Decidi alterar as postagens neste blog. A partir de agora, posto comentários sem grande profundidade no Facebook, diariamente. Mais fácil, porque posso fazer através do celular. Estou dedicando a este blog textos mais analíticos ou informações mais complexas (artigos ou reportagens mais extensas). Assim, consigo manter regularidade e administrar as duas redes a partir de suas características.
Encontro vocês aqui e lá no Facebook.
quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014
quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014
UMA LIÇÃO SOBRE EDUCAÇÃO
Em 1982, Carlos Rodrigues Brandão publicou o livro A questão política da Educação Popular. Inovou logo no prefácio. Ao invés de um texto empolado, reproduziu uma longa entrevista que havia feito com Antônio Cícero de Sousa, conhecido como Ciço, lavrador de sítio na estrada entre Andradas e Caldas, no sul de Minas Gerais. A clareza de Ciço é desconcertante. Sem mais delongas, decidi reproduzir um excerto do prefácio aqui. Acredito que possa contribuir nas discussões sobre o tema.
Vai lá, Ciço:
... Agora, o senhor chega e pergunta: “Ciço, o que que é educação?” Tá certo. Tá bom. O que que eu penso, eu digo. Então veja, o senhor fala: “Educação”; daí eu falo: “educação”. A palavra é a mesma, não é? A pronúncia, eu quero dizer. É uma só: “Educação”. Mas então eu pergunto pro senhor: É a mesma coisa? É do mesmo que a gente fala quando diz essa palavra?” Aí eu digo: “Não”. Eu digo pro senhor desse jeito: “Não , não é”. Eu penso que não. Educação... quando o senhor chega e diz “educação”, vem do seu mundo, o mesmo, um outro. Quando eu sou quem fala vem dum outro lugar, de um outro mundo. Vem dum fundo de oco que é o lugar da vida dum pobre, como tem gente que diz. Comparação, no seu essa palavra vem junto com quê? Com escola, não vem? Com aquele professor fino, de roupa boa, estudado; livro novo, bom, caderno, caneta, tudo muito separado, cada coisa do seu jeito, como deve ser. Um estudo que cresce e que vai muito longe de um saberzinho só de alfabeto, uma conta aqui e outra ali. Do seu mundo vem um estudo de escola que muda gente em doutor. É fato? Penso que é, mas eu penso de longe, porque eu nunca vi isso por aqui. Então, quando o senhor vem e fala a pronúncia “educação”, na sua educação tem disso. Quando o senhor fala a palavra conforme eu sei pronunciar também, ela vem misturada no pensamento com isso tudo; recursos que no seu mundo tem. Uma coisa assim como aquilo que a gente conversava outro dia, lembra? Dos evangelhos: “Semente que caiu na terra boa e deu fruto bom”. (...)Quando eu falo o pensamento vem dum outro mundo. Um que pode até ser vizinho do seu, vizinho assim, de confrontante, mas não é o mesmo. A escolinha cai-não-cai ali num canto da roça, a professorinha dali mesmo, os recursos tudo como é o resto da regra de pobre. Estudo? Um ano, dois nem três. Comigo não foi nem três. Então eu digo “educação” e penso “enxada”, o que foi pra mim.
Porque é assim desse jeito que eu queria explicar pro senhor. Tem uma educação que vira o destino do homem, não vira? Ele entra ali com um destino e sai com outro. Quem fez? Estudo, foi estudo regular: um saber completo. Ele entra dum tamanho e sai do outro. Parece que essa educação que foi a sua tem uma força que tá nela e não tá. Como é que um menino como eu fui mudá num doutor, num professor, num sujeito de muita valia? Agora, se eu quero lembrar da minha: “enxada”. Se eu quero lembrar: “trabalho”. E eu hoje só dou conta de um lembrarzinho: a escolinha, um ano, dois, um caderninho, um livro, cartilha? Eu nem sei, eu não lembro. Aquilo de um bê-a-bá, de uma alfabetozinho. Deu pra aprender? Não deu. Deu pra saber escrever um nome, pra ler uma letrinha, outra. Foi só. (...)
O senhor faz pergunta com um jeito de quem sabe já a resposta. Mas eu explico assim. A educação que chega pro senhor é a sua, da sua gente, é pros usos do seu mundo. Agora, a minha educação é a sua. Ela tem o saber de sua gente e ela serve pra que mundo? Não é assim mesmo? A professora da escola dos seus meninos pode até ser uma vizinha sua, uma parente, até uma irmã, não pode? Agora, e a dos meus meninos? Porque mesmo nessas escolinhas de roça, de beira de caminho, conforme é a deles, mesmo quando a professorinha é uma gente daqui, o saber dela, o saberzinho dos meninos, não é. Os livros, eu digo, as idéias que tem ali. Menino aqui aprende na ilusão dos pais; aquele ilusão de mudar com estudo, um dia. Mas acaba saindo como eu, como tantos, com umas continhas, uma leitura. Isso ninguém não vai dizer que não é bom, vai? Mas pra nós é uma coisa que ajuda e não desenvolve. Então, “educação”. É por isso que eu lhe digo que a sua é a sua e a minha é a sua. Só que a sua lhe fez. E a minha? Que a gente aprende mesmo, pros usos da roça, é na roça. É ali mesmo: um filho com o pai, uma filha com a mãe, com uma avó. Os meninos vendo os mais velhos trabalhando. Inda ontem o senhor me perguntava da Folia de Santos Reis que a gente vimos em Caldas: “Ciço, como é que um menino aprende o cantorio? As respostas?” Pois o senhor mesmo viu o costume. Eu precisei lhe ensinar? Menino tão ali, vai vendo um, outro, acompanha o pai, um tio. Olha, aprende. Tem inclinação prum cantorio? Prum instrumento? Canta, tá aprendendo; pega, toca, tá aprendendo. Toca uma caixa (tambor da Folia de Reis), tá aprendendo a caixa; faz um tipe (tipo de voz do cantorio), tá aprendendo cantar. Vai assim, no ato, no seguir do acontecido. Agora, nisso tudo tem uma educação dentro, não tem? Pode não ter um estudo. Um tipo dum estudo pode ser que não tenha. Mas se ele não sabia e ficou sabendo é porque no acontecido tinha uma lição escondida. Não é uma escola; não tem um professor assim na frente, com o nome “professor”. Não tem... Você vai juntando, vai juntando e no fim dá o saber do roceiro, que é um tudo que a gente precisa pra viver a vida conforme Deus é servido. (...) Agora, o senhor chega e diz que até podia ser diferente, não é assim? Que não é só pra ensinar aquele ensininho apressado, pra ver se velho aprende o que menino não aprendeu. Então que podia ser um tipo duma educação até fora da escola, sala. Que fosse assim dum jeito misturado com o-de-todo-dia da vida da gente daqui. Que podia ser um modo desses de juntar saber com saber e clarear os assuntos que a gente sente, mas não sabe. Isso? (...)Exemplo assim, como a gente falava, de começar pelas coisas que o povo já sabe, já faz de seu: as idéias, os assuntos.Eu entendo pouco de tudo isso, não aprendi, mas ponho fé e vou lhe dizer mais, professor – como é que eu devo chamar o senhor? – eu penso que muita gente vinha ajudar, desde que a gente tivesse como acreditar que era uma coisa que tivesse valia mesmo. Uma que a gente junto pudesse fazer e tirar todo o proveito. Pra toda gente saber de novo o que já sabe, mas pensa que não. Parece que nisso tem se segredo que a escola não conhece.
Vai lá, Ciço:
... Agora, o senhor chega e pergunta: “Ciço, o que que é educação?” Tá certo. Tá bom. O que que eu penso, eu digo. Então veja, o senhor fala: “Educação”; daí eu falo: “educação”. A palavra é a mesma, não é? A pronúncia, eu quero dizer. É uma só: “Educação”. Mas então eu pergunto pro senhor: É a mesma coisa? É do mesmo que a gente fala quando diz essa palavra?” Aí eu digo: “Não”. Eu digo pro senhor desse jeito: “Não , não é”. Eu penso que não. Educação... quando o senhor chega e diz “educação”, vem do seu mundo, o mesmo, um outro. Quando eu sou quem fala vem dum outro lugar, de um outro mundo. Vem dum fundo de oco que é o lugar da vida dum pobre, como tem gente que diz. Comparação, no seu essa palavra vem junto com quê? Com escola, não vem? Com aquele professor fino, de roupa boa, estudado; livro novo, bom, caderno, caneta, tudo muito separado, cada coisa do seu jeito, como deve ser. Um estudo que cresce e que vai muito longe de um saberzinho só de alfabeto, uma conta aqui e outra ali. Do seu mundo vem um estudo de escola que muda gente em doutor. É fato? Penso que é, mas eu penso de longe, porque eu nunca vi isso por aqui. Então, quando o senhor vem e fala a pronúncia “educação”, na sua educação tem disso. Quando o senhor fala a palavra conforme eu sei pronunciar também, ela vem misturada no pensamento com isso tudo; recursos que no seu mundo tem. Uma coisa assim como aquilo que a gente conversava outro dia, lembra? Dos evangelhos: “Semente que caiu na terra boa e deu fruto bom”. (...)Quando eu falo o pensamento vem dum outro mundo. Um que pode até ser vizinho do seu, vizinho assim, de confrontante, mas não é o mesmo. A escolinha cai-não-cai ali num canto da roça, a professorinha dali mesmo, os recursos tudo como é o resto da regra de pobre. Estudo? Um ano, dois nem três. Comigo não foi nem três. Então eu digo “educação” e penso “enxada”, o que foi pra mim.
