Desde 1994, quando
Fernando Henrique ganhou a eleição para presidente, PT e PSDB vêm sendo
hegemônicos nas disputas pelo Palácio do Planalto. Por quais motivos esses dois
partidos polarizaram as cinco últimas disputas presidenciais? A manutenção
desse quadro trouxe benefícios para a forma de fazer política no Brasil? Em que
ela atrapalha?
R: Porque os dois partidos confluíram para o mesmo ponto
programático e ideológico. Primeiro foi o PSDB, que se deslocou do discurso
socialdemocrata europeu para o liberalismo, ao se aliar com o PFL e criar uma
aliança eleitoral que governou com FHC. Depois, veio o PT, com o advento do
lulismo, que jogou o PT, do discurso socialista (difuso) para o
social-liberalismo. O ponto comum é o respeito pleno do mercado. A diferença
fica por conta da ênfase em relação às políticas sociais. Mas mesmo nas gestões
PT, é evidente que as obras de infraestrutura são muito mais importantes (veja
os governos municipais petistas desta atual geração) que qualquer instrumento
de transparência ou participação (controle social ou democracia deliberativa)
nos seus governos. Tenho a impressão que as oligarquias regionais e a lótica
avassaladora do mercado internacionalizado dominaram a cena política. O mundo
político brasileiro capitulou à economia. Quem perde é o representado, que hoje
tem o mesmo poder de influência na política formal que na República Velha. PT e
PSDB conseguiram fazer a ponte entre esta lógica e, no caso do PT, atendimento
às demandas sociais mais agudas.
Em 1989 PT e PSDB estiveram do mesmo lado no segundo turno
de uma eleição para presidente. Naquela ocasião, o psdbista Mário Covas apoiou
Lula na disputa com Fernando Collor. De lá para cá os dois partidos estiveram
sempre de lados opostos nas eleições presidenciais. O que houve de diferente
naquela eleição em relação às seguintes? O que foi mais determinante para que a
aliança não se repetisse para o mesmo cargo: as transformações nos programas de
governo, o fato de ambos conseguirem lançar candidatos competitivos ou os dois
partidos terem chegado à presidência em um período próximo?
R: Em Minas Gerais, Fernando Pimentel forjou uma importante
aproximação com Aécio Neves. Aliás, durante os oito anos de governo Aécio, Lula
o apoiou com muita decisão. Chegou, num encontro no Minas Centro, a dizer que
trataria Aécio como se fosse um governador petista. Lula procurava dividir o
PSDB, quebrando o núcleo paulista. Conseguiu, em parte. Os frutos mais nítidos
foram os comitês Lulécio (Lula + Aécio) e Dilmasia (Dilma + Anastasia).
Portanto, a disputa, eu arriscaria a dizer, é paulista, núcleo duro dos dois
partidos. No resto do país, não vejo uma rejeição tão nítida. Obviamente que o
núcleo paulista alimenta o ódio dos filiados. Mas, se os militantes pararem
para pensar, perceberão que apenas as privatizações os divide efetivamente.
Aliás, em dias de Dilma Rousseff, nem isto.
Em um recente artigo escrito pelo cientista político Marcos
Nobre, publicado pela revista Piauí e comentado no seu blog, Nobre disse que os
tucanos não fizeram oposição efetiva ao governo petista. O PSDB é um partido de
oposição menos combativo do que foi o PT no governo FHC? O Lulécio em 2006 e o
Dilmasia em 2010 são sinais disso?
R: Exato. PT e PSDB vivem em função do outro. Veja que o
surgimento de Eduardo Campos desorienta os caciques petistas e tucanos. A
polarização PT/PSDB só interessa aos dois partidos. O PT solo, embora seja um
sonho de Lula, levaria qualquer discurso oposicionista para dentro do bloco de
liderança lulista. Aliás, foi exatamente isto que alimentou Campos e Marina e
que lhes dá mais credibilidade como oposição não raivosa ao lulismo que os
tucanos. No fundo, todos convergem para um ponto fixo do ponto de vista
programático.
Antes da implantação do Plano Real, o pacote de intervenções
na economia feito no governo do presidente Itamar Franco foi muito criticado
por Lula e outra lideranças petistas. Após resultados positivos do Plano, nas
duas eleições seguintes Lula não conseguiu passar credibilidade ao afirmar que
se eleito manteria parte da política econômica. O PSDB hoje sofre dessa mesma
desconfiança ao prometer não acabar com as políticas de inclusão social
promovidas no governo do PT?
R: O PT dos anos 1980 e parte dos 1990 era muito
distinto do PT sob a guarda do lulismo. No caso do PSDB, pode-se dizer o mesmo
a partir da gestão FHC. O que sugere o quanto o Estado (o Executivo, mais
especificamente) define a lógica do sistema partidário brasileiro. O PSDB está
em decadência porque foi se fechando no ideário de seu eleitorado cativo. Na
prática, o discurso tucano é anacrônico. O problema central, hoje, é consumo
familiar. O PSDB não consegue propor uma linha sobre este tema. Afirmar que
manterá as políticas lulistas de promoção do consumo popular é inverossímil, a
contar pela raiva que os tucanos destilam contra tudo o que é feito pelos
governos lulistas. O eleitor ouve e não acredita. Mesmo porque, o PSDB não está
onde este consumidor popular está. Ora, se tem cara de elite, cheiro de elite,
se veste como elite e frequenta os restaurantes da elite, como convencer que
não destruirão tudo o que o lulismo montou? Já Campos e Marina, por terem
participado tanto tempo do campo lulista, podem com mais propriedade afirmarem
que mudarão algo, mas não tudo.
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