Um jornalista me liga e diz que minhas postagens de início de ano estão enigmáticas. Um colaborador afirma que não consegue imaginar que 2014 se revele uma eleição retrô, ao estilo 1989. Quase afirma que nem será farsa, talvez uma tragédia. Então, explico em poucas linhas:
1) A crise econômica não produziu um PIB baixo, mas toda gestão Dilma empacou o espetáculo do crescimento. Pior, desde o início a gestão Dilma não conseguiu administrar com solidez o arco de alianças (a famosa coalizão presidencialista) montada nos oito anos anteriores. A inflação parece sob controle, ainda que um controle limitado. Mas o farto crédito popular tende a ceder. E é aí que mora o perigo, porque todo sistema de legitimação do lulismo está apoiado no consumo popular. Sem ele, termina qualquer ameaça política consistente, caso o confronto se torne inevitável;
2) Com amarras da coalizão frouxas, o que seguraria os partidos da base aliada a tentarem a vida no primeiro turno de 2014? PMDB. E só. Dirigindo Câmara Federal e Senado, tendo a Vice-Presidência garantida e uma fome de dar inveja a qualquer caminhoneiro no horário de seu almoço, o PMDB sempre soube explorar espólio político. Mesmo assim, partidos com lideranças em ascensão tentarão a sorte e criarão um recall para 2018. Depois, recompõem, se for o caso;
3) A tese é simples: a novidade para 2014 não vem das oposições. Vem do bloco lulista. E, que fique claro, não significará o fim do bloco criado no final da primeira gestão Lula. No máximo, diminuirá o poder dos petistas, mas não do lulismo. Mais: mesmo fragmentado, o bloco praticamente desmonta as possibilidades do PSDB porque roubará eleitor de Aécio Neves, sem qualquer ônus em relação ao "risco petista";
4) Com as portas abertas, partidos nanicos poderão negociar apoios. Alguns, lançarão, como sempre, seus candidatos no estilo outsider. Marina aparece nestes primeiros dias de 2013 abraçada à Heloísa Helena, mas nada garante que PSOL e o novo partido de Marina estejam juntos no próximo ano (ao contrário do que deve ocorrer com as duas amigas). Parece certo que o PSB lançará Eduardo Campos. Minha questão/hipótese é: não estimularia outros partidos da base aliada a fazerem o mesmo?
10 comentários:
É totalmente inacreditável que ninguém pense na insustentável imagem eleitoral de Eduardo campos, um completo desconhecido fora das redaçoes e de seu estado. Ele jamais terá mais de 2% dos votos em uma eleição presidencial. Considerar seu nome como essencial é uma bobagem, uma cretinice que um bando de pensadores rastieros insistem em acreditar.
Acho que você está exagerando:
1) Política não é matemática
2) Mesmo assim, na primeira pesquisa Datafolha sobre 2014, Eduardo Campos apareceu com 4% da intenção de votos
3) Pela maneira emocional como terminou seu comentário, fica evidente que você sabe que a especulação tem fundamento. Não dá para brigar com os fatos.
Sintética mas correta avaliação. Hoje não há como garantir a governabilidade se não for com a participação do PMDB.
Só quero ressaltar que Heloísa Helena não faz mais parte do PSOL, fala-se que ela se juntará ao novo partido de Marina (nenhuma definição ainda sobre isto).
Quanto a Eduardo Campos, é óbvio que ele irá sair, nem que seja para expandir sua imagem para 2018. Quem vive em Pernambuco, como eu, bem sabe a inteligência e a capacidade de articulação que esse cara tem. É como sempre digo: se bobear (mais especificamente no campo da economia), Dilma pode perder essa eleição pra Eduardo. Ele tem tudo para solidificar um fantástico discurso de terceira via (nem PSDB, nem PT), mostrar-se adepto do lulismo, entretanto com uma nova cara. E existe um plus: ele é muito bom no debate e como falar. Não sei, mas desconfio que, em 2014, o pleito eleitoral seja, ao menos, emocionante.
Estava em uma sala de professores em novembro de 2012. Professores do curso de direito, história, economia, administração. Vários deles mestres. Alguns doutores. Ousei perguntar se alguém conhecia Eduardo Campos. A perplexidade foi geral. O único que se arriscou errou o alvo. Numa sala de mestres e doutores, ninguém jamais havia ouvido falar em Eduardo Campos. E alguém vem me dizer que um camarada desses consegue viabilizar seu nome para a presidência da república.
Para você ver como o meio acadêmico se divorciou de vez do mundo real. Não saber quem é o governador de Pernambuco, neto de Miguel Arraes, é prova de ignorância. Na minha época, todos seriam demitidos. Por este motivo me afastei do mundo acadêmico. Tornou-se improdutivo.
Rudá, após ler sua tese de múltiplas candidaturas relativamente consistentes, alguns pontos me vêm à mente.
Do ponto de vista eleitoral, em que pese eventual agravamento da situação econômica do país, ainda penso que Dilma seja franca favorita. Diferentemente de 2010, sua figura política guarda, em geral, a confiança exigida instintivamente pelos eleitores. Para mim, naquelas eleições, a ausência desse aspecto foi o maior óbice para Dilma, que teve de lutar para despertar segurança na população, ainda que contasse com apoio de Lula e de ampla base, com recursos e com projeto político consolidado no meio social. Isso me parece consentâneo com a dimensão do personalismo político no Brasil.