Porque é assim desse jeito que eu queria explicar pro senhor. Tem uma educação que vira o destino do homem, não vira? Ele entra ali com um destino e sai com outro. Quem fez? Estudo, foi estudo regular: um saber completo. Ele entra dum tamanho e sai do outro. Parece que essa educação que foi a sua tem uma força que tá nela e não tá. Como é que um menino como eu fui mudá num doutor, num professor, num sujeito de muita valia? Agora, se eu quero lembrar da minha: “enxada”. Se eu quero lembrar: “trabalho”. E eu hoje só dou conta de um lembrarzinho: a escolinha, um ano, dois, um caderninho, um livro, cartilha? Eu nem sei, eu não lembro. Aquilo de um bê-a-bá, de uma alfabetozinho. Deu pra aprender? Não deu. Deu pra saber escrever um nome, pra ler uma letrinha, outra. Foi só. (...)
O senhor faz pergunta com um jeito de quem sabe já a resposta. Mas eu explico assim. A educação que chega pro senhor é a sua, da sua gente, é pros usos do seu mundo. Agora, a minha educação é a sua. Ela tem o saber de sua gente e ela serve pra que mundo? Não é assim mesmo? A professora da escola dos seus meninos pode até ser uma vizinha sua, uma parente, até uma irmã, não pode? Agora, e a dos meus meninos? Porque mesmo nessas escolinhas de roça, de beira de caminho, conforme é a deles, mesmo quando a professorinha é uma gente daqui, o saber dela, o saberzinho dos meninos, não é. Os livros, eu digo, as idéias que tem ali. Menino aqui aprende na ilusão dos pais; aquele ilusão de mudar com estudo, um dia. Mas acaba saindo como eu, como tantos, com umas continhas, uma leitura. Isso ninguém não vai dizer que não é bom, vai? Mas pra nós é uma coisa que ajuda e não desenvolve. Então, “educação”. É por isso que eu lhe digo que a sua é a sua e a minha é a sua. Só que a sua lhe fez. E a minha? Que a gente aprende mesmo, pros usos da roça, é na roça. É ali mesmo: um filho com o pai, uma filha com a mãe, com uma avó. Os meninos vendo os mais velhos trabalhando. Inda ontem o senhor me perguntava da Folia de Santos Reis que a gente vimos em Caldas: “Ciço, como é que um menino aprende o cantorio? As respostas?” Pois o senhor mesmo viu o costume. Eu precisei lhe ensinar? Menino tão ali, vai vendo um, outro, acompanha o pai, um tio. Olha, aprende. Tem inclinação prum cantorio? Prum instrumento? Canta, tá aprendendo; pega, toca, tá aprendendo. Toca uma caixa (tambor da Folia de Reis), tá aprendendo a caixa; faz um tipe (tipo de voz do cantorio), tá aprendendo cantar. Vai assim, no ato, no seguir do acontecido. Agora, nisso tudo tem uma educação dentro, não tem? Pode não ter um estudo. Um tipo dum estudo pode ser que não tenha. Mas se ele não sabia e ficou sabendo é porque no acontecido tinha uma lição escondida. Não é uma escola; não tem um professor assim na frente, com o nome “professor”. Não tem... Você vai juntando, vai juntando e no fim dá o saber do roceiro, que é um tudo que a gente precisa pra viver a vida conforme Deus é servido. (...) Agora, o senhor chega e diz que até podia ser diferente, não é assim? Que não é só pra ensinar aquele ensininho apressado, pra ver se velho aprende o que menino não aprendeu. Então que podia ser um tipo duma educação até fora da escola, sala. Que fosse assim dum jeito misturado com o-de-todo-dia da vida da gente daqui. Que podia ser um modo desses de juntar saber com saber e clarear os assuntos que a gente sente, mas não sabe. Isso? (...)Exemplo assim, como a gente falava, de começar pelas coisas que o povo já sabe, já faz de seu: as idéias, os assuntos.Eu entendo pouco de tudo isso, não aprendi, mas ponho fé e vou lhe dizer mais, professor – como é que eu devo chamar o senhor? – eu penso que muita gente vinha ajudar, desde que a gente tivesse como acreditar que era uma coisa que tivesse valia mesmo. Uma que a gente junto pudesse fazer e tirar todo o proveito. Pra toda gente saber de novo o que já sabe, mas pensa que não. Parece que nisso tem se segredo que a escola não conhece.
domingo, 23 de fevereiro de 2014
Depoimento de um manifestante preso, ontem, em São Paulo
Depoimento de Vinicius Moraes, do PSOL, que estava na
manifestação de Contra a Copa, em São Paulo, no dia 22/02/2014, detido pela PM
paulista (recebi neste momento de uma amiga, via Facebook):
COPA, PM E DETENÇÃO
Ontem, em SP, ocorreu o segundo ato de contestação à Copa do
Mundo no Brasil. Protesto muito justo, afinal se gasta montanhas com obras
faraônicas sem retorno social, enquanto os direitos sociais são parcos.
A manifestação contou com um contingente enorme de
policiais, incluindo a “tropa do braço”. Saímos pacificamente da Praça da
República em direção da Praça Roosevelt, viramos à esquerda na Consolação,
sentido o Theatro Municipal. Quando chegamos à altura do metrô Anhangabaú,
ainda não sei explicar o porquê, começou um empurra-empurra mais ou menos no
meio da passeata. Eu e outros grandes amigos estávamos à frente, quando ao
percebermos que a confusão iria se alastrar rapidamente. Não fomos rápidos o
suficiente. Ao corrermos, entramos em um corredor polonês sem saída formado por
duas colunas de policiais militares, que de modo mais do que violento,
comprimiram dezenas de manifestantes (lembremos: estes manifestantes sequer
souberam a razão do conflito) à base de cacetadas, escudadas e spray de
pimenta. Um verdadeiro show de democracia e civilização.
Sob berros ameaçadores, fomos obrigados a sentar no meio da
Xavier de Toledo, um em cima dos outros devido à falta de espaço físico. Quem
levantasse, era lembrado de que deveria ficar sentado com sutis cacetadas, que
foi o meu e o caso de muitos outros. Questionar? Fora de cogitação. Um
policial, no auge da sinceridade, bradou “aqui não há democracia por que vocês
estão detidos”. Claro. Democracia e detenção são termos necessariamente
opostos, pelo na visão da Polícia Militar de São Paulo.
Ficamos ali sentados por duas horas e pouco, de baixo de
chuva. Alguns foram liberados, em especial os que não pareciam “ameaçadores”.
Um oficial falou com todas as letras: “quem tiver referência a movimento
social, será levado para a DP”.
Imagino que o tal oficial levou bem o manual das forças
armadas, que demonstra como lidar com as ‘forças oponentes do Estado’. Médici
deu três mortais para trás de felicidade quando ouviu o policial bem treinado.
Durante todo o tempo na rua, não fomos informados do que se passava, quanto
tempo ficaríamos ali e qual seria o procedimento. Pode o Estado Brasileiro
sequestrar cidadãos por duas horas sob chuva sem ao menos dizer o que estava
acontecendo?
Dei azar e fui levado à delegacia. No ônibus, que horror! Os
policiais são inacreditavelmente mal formados. Reproduzem valores e frases
consolidados na ditadura militar. Provocavam os manifestantes. Insinuavam
abertamente forjar prova contra manifestantes que os irritassem. E isso o tempo
todo e não só no ônibus.
Cantavam as palavras de ordem das manifestações. Um lembrou
de uma: “gambé cuzão, larga a arma e vem na mão”. E em seguida disse “e aí? Não
é isso que vocês cantam? Vem pro pau agora, seus pau no cú? Não aguentam nem um
tapa na cara?”. Ligaram o rádio do ônibus e disseram inaugurar a ‘balada black
bloc’. Tocou Rita Lee.
Fui preso ao som da Rita Lee.
Na delegacia, mais chá de cadeira. Perguntávamos aos
policiais civis qual seria o procedimento e nos respondiam com ironia. As
provocações não cessavam.
O ponto mais inacreditável foi quando uma voz, que não sei
da onde partiu, disse “esse folgado devemos mandar para a sala do choque”. Me
senti muito mal por ouvir isso. Não por acreditar que alguém seria torturado
ali, mas por ter claro naquele momento que o Estado Brasileiro ainda tortura
seres humanos.
Por volta das 23 e 30, chegou um advogado que me tirou da
detenção para averiguação. Não sabia se era o Horácio Neto ou a Virgem Maria.
Fui detido com outros grandes amigos, que absolutamente nada
fizeram. Yuri Scardino, Izaque Jacob e Samuel Jacob, saibam que eu tenho muito
orgulho de ter vocês ao meu lado.
Tudo isso ocorreu porque ousamos questionar a Copa. De fato,
a questão social no Brasil ainda é vista como caso de polícia. Aliás, uma
polícia que age por fora da lei, que é imoral, ilegal e ilegítima. Mais
importante: uma polícia que não pode existir. Uma polícia que promove mais
violência e atentados contra os direitos humanos. Fora PM do mundo!
A melhor resposta que podemos dar é continuar nas ruas. Não
devemos nos intimidar. Não devemos aceitar o atual estado de coisas. “É preciso
não ter medo. É preciso ter coragem dizer”.
Aos amigos que se preocuparam, muito obrigado. A
solidariedade das pessoas foi muito grande. Nos solidarizemos cada vez mais com
as causas de todas pessoas.
