Trata-se do sindicato de professores da rede estadual de Minas Gerais. É o maior sindicato cutista do Estado. Nos últimos anos entrou numa crise pesada, altamente personalizada, entre dirigentes da mesma corrente majoritária. A nova direção (nem tão nova assim) tenta demonstrar coesão mas como se perceberá no relato abaixo, está tendo dificuldades. Há críticas generalizadas ao personalismo e autoritarismo da direção atual. Já se fala em formar uma articulação paralela (partindo da mesma corrente que dirige o sindicato). Minha intenção, ao reproduzir o relato abaixo, é desnudar os descaminhos de parte do movimento sindical brasileiro, mergulhado numa simbiose entre governismo e discurso anacrônico.
Do Blog do Euler:
Bom, pessoal da luta, vamos ao relato que eu prometi para vocês. Para quem dorme entre duas e três da madrugada, acordar às sete é sempre algo desconcertante. No primeiro momento você tem a impressão de que ainda está dormindo, mas está já de fato acordado. Será mesmo? Fato é que havia combinado com o combativo João Martinho que iria de carona com ele. "Saio daqui às oito" - disse o João. Então, quando o relógio acusou tal horário, lá estávamos nós, a caminho da reunião do conselho na sede da Escola Estadual Central Gov. Milton Campos. Lá chegando, dou conta de que o café na porta de entrada do auditório parecia bem simplesinho: um cafezinho ou chá com biscoitos. Por sorte minha, e talvez para o azar dos colegas do Estadual Central - havia uma reunião dos educadores daquela escola. Como eu já comentei aqui, educadores adoram se reunir no sábado, impressionante! Ganhamos mal, mas trabalhamos sábado, domingo, feriado... A sorte minha, como eu dizia, é que o café da manhã deles foi bem mais variado. E como dois professores daquela conceituada escola me conheciam de outras jornadas, me arrastaram para participar da ceia matinal, com direito a coxinha, refrigerante, um pastel "folheado", que enfim, deu gás para a primeira parte da manhã.
Já no auditório, a reunião teve início tal como estava na pauta do site do sind-UTE. Os dirigentes sindicais foram convidados para a mesa - Sind-UTE, SindPol, SindSaúde, Sind-Fisco e Sindieletro; além de um deputado do bloco Minas Sem Censura. Cada um falou em torno de 15 minutos, expondo as situações específicas de suas respectivas categorias nas negociações com o governo.
Não há como negar que é importante conhecer essas diferentes realidades, principalmente se tal intercâmbio se der em momento mais apropriado, talvez num fórum específico, quando a questão da unidade de todos os servidores públicos de Minas poderia e deveria ser debatida e construída. Mas, aquele momento, como eu disse aqui no blog, deveria ter sido reservado exclusivamente para a nossa campanha salarial. Até mesmo em função das muitas dúvidas, das diferentes opiniões e propostas de encaminhamentos e etc. Seria um importante momento para aprofundarmos e construirmos a necessária unidade para a luta.
Após a fala dos dirigentes sindicais, os companheiros da base puderam intervir, em número de 10 colegas, no tempo máximo de 3 minutos cada. Ouvi tudo pacientemente, como aconteceu com todos que lá estavam, que afinal estavam lá em número não muito grande, talvez 100 colegas, um pouco mais, um pouco menos.
De todas as falas que ouvi dos dirigentes sindicais, só me veio à mente a percepção de que a unidade das categorias dos servidores pode ser construída, mas através de um longo processo de união de propostas, de diálogo nas bases, e entre os colegas de base e direção sindical. Por isso, não nego a importância de estarmos juntos na luta, mas, neste momento, dada à especificidade de cada categoria, dificilmente conseguiremos mais do que gestos isolados de solidariedade. O que é importante também, mas não pode ser confundido com a verdadeira unidade programática e pela base.
Após esta etapa da reunião, saímos para almoçar, já próximo de 13h. Na saída da escola encontrei o representante do Sind-Fisco, companheiro Lindolfo (se não me falha a memória). Cumprimentei o colega pela exposição e falei rapidamente sobre a realidade da educação em Minas. Quando lhe falei sobre o subsídio, ele me disse mais ou menos o seguinte: "nossa categoria passou por um processo semelhante, tendo que escolher em qual carreira ficar. Mas, nós entramos com uma ação na Justiça e ganhamos o direito de optar a qualquer tempo, por qualquer uma das carreiras".
Fiquei de cobrar dele, por e-mail, detalhes desta ação para ver se há de fato algo semelhante com a lei do subsídio. Claro que não quero semear ilusões na categoria e por isso está mantida a nossa orientação de que TODOS devem retornar para o antigo regime remuneratório.
