quinta-feira, 31 de outubro de 2013

A polarização de Lula com Marina

É das mais arriscadas a estratégia de Lula de polarizar com Marina Silva. De um lado, pode significar a certeza de Lula que ao polarizar, desautoriza (ou alerta) o apoio que muitos eleitores lulistas poderiam dar á ex-ministra de Lula. Minha impressão, contudo, é que o risco de Marina fazer de Lula uma "escada" é maior. A escada política é uma velha tática: um personagem com menor destaque cria um conflito com um personagem com maior visibilidade e, com isto, ganha força perante o público externo.
Lula parece errar no cálculo arriscado (risco é uma marca dos "animais políticos").
Num plano menor, parece que também erra ao fazer as consultas a respeito da possibilidade de aprovar proposta de autonomia formal do Banco Central. Além de incomodar o governo Dilma, pode revelar temor sobre crescimento de Campos junto ao empresariado (Lula afirmou que a proposta de autonomia do BC poderia gerar o mesmo impacto que a Carta ao Povo Brasileiro de 2002).
Lula tem faro. Mas já errou ao valorizar sobremaneira Eduardo Campos no ano passado. Deu no que deu. Sinto que, por ansiedade, acaba antecipando uma situação que até então era mera possibilidade.

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

10 Anos de Bolsa Família

O programa símbolo do governo federal faz dez anos. Criado em outubro de 2003, o Bolsa Família mantém 45% das famílias beneficiadas no seu cadastro desde o início do programa. Não se sabe, ao certo, o que ocorreu com os outros 55%. Portanto, fiquemos concentrados nos 45%.
Em primeiro lugar, é evidente que se trata de um necessário programa social que só ocorreu porque as elites políticas brasileiras são, na quase totalidade, insensíveis à qualquer ação de fôlego para combater a pobreza, não necessariamente a desigualdade. O governo Lula formatou este programa gigantesco. A questão, portanto, não é a importância do PBF. A questão é se o programa ficou incompleto. Na gestão Patrus Ananias do MDS, se tentou introduzir educação e PBF. O próprio ministro veio à pública confirmar o fracasso de tal iniciativa.
O censo do ensino superior, divulgado ontem pelo MEC, indica que a oferta de cursos é altamente concentrado na região sudeste (50% das instituições de ensino superior do país), em especial, em SP (50% das instituições de ensino superior da região sudeste) e Minas Gerais (30%). O padrão de concentração continua país afora: no nordeste, 80% dos cursos superiores se localizam na Bahia e Pernambuco.
Enfim, a política educacional brasileira parece adernada.
Há outro problema. A gestão do programa. No início, era o Fome Zero. Frei Betto elaborou um sistema de co-gestão, onde representação social local acompanhavam a indicação das famílias beneficiadas, os programas e todo controle sobre sua efetivação. Frei Betto deixou registrado em livro que um dos motivos para deixar o governo federal foi justamente a transferência deste controle social para as mãos dos prefeitos. Ivo Poletto, em outro livro-depoimento, relata com mais detalhes o quanto esta proposta de gestão participativa foi desconsiderada pelo alto escalão governamental.
Então, sejamos claro. A frase de efeito que Lula proferiu hoje ("quem se opõe ao bolsa família nunca passou fome") distorce um debate necessário sobre os rumos deste importante programa. Interdita um debate legítimo de cidadãos sobre o que se faz com o dinheiro público. O PBF não é do governo e muito menos de Lula (daí me sentir envergonhado com este debate, de cunho eleitoreiro, sobre quem criou o programa, se tucanos ou petistas).
Não me lembro de alguém rejeitar o bolsa família, ao menos em público. Portanto, Lula fala para alguém desconhecido ou tem alguma informação que não é pública. Não se trata de oposição. Mas de transformar, no caso de pessoas como eu, num programa que seja mais que um programa assistencialista de tipo mexicano (como foi o Solidariedad). Mas já sabemos como o lulismo lida com debate público sobre o que faz. Não lida.

A matéria do JN sobre censo do ensino superior

Ver AQUI

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Os dados do MEC sobre instituições de ensino superior no Brasil

O Jornal Nacional acaba de divulgar os dados do Censo do Ensino Superior. Os dados são bem impressionantes e revelam esta persistência brasileira da desigualdade regional. Vou reproduzir, abaixo, alguns desses dados que ajudei a interpretar para a Globo:


Públicas nas capitais, Privadas no Interior

1. Públicas representam 12,5% de todas instituições de ensino universitário do país. São, na maioria, universidades (55,9% do total de instituições públicas) e concentram-se nas capitais (33% das instituições públicas de ensino superior, sendo 75% dos IFETs e CEFETs)
2. Privadas representam 87,4% das instituições de ES. Estão preferencialmente no interior (64,4% do total de instituições privadas). São maioria entre os centros universitários e faculdades isoladas.

