domingo, 23 de maio de 2010

Artigo da semana: o Cyber Eleitor

Cyber Eleitor
Por RUDÁ RICCI

1. A Guerra política já é virtual
Fiquei motivado a escrever a partir da leitura de artigo escrito por Edson Fontes sobre eleições e o cyber eleitor. Edson sugere que este ano marca a entrada da internet como elemento de peso nas campanhas eleitorais brasileiras, tal como teria ocorrido nas eleições de Barack Obama. Sugere, ainda, que facilitará a vida de candidatos com poucos recursos financeiros, porque possibilita a comunicação direta com o eleitor. E, daí, destaca o papel do cyber eleitor, aquele que lê de tudo. Edson se pergunta se este eleitor informado em tempo real estará realmente envolvido emocionalmente com o candidato que lhe contata via email, twitter ou blogs. Esta questão me fez lembrar a reflexão sobre o papel da televisão como fator alienante. Passados tantos anos, já sabemos que a televisão pode deixar o cidadão passivo, mas não alienado. Assistimos a programas de televisão e continuamos críticos, desaprovando uma reportagem ou o erro de um juiz de futebol. O problema é que não saímos da poltrona ou sofá, nossa “Ágora” contemporânea. Minha dúvida, por similaridade, é: a campanha virtual fará do internauta um militante virtual ou o cyber eleitor é, por natureza, passivo?

Nas eleições municipais de 2008, muito se falou da campanha virtual de Gabeira, no Rio de Janeiro. No ano passado, Gabeira chegou a defender abertamente (pelo twitter) a desobediência às regras que poderiam restringir a campanha eleitoral na internet. Chegou a citar Thoreau e pregou a desobediência civil. O deputado do Rio de Janeiro tinha motivos para defender este filão, composto por blogs, radisweb, WebTvs, twitter e toda gama de redes sociais virtuais. Em 2008, criou conferências via Orkut e sua campanha foi muitas vezes comparada à de Howard Dean (do Partido Democrata dos EUA) e Ron Paul (do Partido Republicano), que mobilizaram eletronicamente a sua base eleitoral. A proeza da inovação de Gabeira foi creditada à Lula Vieira que chegou a comparar a propaganda eleitoral à luta de boxe. Vieira explorou o perfil contemporâneo, jovem e pouco convencional. Durante a campanha chegou a utilização do Google Maps, onde mostrava para os internautas as comunidades do Rio dominadas por traficantes e milícias, além de mapear bairros com seus eleitores e simpatizantes. Estava se espelhando na campanha de Obama, onde os eleitores eram estimulados a fazer campanha na vizinhança, indicando no mapa virtual os simpatizantes de determinado território.

Uma nova possibilidade aberta é a WebTV. A Google TV, recém lançada, integra smartphones e Android Marketplace. Pode ser acionada com reconhecimento de voz, articulando Pandora, Twitter, Facebook e demais aplicativos Android.

Voltando ao tema central, a campanha virtual de Gabeira foi a que mais chamou atenção em 2008. Mas em outras capitais ocorreu o mesmo. Em Belo Horizonte, houve uso e abuso de fake, spam e email denúncia, além de criação de comunidades virtuais e envio de email marketing. Falava-se em “rastro da onça", onde se planta uma notícia, quase sempre inverídica, sobre adversários. Afirma-se que a eleição de Márcio Lacerda teve na internet um instrumento de peso, tendo o deputado Virgílio Guimarães (PT) como coordenador deste feito.
A Agência Estado procurou explorar esta novidade a partir de uma breve matéria cujo título é “Uso da internet ainda é desafio para partidos”. A matéria destaca que PT e PSDB apostam nos militantes virtuais e já travam guerra virtual. Para os dois partidos, ainda segundo o artigo do Estadão, o papel da internet ainda não será decisivo nesta campanha de 2010, mas pode servir como aquecimento dos militantes e simpatizantes, armando-os de informações e contra-informações. Os dois principais candidatos à Presidência da República já possuem núcleos de campanha digital. O PSDB já possuiria 10 mil militantes virtuais e o PT paulista já teria mil militantes atuando diariamente na rede. O medo inicial das campanhas era o descontrole na linguagem e conteúdo de blogs. Daí, tucanos centralizaram as ações a partir do comando do jornalista Marcio Aith. No PT, a coordenação está nas mãos de Marcelo Branco, seguido de perto por Rui Falcão, vice-presidente do PT Nacional e também jornalista. Ben Self, da Blue State Digital, um dos estrategistas da campanha virtual de Obama, foi contratado como conselheiro por João Santana, marketeiro do PT.