Um exemplo para a imprensa brasileira
Depois de tanta confusão entre opinião e reportagem dos últimos seis meses, finalmente uma matéria de fundo. A Agência Pública tentou levantar de onde veio palavra de ordem "Não vai ter Copa", suas motivações e forma de organização. Ufa! Existe vida inteligente na imprensa tupiniquim.
Ciro Barros/Agência Pública
Quem grita “não vai ter Copa” nas manifestações?
Reportagem da Agência Pública mostra quem são os ativistas que estão por trás dos primeiros protestos contra o mundial de futebol no Brasil. Grupo é heterogêneo, abrigando jovens e mais velhos, estudantes e trabalhadores
POR CONGRESSO EM FOCO | 23/02/2014 08:00 CATEGORIA(S): COPA DO MUNDO DE 2014, MANCHETES, NOTÍCIAS, O BRASIL NAS RUAS |
O cenário é um centro acadêmico de uma universidade na zona oeste de São Paulo, num início de noite de um final de janeiro surpreendentemente seco. Sentadas em roda estão cerca de 20 pessoas. Enquanto a reunião não começa, as pessoas conversam em voz baixa, fazendo críticas à polícia, à Copa do Mundo de 2014, ao governo federal, ao governo do Estado de São Paulo. O grupo é heterogêneo: homens mais velhos, adolescentes de ambos os sexos, mulheres, trabalhadores, estudantes. Em comum, eles têm o fato de pertencer a movimentos sociais – dos mais tradicionais, experientes em protestos de rua, aos mais recentes, que ganharam notoriedade a partir da onda de manifestações de junho do ano passado.
Eles estão ali para organizar o segundo ato do ano sob um lema polêmico: “Se não tiver direitos, não vai ter copa”. O primeiro ocorreu no dia 25 de janeiro.
Nas redes sociais, as quatro últimas palavras do lema do grupo causaram furor nesse início de ano, embora o “Não Vai Ter Copa” tenha surgido nas ruas, em junho, durante algumas manifestações. Também foi agora que o PT e o governo federal reagiram nas redes sociais, preocupados com a possibilidade de que as manifestações empanem o brilho da copa no Brasil em ano de eleições – e tenham o mesmo efeito devastador de popularidade que a presidenta Dilma (como todos os governantes) enfrentou em junho do ano passado.
No domingo, dia 12 de janeiro, a 13 dias da primeira manifestação chamada pelo coletivo, a reação do PT veio em um post na página oficial do partido no Facebook: “Tá combinado. Uma boa semana para todos que torcem pelo Brasil”. Acompanhada da frase, havia uma foto com a hashtag #VaiterCopa. Na página oficial da presidenta Dilma, o mesmo tom: “LÍQUIDO E CERTO. Uma boa semana para todos que torcem pelo Brasil” e mais uma vez uma foto com a mesma hashtag. Hoje, a hashtag usada pelo governo e o PT é #CopadasCopas, o mote oficial.
Nos blogs e redes sociais, houve quem tratasse o movimento como “terrorista” e “caso de polícia”. Críticos mais moderadas afirmam que os protestos da copa, se tivessem o mesmo efeito devastador na popularidade da presidenta Dilma, estariam abrindo caminho para os partidos de direita.
Mas afinal, o que é esse novo movimento? O que pretende? Como eles responderiam às críticas das quais têm sido alvo? Foram essas perguntas que me levaram àquela reunião.
Manifesto e o crescimento da articulação
No dia 10 de dezembro do ano passado, Dia Internacional dos Direitos Humanos, foi lançado um manifesto do movimento com o título “Se não tiver direitos, não vai ter Copa”. “(…) Junho de 2013 foi só o começo! As pessoas, os movimentos e os coletivos indignados que querem transformar a realidade afirmam através das diversas lutas que sem a consolidação dos direitos sociais (saúde, educação, moradia, transporte e tantos outros) não há possibilidade do povo brasileiro admitir megaeventos como a Copa do Mundo ou as Olimpíadas. Isso significa que as palavras de ordem no combate a esses governos que só servem às empresas e ao lucro devem ser: ‘Se não tiver direitos, não vai ter Copa!’”, dizia um trecho do manifesto.
E seguia adiante: “Nossa proposta é barrar a copa! Mostrar nacionalmente e internacionalmente que o poder popular não quer a copa!”. Depois, o manifesto se referia às manifestações contra o aumento da tarifa de transportes que detonaram a onda de protestos em junho: “Os dirigentes políticos disseram que era impossível atender a pauta das manifestações pela revogação do aumento, entretanto o poder popular nas ruas nos mostrou que realidades impossíveis podem ser transformadas, reivindicadas e conquistadas pelo povo. E mesmo assim dirão: ‘mas isso é impossível!’ Então nós diremos: ‘o impossível acontece!’”.
Cinco movimentos assinam o manifesto. O mais conhecido deles talvez seja o Movimento Passe Livre (MPL), um dos principais catalisadores dos protestos políticos em junho com a pauta do modelo de transporte público. Os outros são o Fórum Popular de Saúde do Estado de São Paulo, articulação que reúne diversos coletivos em defesa das melhorias na saúde pública; o Coletivo Autônomo dos Trabalhadores Sociais, que reúne, principalmente, assistentes sociais que atuam em São Paulo; o Periferia Ativa, fundado por comunidades da zona sul e da região metropolitana da capital paulista; e o Comitê Contra o Genocídio da População Preta, Pobre e Periférica, que combate a violência da polícia e dos grupos de extermínio ligados a ela que atuam nas periferias.
“Não sou filiado a nada”
Os focos das organizações, como se vê, são diferentes, mas o que as une é a luta pelos direitos humanos da população excluída, que consideram ainda mais ameaçados pela realização da Copa. Sérgio Lima, do Fórum Popular de Saúde, descreve assim os integrantes do movimento: “É um pessoal que já participou de muita luta, pessoal de movimento social mesmo, que tá cansado de gabinete e tudo mais. Eu sou um caso que postulei muito tempo luta de gabinete. Mas hoje não sou filiado a nada”, afirma. E explica os objetivos do grupo: “Ao meu ver, é dizer que a gente não precisava da Copa nesse momento, diante de tantas mazelas em transporte, educação, saúde. Acredito que é nesse sentido”.
Quando lembro as críticas, expressas principalmente nas redes sociais, de que o “Não vai ter Copa” serve aos partidos de direita, ele dá risada. Conta que, inclusive, já foi filiado ao PT. “Eles sempre dizem isso”, desdenha.
Pergunto então se eles realmente pretendem barrar a Copa, e de que maneira. “É um objetivo sim. De enfrentamento mesmo, a gente sabe que é uma luta desleal e cruel, mas a gente tem isso como pauta, sim. Queremos ganhar a massa, ganhar corpo e fazer o enfrentamento com os protestos nas ruas. Não queremos nenhum ato violento, nem se cogita isso. Queremos barrar com os protestos mesmo”, afirma.
Anticapitalistas
Além das organizações citadas, o movimento também atraiu ativistas que militavam em partidos políticos à esquerda do PT, como o PSTU e o PSOL. O movimento Juntos!, por exemplo, que surgiu no início de 2011 a partir da juventude do PSOL, também forma a base de apoio.
“A gente entende a Copa do Mundo como parte de um aspecto crítico do crescimento capitalista. Com o crescimento, ao invés de termos investimentos nos setores públicos, em saúde, educação, transporte, moradia, o que temos é um processo de subserviência ao projeto tradicional de acumulação, que é esse megaevento comandado por uma entidade absolutamente corrupta como a Fifa. O único objetivo da Copa é enriquecer os parceiros comerciais da Fifa e as grandes empresas no Brasil. E isso tem sido feito com a produção de cidades de exceção”, afirma Maurício Costa Carvalho, do Juntos!.
Para Maurício, os protestos de agora fazem parte de uma sequência de manifestações que vem ocorrendo nos últimos anos no mundo todo – dos indignados na Espanha ao Occupy Wall Street nos Estados Unidos. Foram esses protestos, ele diz, que motivaram a criação do Juntos!: “Todos os governantes tiveram a sua popularidade bastante desgastada depois das jornadas de junho. Isso mostra que não é um problema de um partido ou de outro, só. É um problema da estrutura da velha política partidária no país. As manifestações mostraram que é necessário ter mudanças estruturais. E essas mudanças passam por ter uma política que é completamente distinta dessa política que vem sendo feita. É necessário que se ouça a voz das ruas e que a política não se resuma a passar um cheque em branco a um candidato a cada dois anos”.
Pergunto se a ligação do Juntos! com o Psol, que vai lançar o senador amapaense Randolfe Rodrigues como candidato à presidência neste ano, compromete a independência partidária do grupo. “O Juntos! é um grupo que têm militantes do Psol, mas que tem muitos militantes que não são do Psol, tem seus fóruns próprios, seus próprios grupos de discussão. Existem militantes do Psol que participam de vários grupos diferentes. Então não tem nada ligado à estrutura do Psol”, diz.
Ciberativismo
Desde a redação do manifesto, a articulação se define como horizontal, sem que ninguém chame para si o papel de líder ou organizador do movimento. Todos participam da discussão das pautas e estratégias dos atos. E o coletivo continua a atrair novos atores, como integrantes do Sindicato de Metroviários de São Paulo, membros de movimentos de moradia como o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), representantes do movimento estudantil, do GAPP (Grupo de Apoio ao Protesto Popular), um coletivo que presta primeiros socorros aos manifestantes atingidos, entre outros. Um caldo bem heterogêneo, basicamente formado por movimentos urbanos de esquerda com pautas clássicas (moradia, saúde, educação, transporte…) e outros de ciberativismo, como demonstram as páginas do Facebook “Contra a Copa 2014” e “Operation World Cup”, do grupo Anonymous.
