domingo, 6 de dezembro de 2009

Explicando minhas críticas à Frei Betto

Recebi alguns emails pedindo para aprofundar os motivos que me levaram a criticar Frei Betto (ver nota abaixo). Vamos lá:

1) Minha motivação é abrir um franco debate entre as esquerdas de nosso país. Durante a abertura política, evitamos abrir publicamente nossas diferenças, que remontam às estruturas clandestinas e concepções vanguardistas dos anos 70, temendo que pudesse gerar alguma perseguição. Contudo, estamos nos mantendo por muito tempo no silêncio. E este silêncio está se revelando nefasto para a democracia do país e principalmente para as organizações sociais de base que estão mergulhadas num profundo rebaixamento político e intelectual;

2) A aproximação passada de Frei Betto com a ALN tinha marcas teóricas e ideológicas. A ALN foi uma divisão do PCB altamente centralizador e burocratizado. Marighella tinha um espírito mais libertário que o antigo PCB e dava uma imensa liberdade para as células e frentes de ação. Mas nem todos da ALN seguiam este espírito libertário. Caso que envolve José Dirceu, altamente desconfiado e profundamente centralizador, além de reproduzir a velha e carcomida teoria etapista, na qual repousa o futuro que apenas quem opera a evolução das etapas sabe qual será. O etapismo desconsidera os desejos individuais e o diálogo entre diferentes porque define, escatologicamente, o que deveremos ser;

3) Nos anos 80, Frei Betto criou um conceito rebaixado e estranho de "movimento popular", que agregaria gregos e troianos. Não, se fossem só gregos e troianos não haveria problema. Ele agregou, num mesmo saco, movimentos sociais, entidades populares, partidos e sindicatos. Dizia que eram "ferramentas" da luta dos povos oprimidos. Como poesia, este conceito é até sedutor. Mas politicamente é um profundo equívoco. E perigoso. Explico: este conceito é o que criou o caldo de cultura para a partidarização de sindicatos e movimentos sociais brasileiros, ao longo dos anos 80 e nos 90. Porque se todos são instrumentos, e se na teoria marxista o partido é a expressão maior da organização dos que desejam a transformação (o restante estaria no plano da luta econômica, do interesse), obviamente que a noção de autonomia, fundamento da origem do PT, teria que desaparecer;

4) Grande parte das lideranças sociais e sindicais do país tem origem nas organizações da igreja católica filiadas à Teologia da Libertação, que bebeu nas teorias e ensaios de Frei Betto. Hoje, o fruto colhido é a profunda partidarização e imenso desprezo pelo debate franco na base social. Os "de baixo" não teriam condições de compreender as manobras dos "de cima". Os discursos são rebaixados. Recentemente, participei de uma mesa de debates com um dirigente da CUT que me deixou estarrecido. Ao apresentar esta crítica de como as centrais sindicais brasileiras são, todas, expressões de partidos, o dirigente da CUT afirmou que foi por conta dos outros partidos, porque a CUT sempre desejou tê-los unidos na central. Não é verdade. Basta analisarmos o que ocorreu no 4o congresso da CUT. Mas muitos sindicalistas sentados na platéia da escola sindical desconhecem os meandros das disputas de cúpula. O dirigenta da CUT me travou, porque me colocou a responsabilidade de desvendar e desmistificar a história da CUT. Eu fiquei preso no dilema de ser a Cassandra de lideranças sindicais honestas que me ouviam. Preferi calar. Mas no meu blog me sinto mais livre porque quem o acessa está lendo porque deseja;

5) Enfim, Frei Betto tem direito de defender o regime castrista. Um regime centralizador, autoritário, que não respeita a pluralidade, que até então não respeitava a sexualidade de quem não era a imagem e semelhança da virilidade guerrilheira. Um regime militarizado, assim como o chavista. Mas deve confessar a todos este desejo de país. Sem apelar para argumentos aparentemente ingênuos de que em Cuba não há fome e todos estudam. Primeiro, isto não é verdade. Basta andar poucos quarteirões pelas ruas das cidades cubanas para ser atropelado por olhos esbugalhados que desejam algum gênero de primeira necessidade do estrangeiro. Segundo, o ser humano não vive apenas de comida. Vive de diversão e arte. E muito mais. Rebaixar a vida humana à condição de animal quase irracional não é projeto de esquerda. E nunca foi. Talvez, num momento de transição. Mas já se passaram décadas e tudo continua no mesmo lugar;

6) Assim, as diferenças entre projetos de esquerda em nosso país devem ser escancaradas. Devemos parar com esta pasteurização que desconsidera a inteligência da base social e de tantos militantes sinceros das lutas pelos direitos sociais. Esta infantilização do discurso, que encobre erros históricos que se acumulam e que desaguam na perplexidade frente à escândalos e posturas sem nexo histórico, deveria acabar de imediato.

Um comentário:

Unknown disse...

FANTASTICO RUDA!!!
un cubano agradecido que escribe comentarios en el blog de yoani, con nick pues tiene miedo todavia de no usar su propio nombre y apellidos por temor a que el regimen no le permita entrar a la isla, que emigro hace doce años de cuba, que nacio en el año 1977, por tanto, supuesto hijo de la "revolucion", en el blog de yoani utilizamos el termino, "robolucion", que se considera de izquierdas y que no es castrista. la izquierda mundial deberia reformarse profundamente a partir de la exclusion del legado dictatorial de fidel castro.
AGRADECIDO, Y UN SALUDO,