O almoço foi num restaurante à beira da avenida do Contorno. O cardápio variado incluía feijoada, frango, linguiça, legumes, arroz, farofa e um refrigerante para acompanhar. Na nossa mesa, uma equipe da pesada: João Martinho, Rômulo e mais três colegas do PSTU, que não param de comentar sobre a importante fala da professa Amanda Gurgel, do Rio Grande do Norte, que virou celebridade nacional. Ao lado da nossa mesa, outra mesa também de peso: Beatriz, Marilda e mais duas outras colegas da direção estadual do Sind-UTE.
O detalhe é que elas ficaram em uma só mesa e nós seis ficamos em duas mesas, já que o Rômulo tratou de "expropriar" uma das mesas que estavam reservadas para as colegas da direção, dando assim o devido equilíbrio de forças, pelo menos na hora do almoço, rsrs. Numa terceira mesa, igualmente de peso, lá estavam a Rosa, a Istênia e outras colegas de combate. Outros grupos de educadores por lá passaram, já que o almoço não fora concentrado num único lugar, mas ficava ao critério de cada um achar um bar ou restaurante mais próximo.
Na parte da tarde, já um tanto quanto sonolentos - também, depois de uma suculenta feijoada, né pessoal, não há quem resista - e sentados nas confortáveis poltronas do auditório do Estadual Central, tivemos que relutar para não dormir. O João, combatente antigo, deu uma cochilada. O Rômulo ficou um tempo lá fora, tomando cafezinho para aguentar de pé, conspirando.
A colega Marilda fez a exposição sobre o PNE - Plano Nacional da Educação - durante 20 e poucos minutos, e em seguida, cinco colegas falaram nas tradicionais intervenções relâmpagos, de três minutos.
Finalmente, já ultrapassando as 16 horas, os temas tão aguardados - salário, carreira, piso, negociação com o governo - foram abordados pela coordenadora do Sind-UTE, Beatriz Cerqueira. Ela falou que o modelo de negociação com o governo, baseado nas reuniões com a secretária da Educação, estava chegando num limite de desgaste, já que, apesar de conquistas como na questão das eleições para diretores e pontos do concurso, não se avançava na questão da carreira e dos salários, entre outras.
Defendeu toda a ação do sindicato e não apresentou nenhuma avaliação crítica mais profunda daquilo que tem sido feito, das propostas, etc. Defendeu o piso de R$ 1.597,00 para a jornada de 24 horas para o professor com ensino médio; disse que o piso era para todas as carreiras da Educação, já que temos um quadro único; disse que é assessorada por uma das melhores juristas (ou advogadas) de Minas; e deu a entender que o melhor momento para a greve seria após as eleições dos diretores, assim mesmo no dia 12 de junho, data da segunda etapa da referida eleição. Justificou o formato da reunião do conselho, dizendo que a direção entendia que era importante que toda a categoria fizesse a leitura da unidade e da atuação das demais entidades sindicais dos servidores que travam a luta contra as políticas do governo, etc. E também, que era importante iniciar o debate sobre a questão do PNE em Minas Gerais. Destacou a participação de Minas no evento de Brasília, que representou a maioria dos educadores que ali estiveram.
Quando abriu para a fala dos presentes, várias pessoas se inscreveram. Neste momento achei por bem falar, embora sabendo da limitação de tempo. Em três minutos apenas, com tanta coisa para dizer, o que resta fazer é abrir fogo, qual metralhadora giratória. E eu falando, e falando e a mesa dizendo: tempo, companheiro, tempo, rsrs. Resumi em poucos minutos o que tenho dito aqui no blog através de muitas laudas. O pior é que antes de mim já tinha falado o Rômulo, principal orador oficial do Blog (que tem muitos, claro).
Fizemos a crítica do formato da reunião de hoje e defendemos o programa mínimo que o blog tem divulgado (retorno de todos ao antigo sistema remuneratório, sem redução de salário; pagamento do piso do MEC já; reajuste nas tabelas de todas as carreiras da Educação de acordo com os reajustes dos professores; devolução das gratificações confiscadas dos novatos em 2003).
Criticamos a defesa que o sindicato vem fazendo junto ao governo, de um piso maior para a jornada de 24 horas, sem esclarecer que se trata de reivindicação e não de direito legal mínimo exigido por lei; criticamos a falta de comunicação da direção com a base - após as reuniões com o governo - e sobre temas como o retorno da categoria ao antigo sistema remuneratório.
Outros colegas também fizeram intervenção, com diferentes enfoques. Lamentei, na minha rápida fala, o quanto ficava claro que precisávamos de mais tempo para discutir com profundidade as divergências e diferentes concepções ali apresentadas. A unidade se constrói com o diálogo, de preferência horizontal, sem os privilégios da direção em relação à base. Privilégios a que me refiro, como o monopólio do tempo para defender as concepções.
