1924
Nascido Milton Fernandes, no Meyer, em 16 de agosto.
Ou em 27 de maio? Ou em 27 de maio do ano anterior? Há desencontros de opinião
na família. Na carteira de identidade: 27-05-1924. Meu amigo, Frederico
Chateaubriand, sempre repetia, quando se falava que alguém estava "muito
moço", isto é, aparentava menos que a idade que tinha: "Idade é a da
carteira". Isto é, não adianta ter qualquer esperança contra a cronologia.
No meu caso talvez a carteira esteja (um pouquinho) a meu favor.
1925
Morto meu pai. Nessa idade a orfandade passa
impressentida. Mas a família - mãe com quatro filhos - cai de nível imediatamente
1931
Entrada para a Escola Enes de Sousa,
no mesmo Meyer, educandário dirigido por Isabel Mendes, mestra extraordinária
que mais tarde receberia a homenagem de ter o colégio batizado com o seu nome.
Enes de Sousa, só fui saber quem era muitos anos mais tarde, nas memórias de
Pedro Navas. Um abolicionista, se é que isso existe
1931
Entrada para a Escola Enes de Sousa,
no mesmo Meyer, educandário dirigido por Isabel Mendes, mestra extraordinária
que mais tarde receberia a homenagem de ter o colégio batizado com o seu nome.
Enes de Sousa, só fui saber quem era muitos anos mais tarde, nas memórias de
Pedro Navas. Um abolicionista, se é que isso existe
1934
Morta minha mãe. Sozinho no mundo tive a sensação da
injustiça da vida e concluí que Deus em absoluto não existia. Mas o sentimento
foi de paz, que durou para sempre, com relação à religião: a paz da descrença
O período dickensiano, vendo o bife ser posto no prato
dos primos, sem que o órfão tivesse direito. A família dispersa, os quatro
irmãos cada qual pro seu lado, tentando sobreviver
1938
15 de março: início da profissão de jornalista
Liceu de Artes e
Ofícios, onde um dia um professor deteve a massa dos alunos que
desciam as enormes escadarias e, no meio de todo mundo, advertiu-me para que eu
nunca mais zombasse de um colega. "As pessoas podem perdoar que você bata
a sua carteira mas jamais perdoarão isso." Aprendi
1941
Descubro, aos 17 anos, que não me chamo Milton,
mas Millôr.
Acho bom, não mudo, e o nome logo 'pega'
1943
Começam os anos gloriosos da revista 'O Cruzeiro', que
um grupo de meninos levaria dos estagnados 11.000 exemplares tradicionais a
750.000
1944
Com tio Viola,
chefe da gráfica 'O Cruzeiro', responsável por minha entrada no jornalismo.
Viola, nome da família pelo lado italiano, teve recentemente uma possibilidade
de glória. Eu vi o Papa João Paulo I dizer na televisão: "Todos os Violas
do Brasil são meus primos." Mas morreu logo depois
1946
A vida era bela e não sabíamos. Ou sabíamos?
Aqui, Péricles Maranhão,
autor da figura mais popular no humor brasileiro de todos os tempos: 'O Amigo
da Onça'. Canhestramente faço o 'amigo' da foto
1948
Na foto com Walt Disney,
no estúdio dele, em
Hollywood. Foto cuidadosamente posada. Nessa época eu ainda
acreditava que Disney sabia desenhar. Só mais tarde, lendo sua biografia,
aprendi que até aquela assinatura bacana com que ele autentica os desenhos é
criação da equipe
1949
Comecei a programar viagens fora do país. Primeiro em
países da América do Sul, depois Estados Unidos. Deixei a Europa pro fim. Ainda
era um acontecimento, viajar
1950
O sucesso de 'O Cruzeiro' faz os jornalistas virarem
notícia. Na redação, entrevista para o rádio, uma espécie de televisão da
época, muito melhor, porque sem imagem
1951
Viajo bastante pelo Brasil, coisa que sempre gostei de
fazer, mas de carro, única forma de sentir as tremendas distâncias
1952
Faço questão que o ministro brasileiro me batize nas
águas do Rio Jordão, em
Israel. Cada um tem o São João Batista que merece
1953
Vice-campeão mundial de pesca ao atum na Nova Escócia.