“Houve uma junção [com os grupos de ciberativismo]. Tinha uma rapaziada que já tinha criado um evento no Facebook chamando protestos contra a Copa e a gente se articulou com eles e chegamos com uma pauta mais concreta”, conta Sérgio Lima, do Fórum Popular.
Segundo os ativistas ouvidos pela reportagem da Pública, os grupos que atuam online têm duas funções básicas: ajudar a divulgar os protestos e veicular a versão dos manifestantes para episódios controversos. O ato do dia 25 de janeiro, por exemplo, era focado em São Paulo, já que tinha como gancho o aniversário da capital paulista. Mas a divulgação e articulação nas redes acabou multiplicando os protestos em outras cidades do país.
O grupo online também se articulou para rebater as informações de que adeptos do black blocteriam incendiado o Fusca do serralheiro Itamar Santos, de 55 anos. As primeiras informações da imprensa davam conta de que o carro tinha sido incendiado pelos adeptos da tática, mas a página “Contra a Copa 2014” divulgou um vídeo, três dias depois, mostrando imagens de Itamar tentando passar com o Fusca por cima de um colchão em chamas, que ficou preso no carro e o incendiou.
Há muitos membros de movimentos sociais, porém, que associam o Anonymous e outros grupos ciberativistas a setores conservadores, até mesmo à própria polícia. Eles se declaram apartidários.
Bandeiras clássicas
“Se tem alguém de direita ali, está muito bem escondido”, afirma categoricamente Sérgio Lima. Maurício Carvalho, do Juntos!, concorda: “Nós estamos elaborando uma lista de reivindicações de direitos básicos de algumas bandeiras que estão envolvidas em seis eixos: saúde, educação, transporte, moradia, contra a ingerência da Fifa e contra a repressão. E todas essas bandeiras são históricas que a esquerda e os movimentos sociais construíram”.
Outro membro da articulação é o ativista Vitor Araújo, o “Vitinho”, que perdeu um olho em uma manifestação do último dia 7 de setembro, em São Paulo, enquanto cobria a manifestação pelo Basta TV, um canal independente. Vitor afirma que perdeu o olho depois de uma bomba da Polícia Militar estourar perto do seu rosto – episódio que o motivou a seguir nas ruas. “Nosso movimento é horizontal e não partidário, nem ideológico. Existe muita discussão, muita gente com ideologia diferente, mas temos um único cunho que é ‘Se não tiver direitos, não vai ter Copa’: direito à saúde, à educação, à moradia, à segurança pública. São por esses méritos que cada uma das pessoas luta por um objetivo final”, afirma.
A fala de Vitor parece ilustrar a crise de representação política tão citada pelos sociólogos no momento em que vivemos. Ele diz não acreditar nos métodos da política clássica, apesar de não se opor à participação de ativistas que militam nos partidos. “Nossa luta é por direitos básicos, que estão na Constituição e não acontecem. Não tem vinculação a partidos, a ideologias”, realça, acrescentando que também já fez manifestações contra o chamado “Propinoduto Tucano” (denúncia de corrupção nos contratos do metrô e trens de São Paulo) e que não há motivos partidários nas manifestações contra a copa.
“É simples: havia um acordo, que era o do governo montar toda uma estrutura em volta da copa, dos estádios. Isso não aconteceu e é por isso que a gente luta. São sete anos e eles não cumpriram esse acordo”, explica.
Vitor também nega a presença tanto de “pessoas assumidamente de direita” como de adeptos da tática black bloc na concepção e organização dos movimentos contra a Copa. “Os protestos são convocados na internet, nas redes sociais, são abertos. Eles veem e se organizam para ir lá”, diz. Também diz entender a atitude black bloc como uma reação à violência policial. “Posso te dizer, já fui em muita manifestação aqui em São Paulo e quem começa a reprimir é sempre a PM”, afirma.
Vários protestos sob o lema “Se não tiver direitos, não vai ter Copa” estão previstos para acontecer nesse semestre. Cada protesto levantará a bandeira de um direito que, na visão dos ativistas, é negado à população, ou então problemas concretos acarretados pela Copa. No dia 22 de fevereiro está marcado um ato na Praça da República, centro de São Paulo. O mote do protesto é a educação.
Com cautela
A Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa (ANCOP) apoia os atos realizados pelos coletivos, mas não participa de sua articulação. Cada comitê popular em cada cidade-sede tem independência para aderir ou não aos atos. “O lema ‘Não vai ter Copa’ veio das ruas, das manifestações, não foi imposto por nenhum grupo político. A gente claro que aceita. Não temos a pretensão de ser vanguarda ou monopolizar a resistência à copa. Mas no entendimento que a gente tem discutido bastante, o ‘Não Vai Ter Copa’ é muito mais uma palavra de ordem do que um objetivo concreto. Dentre os nossos objetivos não está não acontecer a copa. Temos objetivos concretos, como reparações às vítimas da Copa”, diz Marina Mattar, do Comitê Popular de São Paulo.
“Dá para perceber que são movimentos bem heterogêneos, tem de tudo nessa proposta. Ela vem com pouco debate político e alguns comitês não conseguem contato com quem tá propondo, organizando. Aqui em Porto Alegre a gente não conhece as pessoas que estão propondo isso”, diz Claudia Favaro, do Comitê Popular de Porto Alegre. “Quando chamaram o ato do dia 25, não foi conversado com o Bloco de Lutas pelo Transporte Público e nem com o Comitê, que são os espaços onde os coletivos estão organizados. Aqui a gente não tem essa posição de que mobilização só se chama pela internet. E existe uma preocupação por parte da esquerda em geral da apropriação da pauta por setores mais conservadores. A gente se soma ao grito de ‘Não vai ter Copa’ entendendo que é uma amarra na garganta de um povo que já está oprimido há um tempo, mas ainda vemos com cautela”, diz ela.
“Em todos os debates que a gente teve a gente acha até ruim que o debate fique polarizado entre ‘Vai ter Copa’ e ‘Não Vai Ter Copa’. Fica então uma discussão superficial, a gente não discute as violações. E o que a gente quer discutir são as violações”, opina Renato Cosentino, do Comitê Popular do Rio de Janeiro. “Tanto as violações diretas em decorrência da copa como as de modelo de cidade que a Copa do Mundo faz parte. É isso que a gente vem tentando dar destaque. Mas é claro que a gente apoia o lema e as mobilizações contra a copa”, completa.
As pesquisas IBOPE e Datafolha: o problema é a qualidade das oposições
Acabamos de receber mais uma sequência de pesquisas (CNT, Ibope e Datafolha) sobre avaliação de governo e intenção de voto para a eleição de outubro.
A avaliação do governo está estável ou em ligeira queda. Veja o gráfico abaixo, da pesquisa IBOPE:
Uma queda de 4%, em dois meses.
No caso da intenção de votos, tanto CNT, quanto Datafolha, projetam vitória no primeiro turno para a atual Presidente. Vejamos o Datafolha:
Há duas sinalizações mais nítidas neste conjunto de pesquisas.
A primeira, o repique dos índices de avaliação do governo. O clima morno da economia parece afetar diretamente seus índices de aprovação. Em especial, no que tange ao índice de emprego, que apresentou queda em função das demissões na passagem do ano, ou seja, fruto da sazonalidade das contratações. A queda de emprego tem forte impacto sobre serviços e comércio varejista de baixa renda. Em 2013, a renda média aumentou apenas 1,8%. Lembremos que o aumento da renda média no Brasil foi de 3,8% em 2010 e 2,7% em 2011.
Há, contudo, elementos para sugerir que as críticas à Copa do Mundo - e os gastos públicos realizados de maneira pouco parcimoniosa - já batem às portas dos índices de aprovação do governo federal. Pesquisa divulgada na última terça-feira, realizada pela CNT/MDA, revelou que 75,8% dos brasileiros consideram desnecessários os investimentos feitos para a realização da Copa do Mundo. Significativamente, dois dias depois, o governo Dilma anunciou corte de 44 bilhões de reais no orçamento deste ano (muito acima do projetado pelas agências vinculadas ao mercado financeiro que registravam 30 bilhões).
Mas a pesquisa Datafolha apontou algo mais nítido. A eleição de outubro não está nas mãos do governo federal, mas dos candidatos da oposição. Num cenário com o atual quadro de candidatos, além de Dilma Rousseff vencer no primeiro turno, o candidato Aécio Neves, que preside o maior partido de oposição, apresentou queda na intenção de votos. Pior, o índice de rejeição de Dilma, Aécio e Eduardo Campos é o mesmo.
Somente com o ingresso de Marina Silva e Joaquim Barbosa haveria segundo turno. Joaquim Barbosa ficaria em segundo lugar, com 16% dos votos. No caso de Marina entrar no páreo, ficaria em segundo lugar com 17% dos votos.
Enfim, o problema está nos candidatos da oposição. São fracos e seus partidos não criam nenhuma base de projeção razoável. Seu discurso é insípido e o brasileiro parece considerar que se não está bom com Dilma, ficará pior com eles.
A avaliação do governo está estável ou em ligeira queda. Veja o gráfico abaixo, da pesquisa IBOPE:
Uma queda de 4%, em dois meses.
No caso da intenção de votos, tanto CNT, quanto Datafolha, projetam vitória no primeiro turno para a atual Presidente. Vejamos o Datafolha:
Há duas sinalizações mais nítidas neste conjunto de pesquisas.