Assim que terminei de falar, um dos diretores do Sind-UTE rebateu o que eu disse de forma bem distorcida. Disse, por exemplo, que o sindicato não defendia o retorno da categoria sem redução de salário porque entendia que o piso de R$ 1.597,00 era maior do que qualquer salário do subsídio.
Vejam como as palavras aceitam de tudo. Primeiro, quem garante que o governo vai pagar o piso de R$ 1.597,00? Se não pagar, o sindicato vai bancar a diferença para os servidores que retornarem para a antiga carreira confiando no sindicato? E se o governo demorar a aplicar o piso, mesmo o do MEC? Viram como é importante a defesa do retorno à antiga carreira junto com a exigência da não redução salarial? Mas, este tipo de contraponto eu não pude fazer, já que havia usado meus míseros três minutos.
E no final, a colega Beatriz que já havia feito a sua exposição inicial, falou por mais 20 minutos, pelo menos, rebatendo todas as questões que colocamos. Tomou até as dores, de certa forma, quando disse que na sua carreira de dirigente sindical não aceitaria ser chamada de mentirosa. Não vi ninguém a tratando como tal. Na minha fala, por exemplo, disse que "não podemos mentir para a categoria, dizendo para os colegas que eles teriam direitos que na verdade não têm", numa referência tanto ao piso de R$ 1.597,00 para a jornada de 24 horas, quanto a extensão desse piso para as demais carreiras da Educação.
Essas duas questões, pelo menos, até agora o sindicato não provou que são legalmente direitos garantidos para os educadores. A Lei do Piso diz claramente que os governos podem pagar proporcionalmente à jornada praticada em cada estado. Ora, se podem pagar dessa forma, na prática, é este o direito mínimo a exigir. Claro que se o governo quiser pagar 3.000,00 para uma jornada de 5 horas, ele pode. Mas, não é obrigado a fazê-lo. E dificilmente fará.
Beatriz disse ainda que nós não podemos aceitar a interpretação equivocada do MEC em relação ao valor do piso, e que devemos cobrar do governo mineiro até para servir de referência para o Brasil. Vejam o paradoxo: o equívoco é do MEC (e da AGU), mas nós devemos cobrar a "correção" deste equívoco de Anastasia!
E na argumentação em defesa da direção sindical, Beatriz apresenta os dados cronologicamente para demonstrar que foi a categoria quem aprovou o piso da CNTE. Disse que em fevereiro a discussão era entre o reajuste do subsídio e o pagamento do piso da CNTE, e que a direção tinha apoiado esta última. Reparem que aqui o contexto era bem outro. O piso era considerado remuneração total e somente após o dia 06 de abril é que o piso foi considerado vencimento básico pelo STF. Nada mais natural do que houvesse uma mudança de análise, pois a realidade mudou. Não se trata aqui de saber qual era a proposta mais coerente com aquilo que havia sido defendido anteriormente, mas com a nova realidade, do piso enquanto vencimento básico.
Resumindo: a direção não quer abrir mão das propostas que vem defendendo, o que é um direito deles; mas, nós também achamos que a nossa proposta é aquela que melhor atende a categoria no momento. Conquistar o piso, mesmo sendo o valor rebaixado do MEC, representa, nesta momento, uma importante conquista para a categoria. Para os mais antigos, representa um ganho substancial. E para os novatos com curso superior não há perda e ainda abrimos caminho para outras conquistas. Defender o retorno de todos ao antigo regime remuneratório, sem redução salarial impedirá que os poucos segmentos que teriam alguma perda momentânea não ficassem prejudicados. Defender o reajuste para todas as carreiras de acordo com os reajustes dos professores é diferente de dizer que todos têm os mesmos direitos em relação à lei do piso. E por último, defender a devolução das gratificações roubadas dos novatos a partir de 2003, que hoje representam cerca de 60% da categoria.
Este é o programa mínimo, que pode unificar toda a categoria, que depois terá as condições de continuar cobrando outros direitos e reivindicações, como as alterações na carreira (redução de tempo para as promoções, etc), direito dos efetivados de completar sua carga horária e ao posicionamento de acordo com sua formação acadêmica; etc, etc.
Enfim, camaradas de luta, é hora de nos prepararmos para a assembleia do dia 31 de maio. Já está claro que teremos que fazer uma greve para arrancar os nossos direitos, mesmo sabendo que agora temos tais direitos em lei. Só o governo pode impedir tal paralisação, pagando o que é nosso direito. E que a direção sindical não seja um obstáculo à essas conquistas, que apesar de aparentemente modestas, têm um grande significado para todos os educadores.
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