sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Minha entrevista para a revista Exibir Gospel


Fui procurado pela revista Exibir Gospel para uma entrevista a respeito do voto e participação política dos evangélicos. Fiquei realmente honrado de poder abrir um diálogo a respeito. Abaixo, minha entrevista:

1) como vê o crescimento da bancada evangélica no Congresso Nacional? Isso é prova do crescimento da religião evangélica?
Resposta: Sim e não. É evidente que a religião evangélica cresce no Brasil. Já são, possivelmente, mais de 30 milhões de brasileiros. Mas lembremos que os protestantes não formam um bloco coeso, muito menos em termos políticos. As igrejas tradicionais (batistas, luteranos, metodistas e anglicanos) não são tão afeitas à organização político-partidiária como os pentecostais e neo-pentecostais. Aqui, o problema do apóstolo Paulo se repete: como unir, preservando a diferença?

2) qual é a força que a religião tem na política e até que ponto é saudável essa relação, visto vivermos em um Estado laico?
R: A aproximação entre Estado e Religião nunca é saudável. Nunca. Onde ocorreu isto chegamos ao fascismo, ao totalitarismo. São esferas distintas da vida humana. O Estado laico garante que todas religiões professem sua fé. Um Estado que professa uma religião intimida as outras religiões. Imagine se o Estado brasileiro se declarasse católico ou budista. Os evangélicos seriam impedidos de expressarem sua agenda política. A situação é ainda mais grave em função do apelo da fé. Fé não se funda na razão. É uma ligação, uma relação e crença pessoal, é transmaterialização do mundo. A união de Estado com religião é caminho farto para os falsos profetas. O que não impede de, como cidadãos, cristãos apresentarem uma agenda para o país e tentarem democraticamente convencerem a maioria dos brasileiros. O problema é quando caem na tentação de tentarem impor esta agenda, como se fosse uma guerra santa.

3) qual é a melhor forma para um político evangélico governar? Ele deve se apoiar nos princípios da sua fé ou deve se abstrair da religião para legislar para todos, independentemente de credo?
R: Deve seguir os princípios da fé, a noção básica que somos todos irmãos de um mesmo Pai e, portanto, que somos obrigados a ser tolerantes, respeitar as diferenças. A partir daí, deve se abstrair de seguir uma agenda que coloque em risco a pluralidade, que é garantia fundamental da democracia. Por exemplo: no final do primeiro turno das eleições presidenciais, muitos líderes religiosos pregaram contra e não a favor. Este deslize é um equívoco perigoso. Divide os brasileiros. Não é este o princípio básico da religião. Religião não se alimenta do ódio, mas da fé, da compreensão. Um político precisa ter equilíbrio (ouvir todos, fugir do extremismo e do isolamento ou elitismo) e senso de responsabilidade (nem sempre fazer o que é sua única vontade). Caso contrário, torna-se um mero delegado, corporativo, que defende apenas o grupo que o sustenta. Mas o fundamental no nosso país continental é promovermos o desenvolvimento de todos. Há políticos que representam apenas os metalúrgicos, outros que defendem os interesses dos ruralistas, e assim por diante. Mas muito mais importantes que eles são os políticos que procuram defender os brasileiros como um todo. Estes pensam mais alto.

4) depois de Marina Silva ter conquistado quase 20 milhões de votos, os candidatos do segundo turno não medem esforços para conseguir o apoio dos evangélicos. Como você vê essa estratégia?
R: Uma tristeza. Porque todos sabemos o que pensam Serra e Dilma. Os dois são extremamente iguais neste ponto. Fernando Henrique Cardoso defendeu recentemente a descriminalização da maconha em revista de circulação nacional. Alguém tem dúvidas sobre o que Dilma e Serra pensam a respeito do aborto, casamento entre homossexuais? Não vejo problema algum em defenderem suas idéias. O problema é se tornarem amigos de uma religião (ou de uma agenda) do dia para a noite. O correto seria pedirem o voto dos evangélicos e católicos. E até negociarem abertamente. Mas deixando claro que não pensam igual, embora cedam. E ponto. Não fingirem que são cristãos praticantes, o que é fácil de comprovar que nunca foram. Acho uma ofensa aos cristãos, à biografia deles e à democracia brasileira. Não precisamos votar exclusivamente em cristãos, mas em candidatos que confiamos e quem estão mais próximos do que pensamos. Só isto. Caso contrário, nos arriscamos a cair em negociatas ou no totalitarismo (onde só vale quem pensa exatamente como nós).

5) hoje em dia, declarar-se evangélico pode ser prejudicial para um político?
R: Mais ou menos. Não é para o público evangélico. Mas para quem não é, há grande confusão, porque o Brasil não conhece claramente as várias igrejas, os fundamentos teológicos. Muitas vezes, pastores e bispos com maior exposição pública acabam dando a impressão que todos protestantes pensam exatamente como eles. Eu, pessoalmente, acho que a religião não deveria ser utilizada como imã para o voto. Como já disse, é uma questão pessoal. Mais ainda para quem é protestante, já que Lutero sempre disse que a relação com Deus se dá diretamente e não através de mediadores. Ora, qual o motivo para um candidato se dizer de uma ou outra religião? Para conseguir votos dos fiéis da mesma igreja? Para afirmar que é melhor que outros? Não estaria utilizando o nome de Deus em vão? Não estaria utilizando a fé em proveito próprio? Não estaria promovendo a divisão entre religiões? Este é um tema muito delicado. E não estamos dando a importância que ele merece.

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