Chefe da Casa Civil de Dilma deve aliar pulso firme e habilidade política
Igor Natusch
Dilma Rousseff (PT) tornou-se nome forte e se credenciou para ser a sucessora de Lula a partir de sua atuação como chefe da Casa Civil. Para alguns, foi a partir da entrada de Dilma que o aspecto técnico do governo federal se consolidou, e a parceria bem-sucedida é uma das marcas do governo Lula. Agora, já eleita, Dilma tem o desafio de indicar um nome forte para ser o braço direito em seu governo. Não apenas buscando alguém capaz de aliar firmeza com jogo de cintura, mas uma figura cuja seriedade seja capaz de espantar os fantasmas gerados pelo escândalo envolvendo Erenice Guerra, pessoa indicada por Dilma para substituí-la na Casa Civil de Lula.
Nos bastidores, uma série de nomes surge como alternativas para preencher o cargo. Entre eles, quadros destacados no PT, como o ex-ministro Antônio Palocci, o secretário-geral do partido, José Eduardo Cardozo; e o ministro do Planejamento de Lula, Paulo Bernardo. Surgem também duas mulheres: a atual diretora da Petrobras, Maria das Graças Foster, e a secretária executiva do PAC, Miriam Belchior. Elas podem ser privilegiadas pela disposição de Dilma Rousseff, que já declarou o desejo de preencher cerca de um terço das pastas governamentais com mulheres.
João Motta (PT), futuro secretário de Planejamento do governo de Tarso Genro (PT), acredita que a campanha eleitoral foi “um grande aprendizado político” para a futura Presidenta do Brasil. “Ela é um quadro político que dá muita importância a uma boa gestão da coisa pública. Se há um ponto do qual ela não abre mão, é esse. A tendência é que ela busque cercar-se de pessoas com essa capacidade, que tenham experiência comprovada na função”.
O senador Paulo Paim (PT) descreve Dilma como “uma líder, muito firme, competente e preparada” para encarar as dificuldades naturais para o mandatário de uma nação. “Ela é uma pessoa movida pela coerência, mas também sabe quando deve fincar pé em uma determinada situação. Ela ouve, mas a última palavra é dela, e ela não foge desse tipo de responsabilidade”, explica. O senador acredita que a personalidade política de Dilma servirá de base para a escolha de um nome para a Casa Civil.
O cientista e analista político Rubem Barboza Filho, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), acredita que a grande diferença entre Lula e Dilma está na capacidade de delegar tarefas. “Para Lula, sempre foi relativamente fácil delegar os projetos do governo nas mãos que ele considerasse competentes para isso. Ele nunca teve disposição para questões técnicas, exatamente o oposto de Dilma. Ela tem um braço muito mais centralizador”, diz.
Nesse sentido, o cientista político da UFJF acredita que Dilma deverá manter controle sobre a maior parte dos aspectos do governo. “Em muitos pontos técnicos, Dilma deve chamar a responsabilidade para si própria”, argumenta. “A Casa Civil deve ganhar um papel maior de negociação com o Congresso, se valendo do apoio do vice-presidente (Michel Temer, do PMDB) e de lideranças do PT nacional”.
“Problema horroroso”
O sociólogo e blogueiro Rudá Ricci acredita que a chefia da Casa Civil ganha dimensão dentro de um panorama mais geral. Segundo ele, determinados cargos políticos têm importância estratégica para o governo de Dilma. “A reforma política, por exemplo, envolve um problema horroroso, que é a corrupção. Pelo que tem surgido, parece que Dilma quer resolver voando essa situação”.
Além disso, Rudá acredita que os ministérios envolvidos com o ajuste fiscal – Planejamento, Fazenda e Desenvolvimento Social – estão sendo considerados de forma especial pelo PT. “A política econômica que Barack Obama (presidente dos EUA) está se preparando para adotar deve provocar grande fluxo de investimentos para países com alta taxa de juros, como o Brasil. O Brasil vai fazer de tudo para tentar brecar essa enxurrada, e isso deve implicar em um corte muito pesado nos gastos públicos”, descreve.
Isso faz com que esses cargos estejam dentro da cota que será preenchida especificamente por Dilma Rousseff, Lula e o PT de uma forma geral. “A disputa de nomes, nesse momento, envolve o que a Dilma quer e o que o PT deseja. Até dezembro, tem muitos nomes para queimar”, brinca.
João Motta, do PT, discorda dos que acreditam que o novo ocupante deverá balancear a falta de experiência política de Dilma Rousseff. “Não creio que seja esse o ponto principal. É claro que um quadro com um trânsito político maior seria muito bom, mas a Casa Civil não é só isso”, garante. Para Motta, o ideal é que o braço direito de Dilma seja capaz de conjugar um mínimo de habilidade política com uma acentuada capacidade de gestão. “É uma função estratégica, porque envolve um diálogo político do governo com a sociedade”, explica.