Ainda objeto de muita dúvida, a estratégia, além de mobilizar simpatizantes e militantes, tem como objetivo aproximar-se de eleitores não-filiados ou alinhados. Mas há temor generalizado sobre um possível bate-boca na rede, algo que já ocorre no twitter e na guerra entre blogs.
Outro temor é a propaganda negativa de adversários, transformando um boato em verdade, algo que sempre existiu em política provinciana, mas que é potencializada com a comunidade virtual.

2. O Potencial
Recentemente, a comScore, empresa que mede audiência na internet em 40 países informou que 24% dos domicílios brasileiros possuem acesso à internet e que somente 2% dos internautas acessam conteúdo político. Nos EUA são quase 10%, para efeito de comparação. Mesmo assim, o nordeste brasileiro é a região onde existe maior percentual de internautas integrando redes sociais, principalmente nos domicílios com renda mensal entre 1 a 2 salários mínimos (crescimento anual de 69%). Neste ano, a comScore iniciou operações no Brasil após adquirir a chilena Certifica, tendo na Media Metrix 360 sua principal ferramenta de análise de tráfego. Em setembro de 2009, a empresa apontou que os serviços do Google detinham 30% do tempo médio navegado pelo internauta brasileiro. Goggle e Microsoft concentravam 60% do tempo médio utilizado. São 26,6 milhões de usuários brasileiros do Google, 25,3 milhões do UOL e 16,8 milhões do Terra.

Segundo o IBOPE Nielsen Online, o número de brasileiros que acessaram a internet em casa ou trabalho em janeiro deste ano chegou a 36,8 milhões (quase 1% a mais que o registrado em dezembro de 2009). Se aplicativos, como comunicadores (MSN Live Messenger) não forem considerados, o tempo gasto online chegou a 45 horas e 43 minutos no mês, crescimento de 2,3% em relação ao mês anterior. Ainda segundo a mesma fonte, se somados os ambientes públicos, como bibliotecas e lan houses, a internet teve como público 66,3 milhões de brasileiros no primeiro mês de 2010.
A categoria automotiva foi o destaque dos acessos no início do ano (8,4 milhões de internautas) seguido por turismo.
A audiência em redes sociais, como blogs, bate-papos, fóruns e outros canais de relacionamento, alcançou em fevereiro 31,7 milhões de pessoas no Brasil, o que representa 86,3% dos usuários ativos, segundo dados do Ibope Nielsen Online. Trata-se do maior índice entre os dez países em que a pesquisa é realizada. O tempo médio por pessoa nessa subcategoria de conteúdo em fevereiro foi de 4h28.
O relatório do Ibope Nielsen Online também aponta que a categoria Buscadores, Portais e Comunidades continua a ser a de maior audiência no País. Ela foi responsável, no período, por 34,7 milhões de usuários únicos, o que equivale a 94,5% dos 36,7 milhões de usuários ativos do mês.
Enfim, este é um terreno a ser explorado. Mas fica a dúvida se o ataque deste público virtual pelos partidos conseguirá criar um novo curral eleitoral. As redes sociais virtuais são móveis e formam efetivamente comunidades afetivas ou com interesses muito definidos. Trabalhar politicamente tais comunidades significa uma atuação permanente e o uso de linguagens e temas pulverizados e diversos. Arriscaria afirmar que uma campanha virtual é mais movediça que as estruturas partidárias existentes que, em minha opinião, são pretéritas, típicas do século 19 e início do século 20.
Assim, o ingresso dos partidos nesta seara pode alterar a lógica partidária. Algo como um feitiço que se vira contra o feiticeiro.

Um comentário:

Neide Cruz disse...

Acredito que o uso do twitter por um político é uma coisa e a campanha é outra. Sinto que falta um planejamento das redes sociais pelos Partidos Políticos. O que ocorreu com Obama foi algo profissional e planejado. Os eleitores podiam participar, inclusive com recursos financeiros, sabiam onde seria usado e qual a finalidade. Recebiam respostas e a prestação de contas (não só do $$) de cada passo da campanha. No Brasil não se percebe uma articulação verdadeira. Uma coisa é um candidato tuitar e outra é a campanha pelas redes sociais. Isso não parece estar interessando aos Partidos, ao menos até agora: o respeito pelo eleitor.