voltado para a classe B e A. Enfim, mais do mesmo.
7) Se colocar como bom gestor (ou administrador) é um componente crucial para se vencer uma eleição majoritária?
R: De maneira alguma. O político mais popular do país é Lula. E o foco da construção da imagem de Lula foi a sensibilidade política e a empatia com a nova classe emergente, a classe C.
8) Analisando o atual cenário nacional, o senhor acredita que os partidos políticos perderam suas ideologias? Eles não teriam se tornado arcabouços fisiológicos que se adequam à movimentação de políticos?
R: Sim. Os partidos são muito parecidos. E este é o problema do cidadão. Os partidos são empresas eleitorais e funcionam com empresas, com administradores que efetivamente executam as tarefas cotidianas de sua empresa. Os líderes em que votamos são a ponta do iceberg destas empresas. Volto a ressaltar: os partidos não estavam, nenhum deles, nas manifestações populares que atraíram milhões de brasileiros nas últimas semanas. Os brasileiros que lutam por direitos e estão nas ruas não se sentem representados nos partidos. E adotam estruturas em rede, similares às estruturas das redes sociais da internet. Inclusive, se convocam e se articulam pelo facebook, pelo twitter e por torpedos. Nada mais distante. Dois mundos que não se comunicam.
2 comentários:
Rudá,
Adorei a entrevista. O partido Novo pode parecer para alguns uma INOVAÇÃO, mas com certeza é como vc disse "MAIS DO MESMO". Essa de princípios de administração privada, aplicados na adminsitração pública, como eles anunciam, é mais velha que a história da carochinha...
Rudá , excelentes colocações. Os partidos estão todos desfigurados e não representam setores da população. São meios para fins de caráter individualista sem nenhuma relação com as aspirações populares . Aliás, esse negócio de voto obrigatório tem é que acabar. Desde 2006 que justifico o meu voto.
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