Por um PAC Rural
José Silva Soares - Agrônomo, extensionista rural, ex-presidente da Emater-MG, deputado federal eleito (PDT-MG)
O Brasil vive uma oportunidade única, dessas que acontecem muito raramente em nosso país. Trata-se da possibilidade de iniciarmos um processo abrangente de mobilidade social, com a elevação da qualidade de vida das pessoas, conforme anunciado pela presidente Dilma Rousseff em seu discurso de posse, de criar no Brasil as condições objetivas para o surgimento de uma classe média forte e empreendedora. As populações rurais precisam estar incluídas nesse processo, superando uma história secular de estar sempre à margem das políticas públicas voltadas para a melhoria das condições sociais e de vida dos brasileiros. E para isso precisamos pensar grande para vencer definitivamente essas históricas diferenças de oportunidades para populações urbanas e rurais. Precisamos de um PAC Rural. Digo com a experiência de quem veio do campo e dirigiu uma equipe exitosa na Extensão Rural de Minas Gerais (Emater), além do exercício de seis anos na presidência da Associação das Empresas de Assistência Técnica e Extensão Rurais (Asbraer), trabalhando com a agricultura familiar de todas as regiões do país. A agricultura familiar é um setor econômico e social de fundamental importância para nosso desenvolvimento. Ela responde, por exemplo, pela produção de cerca de 70% dos alimentos que chegam à nossa mesa, emprega em torno de 70% da mão de obra rural e responde por 38% do valor bruto da produção agrícola brasileira. Mas, apesar dessa força econômica e social da agricultura familiar, tocada basicamente por quem vive nas comunidades rurais, estamos ainda longe de poder falar da existência de uma forte classe média rural, mesmo se levarmos em conta apenas os indicadores de renda familiar. Apenas um dado para exemplificar: em Minas Gerais, que aqui retrata bem o país inteiro, num esforço de criatividade e desafios tecnológicos o governo estadual, por meio da extensão rural e em parceria com a União, levou abastecimento domiciliar de água para 43 mil famílias rurais no semiárido mineiro, nos últimos quatro anos. Entretanto, ainda vivem sem esse direito
elementar de cidadania pelo menos outras 200 mil famílias. Isso, apenas em Minas. E, no Brasil, quantas famílias no meio rural não têm água dentro de casa? Ocorre que praticamente a totalidade dos recursos de investimentos em áreas sociais vão para as cidades, em seus perímetros urbanos. É por isso que em comunidades ou distritos rurais não se vê um conjunto habitacional ou um programa de saneamento básico. É bem verdade que vem aumentando de forma até vigorosa o apoio, o crédito e os recursos para infraestrutura de produção agrícola, com várias políticas públicas nessa direção. Mas, para as questões sociais, o quadro permanece desolador.
Tornamo-nos a segunda potência econômica da América, ultrapassando o Produto Interno Bruto (PIB) do Canadá e do México. Pouco se comenta, contudo, como essas oportunidades do desenvolvimento chegam ao meio rural. Segundo Marcelo Neri (FGV), de 2003 até 2009, 3,7 milhões de pessoas passaram a fazer parte da agora predominante classe C. E diz ainda o economista: “Temos 7,8 milhões de brasileiros do campo que podem virar classe média em breve”. Uma oportunidade de ouro. Contudo, para quem vive da roça, esta oportunidade de modernizar e mudar as condições sociais do campo é ainda distante. Principalmente para os agricultores familiares. Porque uma coisa são números, a outra é o dia a dia das pessoas. Os jovens rurais, por exemplo, ressentem-se de modo contundente da falta dessas condições para uma melhor qualidade de vida e saem do campo em busca de melhores oportunidades. Estudos de universidades federais do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro revelam que grande parte dos estudantes rurais que passam da quarta para a quinta série abandona o meio rural porque aprendem que o lugar em que nasceram é sinônimo de atraso. As desigualdades entre a realidade educacional do campo e a cidade são evidentes. Para estudantes do meio rural, a dificuldade em dar prosseguimento aos estudos é nítida, quando se compara a escolaridade dos jovens brasileiros. Entre a população urbana de
25 a 34 anos, 52,5% têm ensino médio ou superior. No meio rural esse percentual é de apenas 17%. A situação é ainda mais grave quando sabemos que os pequenos municípios, de até 20 mil habitantes e tipicamente rurais, são os que mais sofrem com a penúria orçamentária, diminuindo sua capacidade de investimento. Portanto, é mais que hora de tratar o campo não apenas como espaço para a produção e geração de riquezas, mas, principalmente, como uma geografia humana que não pode mais ficar à margem das políticas públicas de inclusão e mobilidade social. Na Câmara dos Deputados, vamos levar ao governo federal a proposta de um PAC Rural como instrumento de resgate dessa dívida social histórica com as populações rurais. Nessa formulação, construída em debates e convivência com a agricultura familiar nos últimos 20 anos de nossa vida como produtor e extensonista rural, o programa contemplaria investimentos em infraestrutura social, em estradas, armazéns coletivos, melhorias na educação e na saúde, investimentos em tecnologias de comunicação, em estruturas para esportes,
cultura e lazer, em habitação e saneamento básico, entre outros, como condições indispensáveis para a promoção da mobilidade social e econômica no meio rural brasileiro. Finalmente, nossa proposta é de que os recursos para o PAC Rural venham do Fundo Social do Pré-Sal, em percentuais definidos para aplicação exclusivamente em comunidades rurais. Lavrado em lei, para não repetirmos os erros cometidos nos últimos 500 anos de nossa história, quando apenas migalhas de investimentos sociais chegaram às populações rurais, quando chegaram.
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