Para o senador Paulo Paim, é fundamental que o novo chefe da Casa Civil seja alguém de “cepa semelhante” à de Dilma Rousseff, até para lidar com a carga de pressão que o posto terá depois dos escândalos envolvendo Erenice Guerra. “É preciso alguém com a mesma coerência que Dilma teve quando esteve no posto, e que tenha uma relação de afinidade com ela, do mesmo modo que a própria Dilma tem com o presidente Lula”.
“O PT está sendo muito profissional desta vez”, diz Rudá Ricci. “Não está deixando vazar nada. Quem está soltando um pouco é o Lula e a própria Dilma”. Rubem Barboza Filho, da UFJF, reforça essa visão. “Há uma nítida preocupação em escolher bem. As últimas escolhas de Dilma foram ruins, em especial a Casa Civil, com a Erenice Guerra. Desta vez, como todos os olhares estão voltados para essa escolha, está se tomando um enorme cuidado em buscar um nome mais testado, sem nenhuma mancha ou suspeita em seu currículo”.
Nomes cogitados
Paulo Paim cita o nome de José Eduardo Cardozo, secretário-geral do PT nacional, como uma figura preparada para assumir a Casa Civil. Para descrevê-lo, o senador gaúcho não economiza adjetivos. “Austero, competente e preparado. Além disso, não quis concorrer (à reeleição na Câmara dos Deputados). É um nome que preenche todos os requisitos, capaz de estabelecer uma relação respeitosa com os poderes e com a sociedade”. Paulo Paim frisou, porém, que se trata de uma opinião pessoal, baseada no que se comenta nos bastidores de Brasília. “A decisão não cabe a mim, e sim à presidenta eleita”, insistiu Paim.
Por sua vez, João Motta comenta sobre nomes como Paulo Bernardo, atual ministro do Planejamento de Lula, e Antônio Palocci (PT-SP), deputado e pessoa bastante próxima do atual presidente. “São nomes que representam bem esse perfil que estamos comentando”, admite João Motta. “Mas há muita especulação nesse momento, não existe nada concreto ainda”, apressa-se em acrescentar.
O sociólogo Rudá Ricci e o cientista social Rubem Barboza Filho não acreditam muito que Bernardo e Palocci possam vir a ocupar a chefia da Casa Civil. “Durante a campanha eleitoral, o Lula claramente soltou um balão de ensaio, citando o nome de Palocci. Mas a reação de José Dirceu (membro da direção do PT e ex-ministro de Lula), aparentemente, não foi boa”, explica. Segundo Rudá Ricci, a possibilidade mais forte é que Antônio Palocci ocupe cargo na Petrobras ou em uma nova empresa, designada para administrar o pré-sal. “O Lula quer Palocci no governo, mas duvido que seja na Casa Civil”, reforça Barboza Filho.
Paulo Bernardo, por sua vez, seria um quadro “muito respeitável”, segundo Ricci. Mas o sociólogo acredita que as circunstâncias dificultam muito sua participação. “Dilma tem falado muito na mulher dele (Gleisi Hoffmann, PT, senadora eleita pelo Paraná), e cogita-se que ela possa ocupar a pasta de Planejamento. É algo coerente com a disposição de Dilma, de preencher 30% dos ministérios com mulheres. Neste panorama, acho muito difícil os dois (ela e Paulo Bernardo) entrarem no governo ao mesmo tempo. Em um momento como esse, com o escândalo da Erenice Guerra e as acusações de nepotismo, seria uma escolha meio maluca até”, afirma.
Rudá Ricci aposta em outro nome comentado nos bastidores de Brasília: Miriam Belchior, secretária executiva do Programa de Aceleração do Desenvolvimento (PAC). “Trata-se de uma política leve e discreta, mas muito segura e de alta capacidade técnica”, argumenta o sociólogo. “Perceba que não se ouve muito o nome dela, mesmo que ela ocupe um cargo de grande importância no governo. Além disso, ela é ex-mulher de Celso Daniel (ex-prefeito de Santo André-SP, assassinado em 2002). Essa é uma morte que ronda até hoje o PT. A nomeação dela para a Casa Civil seria também uma chance de resolver um pouco a relação do PT com esse fantasma”.
O fato de ser uma mulher também conta muito, segundo Ricci. O sociólogo lembra que outros nomes femininos estão surgindo, como a deputada federal Manuela D’Ávila (PCdoB-RS), cogitada para ocupar a secretaria da Mulher, e a própria senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). “É muito importante, para o Brasil e para a esquerda, que esse cargo (Casa Civil) seja preenchido por uma mulher”, afirma.
Seja quem for o escolhido, Rubem Barboza Filho acredita que não haverá apostas nesse momento. “O perfil que se busca é de alguém com capacidade já provada na prática. Não vai haver nenhuma invenção. Mesmo que o governo de Dilma comece com uma paciência inicial da população, uma pessoa fraca na Casa Civil pode criar muitas dificuldades. A liberdade de atuação (do chefe da Casa Civil) será grande, mas não total”, conclui.
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