domingo, 24 de agosto de 2008

Folha de SPaulo errou feio neste sábado


Na edição deste sábado, entre as manchetes da Folha, aparece uma foto, cuja legenda leva o título de “Pé na Tábua”. O texto que acompanha a foto afirma que menino de 11 anos acusado de furtar e dirigir um carro não pode ser penalizado por ter menos de 12 anos. O problema, no caso, pode ser assim resumido:
a) Pelo Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), não há punição até os 18 anos. O que há é medida sócio-educativa, justamente porque não existiria crime cometido por adolescentes, mas infrações;
b) Trata-se de um conceito jurídico em que se assume as fases de desenvolvimento humano, dividindo-as em infância, adolescência, adulto jovem e adulto. Esta divisão está embasada em todas teorias da psicologia (ver o livro Desenvolvimento Humano, organizado por Papalaia, Editora Artes Médicas, entre os vários compêndios técnicos que embasam esta concepção), biologia (ver estudos de Jean Piaget) e neurologia dos últimos 80 anos;
c) No caso, a adolescência é compreendida como período de “moratória”, de quase amadurecimento para a responsabilização da vida adulta. Ele começa ao redor dos 12 anos de idade. O ECA adota esta data-limite. Antes, considera-se o indivíduo como criança;
d) Criança, no caso, é o indivíduo que não possui ainda autonomia, se constituindo em ser heterônomo, que não consegue se auto-governar (dependente de adultos que seriam responsáveis por ele: ver estudos do norte-americano Lawrence Kohlberg, sobre desenvolvimento moral na infância e adolescência, muito empregado nos estudos jurídicos, inclusive do Brasil);
e) Daí, uma criança abaixo de 12 anos ser inimputável e não responsável por seus atos. Quem seria, no caso da notícia da Folha o responsável? Seus pais ou responsáveis legais desta criança;
f) Esta concepção imputa aos adultos a responsabilidade pela construção da noção de regra e justiça;
g) Vários países que imputavam à criança a responsabilidade criminal, como é o caso da Inglaterra, reviram este equívoco de tipo populista, não embasado em estudos científicos. Um livro interessante que relata o caso da menina de 11 anos Mary Bell (Gritos no Vazio, Editora Autêntica) é uma boa consulta para entender o quanto este assunto não pode ser levado ao sabor da emoção. Trata-se da construção da noção de justiça e de educação para a justiça de uma nação.

Considero que a legenda da Folha de S.Paulo foi tendenciosa e joga água no moinho populista e passional de tentar criminalizar crianças, como se este fosse o ato e política correta para educar crianças a compreender seus limites. Uma postura sem qualquer fundamento. Um discurso fácil, enfim. As crianças não compreendem o significado das regras de imediato. Aprendem pelas falas e atos dos adultos que lhe conferem segurança. Somente a partir dos 12 anos começa a construir a noção de justiça, ou avaliação da regra mais justa. É um processo de amadurecimento moral, intelectual e afetivo do ser humano, estudado em todo mundo.

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