A primeira, o repique dos índices de avaliação do governo. O clima morno da economia parece afetar diretamente seus índices de aprovação. Em especial, no que tange ao índice de emprego, que apresentou queda em função das demissões na passagem do ano, ou seja, fruto da sazonalidade das contratações. A queda de emprego tem forte impacto sobre serviços e comércio varejista de baixa renda. Em 2013, a renda média aumentou apenas 1,8%. Lembremos que o aumento da renda média no Brasil foi de 3,8% em 2010 e 2,7% em 2011.
Há, contudo, elementos para sugerir que as críticas à Copa do Mundo - e os gastos públicos realizados de maneira pouco parcimoniosa - já batem às portas dos índices de aprovação do governo federal. Pesquisa divulgada na última terça-feira, realizada pela CNT/MDA, revelou que 75,8% dos brasileiros consideram desnecessários os investimentos feitos para a realização da Copa do Mundo. Significativamente, dois dias depois, o governo Dilma anunciou corte de 44 bilhões de reais no orçamento deste ano (muito acima do projetado pelas agências vinculadas ao mercado financeiro que registravam 30 bilhões).
Mas a pesquisa Datafolha apontou algo mais nítido. A eleição de outubro não está nas mãos do governo federal, mas dos candidatos da oposição. Num cenário com o atual quadro de candidatos, além de Dilma Rousseff vencer no primeiro turno, o candidato Aécio Neves, que preside o maior partido de oposição, apresentou queda na intenção de votos. Pior, o índice de rejeição de Dilma, Aécio e Eduardo Campos é o mesmo.
Somente com o ingresso de Marina Silva e Joaquim Barbosa haveria segundo turno. Joaquim Barbosa ficaria em segundo lugar, com 16% dos votos. No caso de Marina entrar no páreo, ficaria em segundo lugar com 17% dos votos.
Enfim, o problema está nos candidatos da oposição. São fracos e seus partidos não criam nenhuma base de projeção razoável. Seu discurso é insípido e o brasileiro parece considerar que se não está bom com Dilma, ficará pior com eles.
terça-feira, 18 de fevereiro de 2014
Minha entrevista à Gazeta do Sul sobre manifestações e violência
– O senhor estuda as manifestações no Brasil desde junho do ano passado. De lá para cá, a impressão que se tem é que a violência dos protestos aumentou. É correto afirmar que os protestos vêm se tornando mais violentos? Por quê?R: Em termos. A violência esteve presente, de parte a parte, desde o primeiro momento. Veja que o estopim para que as manifestações se alastrassem por várias capitais brasileiras foi o vídeo "Sem Violência" que se tornou um vírus nas redes sociais. Bruno Torturra (do Mídia Ninja) gravou a PM avançando sobre os manifestantes que gritavam a palavra de ordem pacífica. Em todas manifestações houve exagero da PM. E em todas, ao final, alguns manifestantes reagiram com muita carga violenta. O que me parece que foi se alterando foi a postura dos governos e a legitimação, entre manifestantes, da reação violenta aos atos da PM. Mas, o que importa é que a violência é elemento constitutivo das manifestações desde junho do ano passado.
- De que forma esse aumento na violência (ou ao menos a impressão de aumento) está alterando o perfil das manifestações?
R: A reação de parte da grande imprensa e a senha governamental é que estão levando à uma situação de confronto aberto, sem porta de saída. Começou com a rejeição "in totum" das propostas da Presidente Dilma Rousseff que tentava, via plebiscito, canalizar as ruas para o campo institucional. A reação da grande imprensa e parlamentares foi irresponsável e conservadora. Não queriam alterar nada em meio à milhões de brasileiros que exigiam a mudança. O diálogo democrático foi interditado desde então. A partir de outubro, o Ministério da Justiça convoca secretários estaduais de segurança pública para reagir aos vândalos e anunciou a possibilidade de emprego das forças armadas durante a Copa. Em dezembro, publicam o Manual de Garantia da Lei e da Ordem. O manual inclui criminosos vinculados ao tráfico com manifestantes. Algo descabido. Na sequência, senadores petistas sugerem a aprovação imediata da Lei Antiterror. Felizmente a direção nacional do PT repreendeu senadores como Paulo Paim, com história de lutas sociais incontestável. O que esta sequência nos informa? Ausência de liderança política. Esta é a questão central. Muitos me perguntam se esta situação ocorreria se Lula fosse o Presidente da República. Exercício mental próprio de paranormais. Mas qualquer resposta desabona o sistema político vigente. Líder convence, empolga, dialoga, cria fato político. Qual gestor público, hoje, tem esta capacidade?
- Essa violência não faz com que a opinião pública se volte contra os protestos – diferente de junho, quando havia um apoio da população aos atos?
R: Não sabemos. No final do ano, 35% dos brasileiros (Datafolha) afirmavam que a Copa não trará nada de bom ao Brasil. Mais de 1/3 dos brasileiros. Há registros que o Palácio do Planalto tem dados recentes que revelam aumento deste índice. Por outro lado, o confronto e cerco aos manifestantes só aumenta o enfrentamento de rua porque os manifestantes já sabem o que os espera. Finalmente, se o Brasil perder a Copa, a indignação pode se somar. Não tenho uma resposta fácil a esta pergunta.
- É visto como tendência que os protestos se intensifiquem até o período da Copa. O senhor acredita que daqui até lá eles se tornem mais violentos?
R: Vai depender da reação dos governos, não dos manifestantes. Estão jogando gasolina na fogueira. Quem está no governo tem maiores responsabilidades políticas que os manifestantes, evidentemente. Mas estão se igualando em termos de reações emocionais. Uma geração desastrosa de gestores públicos: muito técnicos e sem nenhum traquejo político.
- A legislação em vigor é suficiente para impedir que os protestos se tornem atentados à ordem pública e causem mortes e feridos?
R: Sim, é. Quem deve atuar é a inteligência policial, os P2. E eles estão no interior das manifestações, alguns, declaradamente. Perguntei, recentemente, para um dos maiores especialistas em estudos sobre violência como os dados da inteligência policial são organizados. Ele afirmou que não são sistematizados e sorriu, desconsolado. A inteligência tem a função de se antecipar à violência.
- Uma nova legislação, com as que estão em discussão no momento, não correm o risco de se tornarem instrumentos de repressão à liberdade de expressão, que é um direito constitucional de todo cidadão?
R: O PT está plantando a legislação que poderá ser elemento de caça às bruxas, incluindo sua própria ação, no futuro, caso ele não seja mais governo central do país. A história é farta de exemplos. Como diferenciar manifestante de criminoso? Não é a ação exagerada da PM que se tornou o estopim de tudo? Segundo o Índice de Confiança na Justiça Brasileira (ICJBrasil), realizado pela Fundação Getúlio Vargas, 70,1% da população não confia no trabalho das diversas polícias no País, 8,6 pontos porcentuais acima do registrado no primeiro semestre de 2012. Enfim, leis draconianas serão aplicadas por uma instituição não confiável e profundamente deslegitimada no país. O que podemos esperar disto? Não seria a cereja do bolo para apartar de vez os órgãos de repressão pública dos cidadãos?
- De que forma esse aumento na violência (ou ao menos a impressão de aumento) está alterando o perfil das manifestações?
R: A reação de parte da grande imprensa e a senha governamental é que estão levando à uma situação de confronto aberto, sem porta de saída. Começou com a rejeição "in totum" das propostas da Presidente Dilma Rousseff que tentava, via plebiscito, canalizar as ruas para o campo institucional. A reação da grande imprensa e parlamentares foi irresponsável e conservadora. Não queriam alterar nada em meio à milhões de brasileiros que exigiam a mudança. O diálogo democrático foi interditado desde então. A partir de outubro, o Ministério da Justiça convoca secretários estaduais de segurança pública para reagir aos vândalos e anunciou a possibilidade de emprego das forças armadas durante a Copa. Em dezembro, publicam o Manual de Garantia da Lei e da Ordem. O manual inclui criminosos vinculados ao tráfico com manifestantes. Algo descabido. Na sequência, senadores petistas sugerem a aprovação imediata da Lei Antiterror. Felizmente a direção nacional do PT repreendeu senadores como Paulo Paim, com história de lutas sociais incontestável. O que esta sequência nos informa? Ausência de liderança política. Esta é a questão central. Muitos me perguntam se esta situação ocorreria se Lula fosse o Presidente da República. Exercício mental próprio de paranormais. Mas qualquer resposta desabona o sistema político vigente. Líder convence, empolga, dialoga, cria fato político. Qual gestor público, hoje, tem esta capacidade?
- Essa violência não faz com que a opinião pública se volte contra os protestos – diferente de junho, quando havia um apoio da população aos atos?
R: Não sabemos. No final do ano, 35% dos brasileiros (Datafolha) afirmavam que a Copa não trará nada de bom ao Brasil. Mais de 1/3 dos brasileiros. Há registros que o Palácio do Planalto tem dados recentes que revelam aumento deste índice. Por outro lado, o confronto e cerco aos manifestantes só aumenta o enfrentamento de rua porque os manifestantes já sabem o que os espera. Finalmente, se o Brasil perder a Copa, a indignação pode se somar. Não tenho uma resposta fácil a esta pergunta.
- É visto como tendência que os protestos se intensifiquem até o período da Copa. O senhor acredita que daqui até lá eles se tornem mais violentos?
R: Vai depender da reação dos governos, não dos manifestantes. Estão jogando gasolina na fogueira. Quem está no governo tem maiores responsabilidades políticas que os manifestantes, evidentemente. Mas estão se igualando em termos de reações emocionais. Uma geração desastrosa de gestores públicos: muito técnicos e sem nenhum traquejo político.