E o que as eventuais candidaturas, em 2014, têm a oferecer? Aécio e Eduardo Campos, no âmbito nacional, ainda precisariam consolidar a confiança que faltou a Dilma, em 2010, e que dificultou sua eleição, ensejando maior abertura para dúvidas e para difamações. Além disso, a ambos falta explicitar projeto político que seja alternativo e inspirador. Como se não bastasse, seria ausente, ainda, o apoio do ex-presidente e de ampla base. Com frequência, leio, aqui, que Eduardo Campos possui potencial para realizar a terceira via entre PT e PSDB; no entanto, isso estaria para ser, ainda, objeto de puro marketing, o que aumenta a probabilidade de insucesso da estratégia. A rigor, sua gestão, em Pernambuco, além de muito dependente do governo federal, não se destaca verdadeiramente pela inovação.
A fragmentação decorrente de uma eleição com múltiplas candidaturas, embora seja sempre origem de surpresas, compensa-se, de certo modo, por sua abrangência, ao se abater tanto sobre a base de apoio do governo quanto sobre a oposição.
Ademais disso, creio que estes aspectos sejam igualmente ponderáveis: a) crise internacional: até o momento, não é possível sustentar que o governo, ou melhor, que João Santana, tenha explorado a crise como escusa às dificuldades presentes. O governo, certamente, aponta os problemas decorrentes da crise, mas, para mim, ele ainda não a explora. A razão disso encontra-se, em grande medida, nas expectativas do mercado, pois seria contraprodutivo, neste momento, explorar o cenário de crise econômica como óbice externo ao crescimento do país, que é condição necessária de continuidade da política de renda e de consumo. Se a situação se apertar, com rebaixamento e estagnação das expectativas agregadas, é provável que a crise ganhe novo contorno retórico no governo. A meu ver, a viabilidade da exploração do fator crise somente é consistente, caso a crise seja posterior à execução de políticas com ampla aceitação e reconhecimento social, como no caso das linhas gerais do projeto lulista. Com efeito, a situação seria completamente diversa daquela ocorrida nos anos finais do governo FHC, que, a meu juízo, não poderia sustentar, de maneira exitosa, o argumento de óbice internacional ao crescimento interno, na medida em que a política doméstica pretérita do governo era, para todos os efeitos, impopular. Em síntese, o uso da crise pode alimentar a crença no retorno da política de renda e de consumo do projeto lulista; b) por diferentes razões, Dilma tem conseguido diminuir a grande perda de votos que o PT vinha sofrendo no Sul do país. Até 2014, ela provavelmente terá consolidado liderança na região, como já indicam pesquisas recentes no Paraná, e isso tem implicações importantes, em face do favoritismo de Aécio em MG e de Eduardo Campos em PE; c) a ampla experiência adquirida pela presidente, sobretudo quanto ao ganho de eloquência; d) existência de, ao menos, três candidatos consistentes e capazes de desmontar eventual discurso moralista e quase antipolítico de Marina Silva. Nas últimas presidenciais, Plínio Salgado foi o que mais se aproximou do desmonte do discurso de Marina, chamando-o de "ecocapitalismo"; entretanto, não me recordo de ele ter enfatizado o moralismo da candidata, que confundia político e Política, moral e ética. Atentos ao segundo turno, Dilma e Serra poupavam Marina, que crescia continuamente sobre eles; e) José Serra e SP: qualquer que seja seu papel nas eleições, é certo que José Serra fragiliza a candidatura de Aécio; caso seja Serra o candidato pelo PSDB, repete-se parcialmente 2010, sem o imponderável fator desconhecimento que pareceu capaz de abater Dilma. Quanto a SP, cabe indagar o real comprometimento de Alckmin em relação à candidatura de Aécio, sobretudo considerando as presidenciais de 2018. Compensando o cenário para Dilma, de toda forma, há o êxito de Haddad na capital paulista.
Faço-me, ainda, algumas questões: em primeiro lugar, qual seria a implicação de uma derrota eleitoral pouco animadora de Eduardo Campos em relação ao ganho de força de Ciro/Cid no PSB? Em segundo, qual seria o acréscimo de poder de barganha de Dilma, caso ela vença a eleição que fragmentou sua base? Em quanto isso poderia alterar seus meios e sua disposição de governança a partir de 2014?
"Seu" Ruda
Acesso o seu blog de vez em quando e guardo os seus chutes, digo, previsões e vou formando a minha opinião.
Vc disse "O triste desta história é que Patrus Ananias e a “geração dos 80″ do PT mineiro morreu ontem na política. Serão ouvidos, como Jairzinho é entrevistado por alguns jornalistas para ilustrar a geração canarinho, da Copa de 70. Patrus será, agora, uma ilustração e não mais que isto. Somente a imensa generosidade e piedade lhe poderá conceder uma vaga que lhe dê sobrevida e visibilidade pública. Com ele, começa a minguar uma legião de petistas efetivamente abnegados e engajados num projeto. Algo raro no PT de hoje." O artigo completo guardei aqui http://dukrai.wordpress.com/2010/05/04/ruda-ricci-fim-do-patrus-na-politica/.
Como vimos o seu palpite em 2010 sobre a morte política de Patrus e o sucesso eleitoral de Pimentécio foi um fiasco e guardo as suas novas previsões sobre Eduardo Campos candidato a presidente. Parece certo que vai ser uma nova trombada com a realidade.
João Aguiar/dukrai
Questão de perspectiva, João. Esta sua citação de Patrus me lembra aquela história do amigo que pergunta para sobre o pai e a resposta é um surpreendente, "infelizmente, ele morreu há dois anos". O que, transtornado, faz com que o amigo saia com esta: "morreu para você, filho ingrato. Ele continua vivo no meu coração".
Tenho a impressão que você atualizou esta "tirada". No mais, o que pode mudar este cenário é a candidatura de Lula (que, segundo comentário de Gaspari na Folha de hoje, é provável).
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