Nunca tinha pescado em minha vida e nunca peguei um peixe. Uma longa história
que não cabe aqui
1954
Compramos por Cr$ 2.700 um apartamento no Rio, num
lugar mais ou menos distante, chamado Vieira Souto. Quando a granfinada soube,
correu atrás de mim e o lugar virou 'status', o metro quadrado mais caro do
mundo. Hoje a portaria da minha casa é o centro de prostituição - na sua quase
totalidade exercida por travestis - da cidade. E de qualquer maneira a janela
do meu apartamento, no quarto andar, é o local ideal para um sociólogo amador
1955
Cobertura jornalística de campanha eleitoral. Aí
conheci um jovem e engraçado político chamado Jânio e um homem esquisitamente
ético chamado Milton Campos. Glória das glórias: ganho o primeiro lugar num
concurso de desenhos em
Buenos Aires , junto com Steinberg
1956
Festival de Cannes, casamento de Grace Kelly. Este
acontecimento até hoje rende mentiras por parte de muitos jornalistas. Guardo
as minhas para momentos insípidos de conversação
1957
Primeira exposição de desenhos no Museu de Arte
Moderna, naquela época uma sala em baixo do Ministério da Educação. Melhor
cenógrafo do ano. Por quê?
1958
Um ano ou dois antes, não estou certo, nosso grupo
implantava o frescobol em Ipanema. Me lembro que
antes apareceu uma besteira chamada 'la pelote basque sans fronton'. Eu me
auto-proclamei campeão do frescobol do posto 9. Mantive o título por muito
tempo: quando alguém jogava melhor do que eu, eu dizia que ele era do posto 8
1960
Minha peça 'Um elefante no caos' estréia depois de uma
briga enorme com a censura, transformada num excelente espetáculo pela genial
direção de João Bittencourt. Uma das poucas vezes que um diretor melhorou um
trabalho meu
1961
Exposição de desenhos na Petite Galerie. Viagem ao
Egito. Voltamos correndo com a renúncia de Jânio
1963
Uma "questão
religiosa" me coloca em conflito com a tradicional
'ética' dos 'Diários Associados'. Num discurso público, declaro: me sinto como
um navio abandonando os ratos
1964
Preparando o lançamento de 'O PIF-PAF', quinzenal que,
em 1979, o serviço de informações do exército consideraria oficialmente como o
início da imprensa alternativa no Brasil. Ainda bem, porque fecharam o jornal
no oitavo número e eu fiquei devendo 21.000 cruzeiros. Meu valor na praça,
então, era mais ou menos 500 cruzeiros mensais
1965
"Liberdade, Liberdade", com Flávio Rangel.
Um barato no meio do caos. Depois a censura proíbe. Como proíbe também, na
íntegra, "Este mundo é meu", com Sérgio Ricardo
1966
Cada vez me meto mais, profissionalmente, no teatro.
Traduções, adaptações, originais. Representamos, no Largo do Boticário, a
versão musical de "Memórias de um Sargento de Milícias", só com
atores negros
1967
Topo fazer o ator ao lado de Elizeth Cardoso e o Zimbo
Trio. Uma experiência inesquecível, que outras ocupações não me deixaram repetir
1968
O período efervescente do Pasquim. Parecia até que o
país existia e que certa socialização, confundida com uma fugida fraternidade,
era possível
1970
Sempre viajando pelo Brasil
1971
A 'parada' com o sistema engrossa. Quase não
publicamos nada inteligível e o teatro fica praticamente impossível
1972
Volto a me interessar por livros. Lanço ao mesmo tempo
"A Verdadeira História do Paraíso" e "Trinta anos de mim
mesmo", um resumo de anos de trabalho, numa noite de autógrafos denominada
"Noite da Contra-incultura"
1973
Promovido a cidadão mineiro, afinal, pela Câmara de
Conceição-de-Mato-Dentro
1975
Exposição na Graffiti. Fim da censura no 'Pasquim'
1976
Escrevo "É..."
1977
Na foto eu tenho a rara oportunidade de dar alguns
esclarecimentos políticos a Mário Lago
1978
Um trabalho muito mais difícil do que podia parecer: a
adaptação de "Deus lhe Pague"
1979
Aos poucos, venho descobrindo mais o Rio Grande do
Sul, onde só tinha estado há muito tempo. Vou me agauchando
1986
Compro o primeiro
computador, um XT a vapor, mesmo assim considerado por muitos
uma extraordinária peça de ficção científica
1988
Comemoração de 50 anos de
jornalismo. 25 de março, na casa de Técio Lins e Silva e Regina Pimentel.
1996
Com Monique Duvernoy, Fernando Pedreira e Cora
Ronai, em Auvers-sur-oise
1997
Com Cora Ronai e
Ocimar Versolato, jantando na casa de Monique Duvernoy e
Fernando Pedreira
2000
Lançamento do saite "Millôr Online",
com festa no Copacabana Palace, Rio
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