sábado, 4 de janeiro de 2014

Minha análise sobre o artigo de Singer na Folha de hoje

Reproduzo, abaixo, o artigo de André Singer publicado na Folha de hoje.
A tese de Singer é clara:
1) O lulismo vive um impasse (assim como o Brasil, na visão do autor);
2) Para sustentar o crescimento econômico ascendente, Dilma se chocou com os interesses do mercado financeiro ao reduzir as taxas de juros;
3) Logo depois, o governo teria jogado a toalha e aumentado novamente a taxa de juros. Mas o "mercado" já havia taxado o governo de intervencionista e não lhe deu crédito algum pela mudança;
4) Finalmente, como o lulismo não é mobilizador e sua base social é muito despolitizada, o lulismo não consegue criar uma base política para quebrar este círculo vicioso político.

Sociólogo não faz mera reportagem do fato. Mesmo porque, todos nós somos formados para desconfiar deste conceito puro e cristalino do fato social (tanto na versão de Comte, quanto na de Durkheim).
Assim, Singer não terá apenas feito uma apresentação límpida e desinteressada dos fatos.
O que transparece neste artigo? Que o lulismo faz tudo para agradar a todos e o mercado financeiro, sedento, sempre lhe passa o pé. O autor, finalmente, quase que solicita que as forças populares se alinhem em favor de Dilma. Parece um esboço de campanha eleitoral.
O fato é simples: esta história nós já conhecemos no Brasil. Já vimos com Getúlio e com João Goulart. A conciliação de interesses de classe começa bem e termina de maneira desastrosa. Justamente porque só o governo se beneficia com a conciliação. Para o "mercado", ambiente de paz (sem ocupações de terra e greves ferozes) é salutar. E que fique por aí. Obviamente que o passo seguinte é avançar o sinal, já que a tarefa de casa estará feita.
Do ponto de vista das classes menos abastadas, a cooptação das instâncias de mediação política gera sua desmobilização constante e um movimento errático em relação ao apoio político. Poderá votar no lulismo ou numa terceira via mais vistosa e promissora, assim como pode apoiar as manifestações de rua ou apoiar a seleção brasileira de futebol. Tudo como Marx desenhou sobre o movimento do lumpensinato. Mas não estou citando apenas o lumpensinato. Estou citando toda base social e eleitoral do lulismo. Ela está frouxa e sem rumo, ao sabor daquele que dá mais.
A sorte do lulismo é que ninguém está dando mais que seus governos.
Mas o caminho da conciliação já fez vários mártires da semi-esquerda em nosso país. Tem gente que gosta do risco.

ANDRÉ SINGER
Armadilha lulista
Uma leitura atenta das respostas que o economista Luiz Gonzaga Belluzzo forneceu a Eleonora de Lucena na entrevista publicada no último domingo pela Folha, permite perceber, sobretudo na versão integral (disponível na internet), de maneira cristalina o impasse brasileiro contemporâneo. Se feitas as devidas pontes entre o quadro econômico ali analisado e a situação política, tem-se um retrato agudo do momento atual.
O professor da Unicamp mostra que o governo Dilma foi atingido em cheio pela segunda etapa da crise capitalista. Enquanto Lula viu-se beneficiado pelas "benesses do ciclo de commodities", a presidente pegou uma longa fase de depressão da economia mundial.
Para sustentar o dinamismo do Brasil em um contexto de desaceleração global seria necessário ter uma indústria forte. Mas, para tanto, o país precisava ter desvalorizado bastante o real, como já vinha alertando há alguns anos o ex-ministro Bresser-Pereira.
A presidente teve a coragem de enveredar na direção necessária, realizando significativa redução da taxa de juros contra o desejo do mercado financeiro. Ao diminuir o ganho rentista, reduz-se a atratividade do Brasil como plataforma de valorização do capital especulativo internacional e, dessa forma, ajuda-se a controlar o sobrepreço da moeda.
Ato contínuo, a equipe econômica e o Banco Central, orientados por Dilma, provocaram uma mididesvalorização do real, além de reforçar as medidas voltadas para restringir a liberdade de entrada e saída dos especuladores. Em outras palavras, mesmo que, como aponta Bresser-Pereira, não tenham sido na proporção devida, foram dados passos ousados para romper as amarras que impediam o Brasil de retomar o crescimento.
De repente, no final de 2012, começa a haver uma reversão. O BC anuncia que voltará a aumentar os juros. O que houve? O governo sentiu que não tinha força para prosseguir no caminho iniciado. Ao contrário de investir, os empresários se afastaram de Dilma, por considerá-la intervencionista. O eleitorado lulista, por sua vez, "é o pessoal mais desinformado sobre as razões dos problemas, que foi submetido a um processo de obscurecimento durante séculos", diz Belluzzo.
Resultado: em lugar de 2013 ser o ano da retomada que Dilma deve ter planejado, foi caracterizado pela reversão sistemática do que fora plantado no período precedente. A armadilha está em que, como o lulismo não é mobilizador, não pode politizar as questões de fundo, autoimpedindo-se de construir uma base social suficiente para sustentar a ruptura necessária. De onde, então, virá a energia capaz de quebrar as 11 varas da camisa que, segundo Belluzzo, paralisa a nação?

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