Comecei a ler o livro de Leonardo Boff cuja capa ilustra esta nota. Um texto simples, cuja organização parece agregar vários pequenos ensaios que se repetem a partir de uma ou duas ideias-força.
Boff traça um paralelo entre Francisco de Assis e o novo Papa.
O primeiro interesse é compreender por qual motivo (não só o aparente) os expoentes da Teologia da Libertação abraçaram o Papa Francisco desde o primeiro minuto. Boff dá as pistas.
Neste livreto o autor insiste nas seguintes semelhanças entre frei e Papa:
a) Voto de pobreza. Boff destaca o primeiro discurso do novo Papa, no dia 16 de março, em que relata o conselho de Cláudio Hummes ("não se esqueça dos pobres"), terminando com uma frase impactante: "como gostaria de uma Igreja pobre e para os pobres";
b) Mas esta identidade não é gratuita e Boff procura politizar esta opção. Para isto, repisa a interpretação que Francisco de Assis teria feito sobre a voz de um santo que lhe orientou para reconstruir a igreja em ruínas. Inicialmente, teria entendido que se tratava da ruína física da pequena e velha igreja de Porciúncula. Contudo, logo percebeu que a voz se referia à Igreja como um todo, em ruína moral. Não se trata de uma tese ingênua ou mesmo apaziguadora. Trata-se de enfrentamento político no interior da Igreja Católica;
c) Boff ressalta, ainda, que como Francisco de Assis, o novo Papa surge da periferia e afeta o centro. Emerge e se impõe sem ruptura;
d) Finalmente, faz uma analogia entre a amizade de Francisco de Assis com Clara de Assis, relaciona o respeito e cuidado entre os dois sexos com o cuidado com a Mãe Terra. Esta relação é clássica e se encontra em muitos discursos religiosos, não só o católico. Este ponto me parece a principal novidade que pode estar por vir com o novo Papado. Ao dizer que não tinha como julgar um homossexual que procurasse estar em paz com Deus, apenas abriu uma porta nesta delicada área da sexualidade e sacerdócio. O desfecho vai mais longe. O jornal El País de 22 de setembro último publicou uma reportagem assinada por Juan Arias em que sustenta que o novo Papa pensa em nomear uma mulher para Cardeal. Papa Francisco já teria dito à revista La Civilità Cattolica que "a Igreja não pode ser ela mesma sem a mulher" e, ainda, que "a Igreja não está completa porque nela falta a mulher". Há 800 anos, lembra a reportagem, as mulheres poderiam ser diaconisas. Hoje, são impedidas. Em outras palavras: esta pode ser o início das reformas ruminadas pelo novo Papa. Não se trata de consagração presbiterial, mas um cargo de conselheiro.
No mês de outubro se anuncia uma carta que Papa Francisco divulgará tendo a opção pelos pobres como tema central.
A tal modernização do catolicismo parece ter começado. Mas como é de bom tom para uma instituição milenar, as mudanças se fazem sem alarde, pela soma de indicações. Ao final, vem o impacto, como um tsunami. Foi assim com João XXIII. Parece que será novamente com Francisco.
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