- A legislação em vigor é suficiente para impedir que os protestos se tornem atentados à ordem pública e causem mortes e feridos?
R: Sim, é. Quem deve atuar é a inteligência policial, os P2. E eles estão no interior das manifestações, alguns, declaradamente. Perguntei, recentemente, para um dos maiores especialistas em estudos sobre violência como os dados da inteligência policial são organizados. Ele afirmou que não são sistematizados e sorriu, desconsolado. A inteligência tem a função de se antecipar à violência.
- Uma nova legislação, com as que estão em discussão no momento, não correm o risco de se tornarem instrumentos de repressão à liberdade de expressão, que é um direito constitucional de todo cidadão?
R: O PT está plantando a legislação que poderá ser elemento de caça às bruxas, incluindo sua própria ação, no futuro, caso ele não seja mais governo central do país. A história é farta de exemplos. Como diferenciar manifestante de criminoso? Não é a ação exagerada da PM que se tornou o estopim de tudo? Segundo o Índice de Confiança na Justiça Brasileira (ICJBrasil), realizado pela Fundação Getúlio Vargas, 70,1% da população não confia no trabalho das diversas polícias no País, 8,6 pontos porcentuais acima do registrado no primeiro semestre de 2012. Enfim, leis draconianas serão aplicadas por uma instituição não confiável e profundamente deslegitimada no país. O que podemos esperar disto? Não seria a cereja do bolo para apartar de vez os órgãos de repressão pública dos cidadãos?
Relato de um Perplexo
Relato de um perplexo
18/02/2014
Por Rudá Ricci
Por Rudá Ricci, para o dossiê UniNômade sobre as manifestações
“A leitura das planilhas eliminou a capacidade de ler as ruas.”
–
As manifestações de junho já haviam mostrado sua cara. Mas a surpresa continuava. Ao menos, para grande parte da grande imprensa e para os políticos profissionais. Sem contar os gestores públicos que formam a pior geração de toda a história republicana de nosso país.
A geração tecnocrática não tem na sua memória o papel do governante como liderança. Acreditou no discurso do empresariamento da gestão pública, tão disseminada ao longo dos anos 1990. O século virou, mas a crença foi reproduzindo-se, embora não publicamente, como conviria às decisões e pensamentos privados, mas sim nos seminários fechados, quase clandestinos, nos cursos do estilo MBA. O pensamento único de empresariamento da gestão pública invadiu quase todo o sistema partidário brasileiro, como uma senha ao bom senso. Uma “boa prática”, ainda que a população não tenha sido consultada para dar sua opinião. Porque no mundo tecnocrático, pouco importa o que os “de baixo” pensam, quase sempre desqualificadas como opiniões apaixonadas e pouco lúcidas.
O gestor tecnocrático é destituído de faro político. Não sabe negociar o que, aliás, é visto como perda de tempo até justificável, mas perda de tempo. O eixo da atuação é o Power Point que sintetiza o planejamento estratégico. Planejamento normativo, que dispara um alerta quando as metas não são alcançadas. A leitura das planilhas eliminou a capacidade de ler as ruas. Neste mundo apartado das ruas, onde o eleito ganhou a licença para tudo após a contagem dos votos da última eleição (o bom e descompromissado líder fiduciário), qualquer agitação que se insurja do lado de fora das janelas gera perplexidade. “Não era para acontecer”, imaginam os tecnocratas. Os mais lúcidos gestores desta nova geração afirmam, também perplexos: “são ingratos”. Porque não há outra resposta para quem não sentiu o pulsar das ruas durante meses. Tudo deveria ser resolvido nos gabinetes. Mas não foi.
Mas aí, o Ministro da Justiça convoca, no finalzinho de outubro, uma reunião com Secretários Estaduais da Segurança Pública para uma conversa sobre o vandalismo que estaria tomando as manifestações populares. O ministro adiantou: “manifestantes pacíficos podem se manifestar, mas os vândalos terão outro tratamento”. A questão que ficava para cada cidadão descrente no discurso político era: como diferenciar um do outro? Se é possível distingui-los, porque a inteligência policial já não resolve isto antes da manifestação dar lugar ao vandalismo? Não, ministro, seu discurso não convenceu.
Tudo ficou ainda mais nebuloso quando Humberto Freire, coordenador da Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos (Sesge), do Ministério da Justiça, veio à público para informar que não estaria descartada a convocação das Forças Armadas e da Força Nacional de Segurança para atuar durante a Copa do Mundo, logo no início de janeiro de 2014.
Em seguida, foi divulgado o teor do Manual de Garantia da Lei e da Ordem, elaborado pelo Ministério da Defesa. A aprovação do material consta na Portaria Normativa n.º 3.461, publicada no Diário Oficial da União e passou a ter validade a partir de 20 de dezembro de 2013. Um manual de emprego da força em situações extraordinárias. Anunciado como operação militar conduzida pelas Forças Armadas em área previamente estabelecida e por tempo limitado com o objetivo de preservar a ordem pública. Podendo ocorrer por iniciativa própria da Presidente da República ou em atendimento a pedido manifestado por quaisquer dos poderes constitucionais. Ao longo do documento emergem vários riscos à democracia. O item 4.3, trata das “forças oponentes”. Logo de início, o item indica que não se trata de caracterizar um “inimigo” (na forma clássica das operações militares, complementa), mas caracterizar as forças que deverão ser objeto de atenção. Novamente, o fio da navalha, algo que se diz sem falar. Como forças oponentes, o documento indica: a) movimentos ou organizações; b) organizações criminosas, quadrilhas de traficantes de drogas, contrabandistas de armas e munições, grupos armados etc; c) pessoas, grupos de pessoas ou organizações atuando na forma de segmentos autônomos ou infiltrados em movimentos, entidades, instituições, organizações provocando ou instigando ações radicais e violentas; e d) indivíduos ou grupo que se utilizam de métodos violentos para a imposição da vontade própria em função da ausência das forças de segurança pública policial.
Ora, como movimentos ou organizações podem ser incluídos no mesmo rol de forças oponentes que organizações criminosas? A dúvida é pertinente porque à página 63 do Manual, a síntese deste item é ainda mais reveladora. Está lá:
“4. FORÇAS OPONENTES. 4.1. São segmentos autônomos ou infiltrados em movimentos sociais, entidades, instituições, e/ou organizações não governamentais que poderão comprometer a ordem pública ou até mesmo a ordem interna do País, utilizando procedimentos ilegais. (grifo de minha autoria).
O ANEXO G (CONTROLE DE DISTÚRBIOS EM AMBIENTE URBANO) ao Plano Operacional, inscrito no Manual à página 65 é ainda mais revelador. No item “cenário” destaca:
1. CENÁRIO. Atuação de elementos integrantes de movimentos sociais reivindicatórios, de oposição ou protesto, comprometendo a ordem pública.”
Ficamos à mercê da identificação e discernimento da autoridade pública de plantão para diferenciar o que são elementos integrantes infiltrados dos manifestantes e componentes de movimentos sociais. Ingressamos no alto risco de todo manifestante ser um potencial inimigo da ordem social. O que nos remete às leis de exceção do regime militar.
Quando tudo parecia uma obra inédita de George Orwell, a ofensiva da base governista após a trágica morte do cinegrafista Santiago Andrade, durante manifestação no centro do Rio de Janeiro, em 06 de fevereiro, nos sacode outra vez. O projeto de lei, que no Senado recebeu o número 499/2013, foi proposto por uma comissão parlamentar mista criada para consolidar várias leis em um único projeto. O senador petista Paulo Paim, que havia pedido análise do projeto por entender que poderia infundir terror ou pânico generalizado, perdeu o bom senso e afirmou no dia 10 de fevereiro:
“Mediante o acontecido com o cinegrafista, que foi covardemente assassinado, acredito que o Senado tem que responder, não só para esse fato, mas para alguns que já aconteceram e outros que vão acontecer se nada for feito. Por isso, estou disposto a retirar o requerimento e fazer o debate que faríamos na CDH”.
Foi acompanhado pelo senador Jorge Viana (PT-AC) que afirmou ser possível aprovar o projeto em regime de urgência.
Pressa que mereceu repreensão da direção nacional do Partido dos Trabalhadores. Em nota pública, a direção do partido ao qual a Presidente da República é filiada sustentou:
“O Partido dos Trabalhadores acompanha com atenção os debates no Congresso Nacional sobre a adoção de uma legislação antiterror, especificamente no cenário das manifestações que têm ocorrido no País. Entretanto, o PT não pode aceitar qualquer texto legal que não tipifique – com clareza, objetividade e precisão – crimes eventualmente ocorridos no contexto dessas manifestações. Uma lei vaga nessa caracterização penal atenta contra os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição e poderia servir à criminalização de movimentos sociais, o que seria um inaceitável retrocesso democrático. Em que pese nenhum parlamentar seu estar ligado à autoria de projetos dessa natureza, o PT acha que o Brasil precisa aperfeiçoar seus textos legais com vista a ter dispositivos cíveis e penais que coíbam atos contra o patrimônio público, o patrimônio privado e, principalmente, a integridade das pessoas, provocados por aqueles que se aproveitam de legítimas manifestações populares para cometer ações de violência. Com a proximidade da Copa, a sociedade brasileira exige segurança para exercer seus direitos de liberdade de expressão, de pensamento e de reunião. O Poder Público necessita de um marco legal atualizado para lidar com novas situações que ocorram nesses eventos. Por isso, o PT tem orientado seus parlamentares a terem o máximo cuidado com projetos dessa natureza para que uma lei em defesa da sociedade não se transforme em lei contra a sociedade.” – Rui Falcão, Presidente nacional do PT.
