1 - Como você vê o projeto de fundar um partido com o nome da
Arena?
R: Seus líderes são bastante jovens e não viveram o período do
regime militar. Sua idealizadora (na foto que ilustra esta nota), a estudante de direito Cibele Baginski,
possui 23 anos. Refutam o fascismo e se dizem “direita democrática”. O mais
interessante é que querem resgatar valores como o nacionalismo e o direito à
propriedade. Enfim, um programa não muito definido. O fato é que existe
efetivamente traços de cultura política conservadora em nosso país. Basta
lembrarmos da reação fundamentalista no final do primeiro turno das eleições
presidenciais passadas. Nos Estados do sul, bispos católicos chegaram a pregar
uma “Santa Aliança” com bispos evangélicos, contra a agenda de ampliação de
direitos civis, como casamento entre homossexuais e legalização do aborto,
entre outros. As pesquisas de opinião, realizadas pelo IBOPE e Datafolha
corroboram um pensamento conservador em termos de comportamento. Todo este
caldo de cultura não se expressa, até o momento, na estrutura partidária e está
sendo capitaneado, eventualmente, por setores das igrejas cristãs.
2 - A nova Arena é formada por jovens que
assumidamente são muito identificados com a direita e o regime militar. O que
explicaria essa identificação, do ponto de vista político e sociológico? Geralmente
os jovens são muito mais ligados a partidos de esquerda.
R: Há certo mito sobre a politização da
juventude no Brasil. Afirma-se, muitas vezes, que a juventude era muito
engajada nos anos 1960. Se havia grande engajamento, também havia uma parcela
significativa de jovens que se envolviam com hábitos prosaicos, com o estilo
playboy que se expressava pelo modo de comportamento da Jovem Guarda. Os dados
recentes revelam que grande parte da juventude brasileira, que conforma a
Geração Y, é refratária às regras e hierarquia, é imediatista e procura se
comunicar via redes sociais. Não é, portanto, o perfil dos jovens que fundam a
ARENA. Enfim, não temos que mitificar esta ala mais conservadora da juventude.
Ao contrário, a grande maioria da juventude brasileira não se identifica com
partido político. As redes, cuja relação é mais afetiva e efêmera, levam mais
sua cara e identidade.
3 - Muitos desses jovens não viveram a época da ditadura. Isso
pode influenciar na posição ideológica deles?
R: Na busca por uma identidade própria e, talvez, em função da rejeição à
lógica política dominante (o que inclui os casos recentes de corrupção), estes
jovens podem estar procurando sugerir uma estrutura social mais normatizada,
mais regrada moralmente. São, obviamente, intolerantes à diferença, mas não me
parecem ideologicamente preparados ou mesmo conscientes do que significou a
ARENA no regime autoritário, ditatorial. Muitos dos valores que pregam foi
justamente conspurcado pela ARENA. Enfim, acho que estes jovens propõem mais
uma intenção romântica e um porto seguro que ideologia.
4 - De certa forma, a ideia de criar um partido de direita
preenche um vazio ideológico, já que praticamente não há partidos assumidamente
de direita hoje em dia e os que existem estão enfraquecidos?
R: Só preencheria se conseguisse se articular com o conservadorismo
difuso que envolve grande parte dos brasileiros. Em outras palavras, somente se
tornando partido de massas, enraizado no cotidiano de grande parte dos
brasileiros e se tornando expressão da visão de mundo conservadora é que
preencheria este vazio. Contudo, não me parece que esta seja a intenção e
estratégia (se há, de fato alguma) dos criadores desta ARENA. Acredito que alas
ultraconservadoras das igrejas cristãs brasileiras são mais potentes nesta
tarefa.
5 - Quais podem ser as consequências de um partido como a Arena no
cenário político atual, levando-se em consideração que eles optam por uma linha
muito conservadora e alinhada aos ideais do regime militar?
R: O sistema partidário brasileiro não tem ideologia alguma. Aliás,
estudos recentes demonstram que coligações partidárias heterogêneas conseguem
muito maior sucesso eleitoral que as coligações mais homogêneas do ponto de
vista ideológico. Um conjunto de estudos sobre este fenômeno se encontra no
livro organizado por Silvana Krause, editado pela UNESP e que leva o título “Coligações
Partidárias na Nova Democracia Brasileira”. Parece ocorrer uma tendência à
desideologização partidária em função do processo eleitoral brasileiro. Não
vejo, portanto, um caminho seguro para a ARENA a partir do atual sistema
partidário. O PT rompeu, por um momento, esta lógica, mas voltou ao caminho
natural com o advento do lulismo.
6 - Independente de qualquer ideologia, temos um fato novo na
política?
Não. A política brasileira voltou ao seu
veio tradicional, clientelista. Houve uma nítida atualização das figuras de
tipo coronelísticos, caciques partidários e comando da política por políticos
profissionais. Em todos partidos, são os deputados que comandam os diretórios.
As lideranças sociais não encontram espaço, nem mesmo os filiados, nestas
estruturas de tipo empresarial, altamente centralizadas e controladas. Só isto
explica como são escolhidos e eleitos “postes”, figuras jejunas da vida
política que, não raro, disputam sua primeira eleição.
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