sábado, 23 de maio de 2009
Os intelectuais brasileiros: A Provocação
Enviei email para alguns amigos a respeito do papel dos intelectuais brasileiros e a correria por publicações para preencher o famoso currículo Lattes. Reproduzo partes do texto que enviei:
"(...) O que me chamou a atenção é que este tema [o papel dos intelectuais brasileiros] emerge das cinzas a cada período de mudanças significativas da vida política tupiniquim. Afinal, os intelectuais tiveram um papel relevante no processo de construção do Estado brasileiro e, mais adiante, no confronto com o regime militar (em centros de pesquisa, como CEBRAP ou CEDEC, do qual fiz parte). Lembro-me de Francisco Weffort, Eder Sader, Gabriel Cohn e tantos outros em seminários infindáveis discutindo a redemocratização do país, a nova engenharia a ser construída pelo processo constituinte, e assim por diante. Em tempos mais próximos, os intelectuais migraram para ações de consultoria contratadas por governos estaduais e federais, criando uma espécie de retroalimentação (da consultoria para o Estado, do Estado para empresas privadas, de empresas para consultorias, de consultorias para Estado). Pois bem, acabo de receber um questionário da SBS (Sociedade Brasileira de Sociologia) e em determinado momento, solicitam que avaliemos a credibilidade e legitimidade dos sociólogos em diversas frentes de trabalho (de consultoria ao magistério universitário, e assim por diante).
Confesso que ao responder o questionário da SBS, fiquei pensando como esta trajetória foi se alterando de meados dos anos 80 para cá. (...) Minha tese é que se vive no mundo acadêmico uma febre de produção e publicações, valorizada exclusivamente pelo mundo acadêmico (novamente, a retroalimentação) que não tem nenhum impacto no mundo real. Reforço que minha avaliação é que não há nenhum impacto concreto que percebo. Sociólogos brasileiros (para citar minha profissão) do mundo universitário só são respeitados (com muitas reticências pelos seus pares) em seu mundo fechado. Pode ser um fenômeno da emergência de uma sociedade de massas urbanas e globalizada, da emergência da nova classe média brasileira, do declínio dos clássicos formadores de opinião, da constituição de redes sociais flexíveis e efêmeras. Mas o fato é que não temos mais nenhum intelectual (ou obra) com o peso de um Gilberto Freyre, Paulo Freire, Florestan Fernandes, Caio Prado Júnior, Décio Pignatari, Alfredo Bosi, Antonio Cândido, Raimundo Faoro, ou mais recentemente, Marilena Chauí, dentre outros. Não vou correr o risco da listagem desnecessária.
Minha questão pessoal é que esta sana de publicações e produtividade acadêmica se tornou absolutamente estéril socialmente. O impacto político é nulo. (...) Acredito que esta sana produtivista, estimulada pela CAPES anos atrás, criou um grande mercado cativo e fechado/circular, uma verdadeira reserva de mercado. Muitas vezes, seguro o riso fácil quando percebo um desespero para a publicação de uma coletânea de textos em livro ou a formação de uma mesa em congresso, sem qualquer nexo com o que se fez antes e o que se fará depois da publicação. Leio vários currículos Lattes que me assustam (confesso que nem terminei de produzir o meu, dado o desânimo que se abateu sobre mim). A imensidão de publicações e eventos que o distinto produziu e/ou participou é, muitas vezes, inversamente proporcional à sua importância para o município onde está residindo, seu Estado ou país. Há exceções. Algumas. Sufocadas pela grande maioria que gera uma fortíssima unanimidade (sim, estou pensando naquela frase). No mundo real, quando precisamos convidar um intelectual para auxiliar na reflexão sobre um tema essencial para a sociedade, contamos nos dedos de uma meia-mão. Quando assisto uma defesa de dissertação de mestrado ou tese de doutorado, fico imaginando o que deve ser uma monografia de conclusão de curso de graduação nos dias de hoje. Assisto bancas de defesa espinafrar o candidato para depois lhe conceder o título, num teatro que se repete ao longo do país. Em tempos neokeynesianos, qual a contribuição social, afinal, que nosso meio está dando à sociedade? "
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2 comentários:
Caro Rudá,
Confesso que seus questionamentos, a problemática, a hermenêutica dele é de pirar a cabeça. Atualmente sou graduando no curso de História da UFMG e te confesso que várias vezes, ao longo da caminhada entre os corredores e escadarias da Fafich, me faço a mesma pergunta. È de dar um desânimo só. Mas o grande dilema que penso às vezes é que não há solução Real para o problema. Historicamente, a acadêmia já nasceu defasada de um olhar pragmático da construção do conhecimento, "atrás de seus muros", buscando retruir tais produções para a sociedade. A pergunta que eu faço é: "O que fazer"( se é que há algo)?
Infelizmente a produção científica e intelectual virou um mercado de promoção pessoal. Tem muita gente que só quer aparecer e contabilizar publicações inúteis. Outro dia adquiri um livro de Mira Y Lopes, que teria a idade do meu bisavô. "Os quatro gigantes da alma". Um homem brilhante que dedicou a vida a compreender a mente humana. Que engajamento! Infelizmente a maioria dos formandos em psicologia só conhecem o seu teste PMK. Se eu tivesse publicado um livro desses seria feliz para sempre. Parafrasenando Marilena Chauí: E para que serve a psicologia? Vejo tanta gente morrendo ao meu redor sem poder ajudar. Porque os PSF's não tem psicólogos e sociólogos? Eita estado mínimo! Geovane Melo - Psicólogo
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