O que, afinal, ocorre? A sequência de fatos não sugere pânico do governo que dirige o país?
Afinal, algo de muito estranho parece contradizer toda história do partido governista e seus dirigentes.
Com o advento do AI-5, a própria Presidente da República e vários de seus colaboradores não recuaram, como parecem acreditar, agora, que ocorrerá com o Manual de Garantia da Lei e da Ordem e a proposta de lei 499/2013. Ao contrário, vários pegaram em armas. O que levaria esses personagens, tendo passado por este itinerário político, acreditarem que esta reação geraria um resultado eficaz ou apaziguador?
Mais: a figura máxima do petismo, o ex-Presidente Lula, foi líder das maiores manifestações urbanas ao longo dos anos 1980 e parte dos 1990. Foi preso por liderar uma imensa greve de metalúrgicos. Liderou a rejeição da eleição indireta de Tancredo Neves e era dirigente do PT quando seu partido decidiu bradar o slogan “Fora FHC”.
A motivação seria a contaminação do processo eleitoral de outubro pelas manifestações que se avizinham em protesto aos gastos públicos e efeitos sociais com a Copa do Mundo? Se for, não seria uma declaração de perda de controle das ruas ou de transformação de uma rica história de lutas sociais e protestos de rua em paranoia conservadora?
Continuo perplexo. O último semestre revelou a cara do novo Brasil. Aquele que apareceu nas manifestações de junho e aquele dos rolezinhos. De dezembro de 2013 a fevereiro deste ano, foi a vez do governo petista se revelar. E, com ele, grande parte de seus dirigentes.
Continuo perplexo.
—
Rudá Ricci é sociólogo, doutor em ciências sociais (Unicamp), diretor do Instituto Cultiva. Autor de “Lulismo” (Editora Contraponto, sobre os oito anos de governo Lula) e “Nas Ruas” (Editora Letramento, sobre as manifestações de junho de 2013).
segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014
Se Lula fosse Presidente haveria manifestações de rua?
A pergunta acima foi feita por Luis Bassoli, via Inbox do Facebook.
Uma pergunta maliciosa porque qualquer que seja a resposta é desabonadora ao PT. Se a resposta for negativa, fica ainda mais evidente que o partido dos trabalhadores não conseguiu gerar uma cultura política interna focada na capacidade de negociação e convencimento. Se a resposta for positiva, toda trajetória petista terá sido carregada pelo tempo. As ruas não serão mais seu lugar de fazer política.
Não é possível fazer conjecturas sobre o que não ocorreu. Mas é possível analisar as características dos dois fatores desta equação proposta por Bassoli: Lula e as manifestações de junho.
O que tem Lula de tão especial? Primeiro, o momento histórico que o forjou como líder dos metalúrgicos. Era o fim da ditadura militar. A partir de 1974, gradativamente, a população brasileira passou a votar no MDB. Se em 1970 o partido da oposição consentida tinha apenas 28,1% das cadeiras da Câmara Federal, em 1978 saltara para 45%. No Senado, o mesmo: 10,9% em 1970 para 45% em 1978. O ano de 1977 foi um marco. A crise internacional, alimentada pelo aumento do preço do barril de petróleo, bateu duro no regime militar. Muitos programas federais foram cortados e o "milagre brasileiro" fazia água por todos os lados. A população já não confiava na paz e prosperidade prometida pelos militares. Até os empresários decidiram confrontar com a norma imposta: realizaram neste ano o primeiro encontro nacional de classe. Os metalúrgicos vieram em seguida. Lula despontou, desde cedo. Numa das assembleias concorridas no Estádio da Vila Euclides, pouco antes de Lula falar, uma faixa gigantesca foi sendo aberta. De um lado, a imagem de Jesus Cristo, do outro lado, a imagem de Lula. A construção do mito já se processava.
Lembro, ainda, do papel de Osmarzinho (Osmar Santos de Mendonça), filiado ao MR-8 e sua influência sobre Lula, tema-tabu que pouco se discute entre petistas (Osmarzinho era ágil e carismático como Lula, mas com uma formação politica muito mais profunda). Mas Lula era um "repentista político", com uma capacidade de criar um discurso desconcertante. Falava o dialeto operário como ninguém. Gostava de futebol, era corinthiano e católico. E era emotivo. Sua inteligência acima do normal - atestada até mesmo por inúmeras matérias do jornal Estado de São Paulo - fez com que superasse sua ojeriza por partidos políticos. E se tornou o primeiro líder operário de um partido de esquerda brasileiro, de massas. Lula galvanizou os anos 1980. A luta nas ruas. A desconfiança em relação à tudo o que cheirasse elite, incluindo o mundo acadêmico. O enfrentamento da Ordem, o que incluía a polícia. O mecanismo de legitimação que Lula dirigiu foi o do mobilismo. A força das ruas como elemento de imposição de valores e demandas. Daí a natureza carismática daquelas lideranças e a ironia frente aos poderes constituídos. Já citei inúmeras vezes como no PT se traduzia uma frase de Gramsci como mantra: é possível ser poder mesmo não sendo governo. A disputa das ideias, dos corações e mentes. Esta engenharia politica era possível em função da ligação que Lula fazia entre um projeto de esquerda e um jeito de ser e falar de operário, classe média baixa, povão. Lula atraía trabalhadores e classe média baixa como @s "menin@s de junho" atraem seus pares. Havia identidade e empatia.
Até que Lula perde uma eleição praticamente ganha, em 1989. Este fato mudou o PT e Lula. Por dentro. Como se um osso tivesse trincado. Uma dor que não se expunha. Lula decidiu ser governo. E liberou os "operadores" e burocratas, aqueles que se fizeram na política pelas portas dos fundos, não pelas ruas.
Ali, Lula fez a guinada: deixava de ser poder para ser governo.
E este é o drama do PT. Quem seguiu esta trilha, agora percebe que perdeu as ruas.
O governo Dilma Rousseff é a expressão maior desta inflexão. Dilma se esforça, não há como negar. Mas não tem carisma. E não tem a empatia com a base da sociedade. "Não é uma das nossas", dizem as beneficiárias do Bolsa Família. "Mas Lula sentiu na pele o que é ser pobre", completam.
Posso não saber cravar uma resposta clara para a pergunta de Bassoli. Possivelmente, @s menin@s de junho sairiam da mesma maneira. Mas os "iguais à Lula" se ofenderiam. Porque veriam nos manifestantes alguém de outra classe social. Sentiriam na pele, nas roupas que utilizam, na linguagem. Na sua mente, trabalhadores e beneficiários do Bolsa Família imaginariam Lula numa cadeira, tomando um gole de cachaça e refletindo o que os manifestantes, afinal, desejam. E ficariam entristecidos pelo tratamento que as ruas estariam dando ao seu igual, que um dia foi pobre e que demonstrou ao país que qualquer filho de operário pode, agora, chegar a ser a maior autoridade pública do país. A figura de Lula continua despertando a mesma projeção que se forjava na cabeça dos operários do ABC paulista nos anos 1980. Um igual. Sofredor como eles.
Já Dilma. Bem, Dilma é a imagem d@s menin@s de junho. Fala como eles falarão quando atingir a idade da Presidente. Dura como uma pedra. Ascética. Ninguém sabe se torce para algum time ou se bebe alguma bebida alcoólica. Alguém disse que ela deu umas voltas de motocicleta outro dia, em Brasília. Coisa que quem ganha Bolsa Família nem imagina fazer. Basta um toque na memória e logo vem à mente a imagem de Lula, ainda Presidente, de férias numa praia baiana, carregando uma caixa de isopor nos ombros, possivelmente cheia de geladinhas, como qualquer filho de Deus faz. Sem garçons, sem "cooler".
O que penso é que @s menin@s de junho têm sorte. Se o Presidente fosse Lula, não teriam espaço para tanta brincadeira. Mas, sem Lula, o PT e Dilma rasgam a empatia original que os fez chegar onde estão.
Uma ironia. Mas previsível.
PS: Antes que me ataquem pelo uso da ilustração, destaco que a montagem está disponível na internet. Para se ter uma ideia.
Uma pergunta maliciosa porque qualquer que seja a resposta é desabonadora ao PT. Se a resposta for negativa, fica ainda mais evidente que o partido dos trabalhadores não conseguiu gerar uma cultura política interna focada na capacidade de negociação e convencimento. Se a resposta for positiva, toda trajetória petista terá sido carregada pelo tempo. As ruas não serão mais seu lugar de fazer política.
Não é possível fazer conjecturas sobre o que não ocorreu. Mas é possível analisar as características dos dois fatores desta equação proposta por Bassoli: Lula e as manifestações de junho.
O que tem Lula de tão especial? Primeiro, o momento histórico que o forjou como líder dos metalúrgicos. Era o fim da ditadura militar. A partir de 1974, gradativamente, a população brasileira passou a votar no MDB. Se em 1970 o partido da oposição consentida tinha apenas 28,1% das cadeiras da Câmara Federal, em 1978 saltara para 45%. No Senado, o mesmo: 10,9% em 1970 para 45% em 1978. O ano de 1977 foi um marco. A crise internacional, alimentada pelo aumento do preço do barril de petróleo, bateu duro no regime militar. Muitos programas federais foram cortados e o "milagre brasileiro" fazia água por todos os lados. A população já não confiava na paz e prosperidade prometida pelos militares. Até os empresários decidiram confrontar com a norma imposta: realizaram neste ano o primeiro encontro nacional de classe. Os metalúrgicos vieram em seguida. Lula despontou, desde cedo. Numa das assembleias concorridas no Estádio da Vila Euclides, pouco antes de Lula falar, uma faixa gigantesca foi sendo aberta. De um lado, a imagem de Jesus Cristo, do outro lado, a imagem de Lula. A construção do mito já se processava.