Sudeste é privilegiado; os Estados mais poderosos politicamente também

Distribuição das instituições por região e Estados com maior incidência
REGIÃO
NÚMERO DE INSTITUIÇÕES
%
ESTADOS COM MAIOR INCIDÊNCIA NO INTERIOR DA REGIÃO
Norte
154
6,3
Pará (22%) e Tocantins (23%)
Nordeste
444
18,3
Pernambuco (12,6%) e Bahia (26,1%)
Sul
409
16,9
Região que apresenta maior equilíbrio entre Estados (entre 115 e 95 inst/Estado)
Sudeste
1.173
48,5
Maior concentração: Minas Gerais (29,4%) e São Paulo (50,9%)
C-Oeste
236
9,7
Mato Grosso do Sul apresenta menor número de instituições na região (35), no restante 60 a 80 (caso de Goiás).

Padrão de concentração de instituições privadas:

Alto padrão de instituições privadas
Padrão Médio/Alto de instituições privadas
Bahia: 93% são privadas. Não há instituições municipais.

Minas Gerais: 91,6% privadas.

Pará: 85,2% de instituições privadas. Não possui instituições municipais.


São Paulo: 85,6% privadas.

Tocantins: 71% instituições privadas

Pernambuco: 69,7% das instituições são privadas.





INGRESSOS

2009
2010
2011
2012
Brasil
      1.732.613
      1.801.901 (+ 4%)
      1.915.098
(+ 6%)
      2.204.456
(+ 13%)
Norte
105.915
105.583
(-0,3)
121.856
(+13%)
138.852
(+12%)
Nordeste
294.711
332.546
(+11,4)
352.691
(+ 5,8)
402.677
(+ 12,5)
Sudeste
891.797
906.853
(+ 1,7)
957.380
(+5,3)
1.118.111
(+14,4)
Sul
273.166
280.771
(+2,8)
304.010
(+7,7)
333.088
(+8,8)
C-oeste
167.024
176.148
(+5,2)
179.161
(+1,7)
211.728
(+15,4)

INGRESSOS (e perfil do voto):


Sudeste, Sul e Centro-Oeste apresentaram crescimento inferior à média nacional nos anos em vermelho.
Centro-oeste se recupera no último ano (verde).
Nordeste apresenta maior crescimento de ingressos em 2010 e se mantém na média nacional nos anos seguintes.




 
Área Geral
Total
Região Geográfica
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
EAD
Total
32.010
2.340
5.547
14.416
5.930
2.629
1.148
Área Básica de Ingresso
144
3
3
113
16
9
-
Ciências sociais, negócios e direito
9.552
544
1.458
4.522
1.800
807
421
Educação
8.171
892
1.928
2.791
1.302
681
577
Saúde e bem estar social
3.707
250
707
1.780
633
312
25
Engenharia, produção e construção
3.767
201
470
2.055
796
227
18
Ciências, matemática e computação
3.176
201
456
1.600
600
278
41
Humanidades e artes
1.454
56
192
752
353
86
15
Agricultura e veterinária
880
117
138
259
222
137
7
Serviços
1.159
76
195
544
208
92
44


Observações do MEC

A maior parte dos cursos está localizada na Região Sudeste, com participação de 45% no total, seguida das regiões Sul e Nordeste, com 18,5% e 17,3%, respectivamente. Analisando cada região, a área de “Educação” predomina na Região Norte, com quase 40% dos cursos, sendo que na Região Sudeste, essa área representa cerca de 20% do total. A “Educação” é preponderante, também, na Região Nordeste, com 35%, seguida da área de “Ciências Sociais, negócios e direito”, com participação de 26,3% do total. Na Região Sudeste, pouco menos de 1/3 dos cursos está, também, na área de “Ciências sociais, negócios e direito”, o mesmo ocorrendo na Região Sul e na Região Centro-Oeste. Isso demonstra que a maioria dos cursos de graduação está na área de “Ciências sociais, negócios e direito” e “Educação”, que juntos representam mais da metade do número de cursos de graduação registrados no Censo 2012.

Minhas observações:

Destaquei, na tabela, em marrom, as duas áreas com maior oferta de cursos de graduação: Ciências sociais, negócios e direito & Educação. Como indica a observação do MEC, educação se destaca no norte e nordeste. Lembremos que educação sempre foi porta de entrada de mulheres no mercado de trabalho em áreas de cultura conservadora e patriarcal.

Em verde, destaquei a região-líder por área. Sudeste se destaca das demais. Contudo, a região sul se destaca (juntamente com a região sudeste) nas áreas de ciências agrárias (duas áreas com forte concentração na produção de grãos e commodities no topo da pauta de nossas exportações). Interessante que o nordeste é a região que apresenta maior concentração de pequenas propriedades rurais e agricultura familiar, o que indica política nacional que não consegue alterar o patamar de conhecimento tecnológico/educacional nesta região, se concentrando em políticas sociais/assistenciais.