Lembro, ainda, do papel de Osmarzinho (Osmar Santos de Mendonça), filiado ao MR-8 e sua influência sobre Lula, tema-tabu que pouco se discute entre petistas (Osmarzinho era ágil e carismático como Lula, mas com uma formação politica muito mais profunda). Mas Lula era um "repentista político", com uma capacidade de criar um discurso desconcertante. Falava o dialeto operário como ninguém. Gostava de futebol, era corinthiano e católico. E era emotivo. Sua inteligência acima do normal - atestada até mesmo por inúmeras matérias do jornal Estado de São Paulo - fez com que superasse sua ojeriza por partidos políticos. E se tornou o primeiro líder operário de um partido de esquerda brasileiro, de massas. Lula galvanizou os anos 1980. A luta nas ruas. A desconfiança em relação à tudo o que cheirasse elite, incluindo o mundo acadêmico. O enfrentamento da Ordem, o que incluía a polícia. O mecanismo de legitimação que Lula dirigiu foi o do mobilismo. A força das ruas como elemento de imposição de valores e demandas. Daí a natureza carismática daquelas lideranças e a ironia frente aos poderes constituídos. Já citei inúmeras vezes como no PT se traduzia uma frase de Gramsci como mantra: é possível ser poder mesmo não sendo governo. A disputa das ideias, dos corações e mentes. Esta engenharia politica era possível em função da ligação que Lula fazia entre um projeto de esquerda e um jeito de ser e falar de operário, classe média baixa, povão. Lula atraía trabalhadores e classe média baixa como @s "menin@s de junho" atraem seus pares. Havia identidade e empatia.
Até que Lula perde uma eleição praticamente ganha, em 1989. Este fato mudou o PT e Lula. Por dentro. Como se um osso tivesse trincado. Uma dor que não se expunha. Lula decidiu ser governo. E liberou os "operadores" e burocratas, aqueles que se fizeram na política pelas portas dos fundos, não pelas ruas.
Ali, Lula fez a guinada: deixava de ser poder para ser governo.
E este é o drama do PT. Quem seguiu esta trilha, agora percebe que perdeu as ruas.
O governo Dilma Rousseff é a expressão maior desta inflexão. Dilma se esforça, não há como negar. Mas não tem carisma. E não tem a empatia com a base da sociedade. "Não é uma das nossas", dizem as beneficiárias do Bolsa Família. "Mas Lula sentiu na pele o que é ser pobre", completam.
Posso não saber cravar uma resposta clara para a pergunta de Bassoli. Possivelmente, @s menin@s de junho sairiam da mesma maneira. Mas os "iguais à Lula" se ofenderiam. Porque veriam nos manifestantes alguém de outra classe social. Sentiriam na pele, nas roupas que utilizam, na linguagem. Na sua mente, trabalhadores e beneficiários do Bolsa Família imaginariam Lula numa cadeira, tomando um gole de cachaça e refletindo o que os manifestantes, afinal, desejam. E ficariam entristecidos pelo tratamento que as ruas estariam dando ao seu igual, que um dia foi pobre e que demonstrou ao país que qualquer filho de operário pode, agora, chegar a ser a maior autoridade pública do país. A figura de Lula continua despertando a mesma projeção que se forjava na cabeça dos operários do ABC paulista nos anos 1980. Um igual. Sofredor como eles.
Já Dilma. Bem, Dilma é a imagem d@s menin@s de junho. Fala como eles falarão quando atingir a idade da Presidente. Dura como uma pedra. Ascética. Ninguém sabe se torce para algum time ou se bebe alguma bebida alcoólica. Alguém disse que ela deu umas voltas de motocicleta outro dia, em Brasília. Coisa que quem ganha Bolsa Família nem imagina fazer. Basta um toque na memória e logo vem à mente a imagem de Lula, ainda Presidente, de férias numa praia baiana, carregando uma caixa de isopor nos ombros, possivelmente cheia de geladinhas, como qualquer filho de Deus faz. Sem garçons, sem "cooler".
O que penso é que @s menin@s de junho têm sorte. Se o Presidente fosse Lula, não teriam espaço para tanta brincadeira. Mas, sem Lula, o PT e Dilma rasgam a empatia original que os fez chegar onde estão.
Uma ironia. Mas previsível.
PS: Antes que me ataquem pelo uso da ilustração, destaco que a montagem está disponível na internet. Para se ter uma ideia.
Para quem desejar adquirir o livro "Nas Ruas"
Acesse o site da Editora Letramento clicando AQUI . A ilustração acima indica o banner no site. Basta clicar e.... o resto você já sabe.
domingo, 16 de fevereiro de 2014
Depois do Black Bloc.... Reclaim the Streets
A grande imprensa não tem mais a capacidade de investigação que ainda era vista nos anos 1980 e parte dos 1990. Lembro de várias páginas dos jornalões de domingo com matérias especiais. Um mergulho na Serra Pelada ou dias do fotógrafo de campana para flagrar o novo designer de uma empresa automobilística. Os jornalistas especiais tinham espaço garantido.
Hoje, tudo é fast press.
Não dá para aprofundar, obviamente.
A grande imprensa não consegue entender o que é Black Bloc. Um menino chutando uma lata de cerveja vazia já é motivo de alerta. Qualquer camiseta no rosto é sinal do famoso bando de Lampião do Século XXI.
Mas, aí, @s menin@s continuam inventando. Continuam dando trabalho para os jornalistas.
Ontem, adotaram a tática do Reclaim The Streets (RTS). Veja a matéria, abaixo, do jornal Hoje em Dia.
Um movimento inglês (eles, outra vez) que nasceu em 1990, marcado pela ação anti-rodovias. São a favor do transporte público, das caminhadas e pedaladas. E odeiam carro. Sua tática é ocupar a rua em grandes confraternizações.
Ontem, em BH, foi apenas um aperitivo.
Em Londres, o centro da cidade foi diversas vezes fechado por raves ou até plantação de alimentos em parques, jardins e terrenos baldios. Para quem quer conhecer melhor, acesse AQUI
Hoje, tudo é fast press.
Não dá para aprofundar, obviamente.
A grande imprensa não consegue entender o que é Black Bloc. Um menino chutando uma lata de cerveja vazia já é motivo de alerta. Qualquer camiseta no rosto é sinal do famoso bando de Lampião do Século XXI.
Mas, aí, @s menin@s continuam inventando. Continuam dando trabalho para os jornalistas.
Ontem, adotaram a tática do Reclaim The Streets (RTS). Veja a matéria, abaixo, do jornal Hoje em Dia.
Um movimento inglês (eles, outra vez) que nasceu em 1990, marcado pela ação anti-rodovias. São a favor do transporte público, das caminhadas e pedaladas. E odeiam carro. Sua tática é ocupar a rua em grandes confraternizações.
Ontem, em BH, foi apenas um aperitivo.
Em Londres, o centro da cidade foi diversas vezes fechado por raves ou até plantação de alimentos em parques, jardins e terrenos baldios. Para quem quer conhecer melhor, acesse AQUI
Protesto irônico no Centro de BH para inagurar o Move
Cinthya Oliveira - Hoje em Dia
Samuel Costa/Hoje em Dia
Manifestantes do Tarifa Zero ocuparam a plataforma construída na Santos Dumont
Se o prefeito Marcio Lacerda não pôde inaugurar o Move neste sábado (15), um grupo de manifestantes fez isso, mesmo que de forma simbólica. Em protesto a mais um adiamento do início das operações do novo sistema de transporte público, cerca de 40 manifestantes do movimento Tarifa Zero ocuparam, por 20 minutos, a plataforma construída na avenida Santos Dumont, no Centro da capital.
A inauguração simbólica do Move aconteceu com músicas de protesto - em ritmos de marchinha, axé, samba e funk -, a abertura de uma cidra e um tapete vermelho. Um funcionário da BHTrans tentou evitar que os manifestantes expusessem uma grande bandeira, mas não conseguiu e convocou policiamento. A Guarda Municipal observou o protesto sem qualquer embate e os manifestantes foram embora assim que chegou a Polícia Militar.
"Fizemos uma inauguração simbólica e irônica porque a Prefeitura de Belo Horizonte vem adiando há muito tempo o início do Move", afirmou a estudante Ana Caroline Azevedo, de 19 anos. "Protestamos porque não há transparência sobre como serão as tarifas cobradas pelo sistema nem quais serão as linhas de ônibus que serão extintas com o Move. Esperamos ainda o resultado da auditoria pública que foi contratada em novembro do ano passado", completou.
Formado por cerca de 40 jovens, o movimento Tarifa Zero montou o bloco de Carnaval Pula Catraca!, que se concentra na rua Monte Alegre, na Serra, no dia 23 de fevereiro. A marchinha "Pula Catraca", criada pelos ativistas, ficou em segundo lugar no "3º Concurso de Marchinhas Mestre Jonas", realizado na noite de sexta (14), na quadra da Escola de Samba Cidade Jardim.
sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014
Rui Falcão e o apagar das luzes
Imagino que a quase totalidade dos brasileiros não se lembrará do nome dos presidentes dos partidos existentes em nosso país. Um cargo quase para consumo interno, portanto.
Mas no caso do PT, a regra deveria ser outra.
Primeiro, porque este partido já foi presidido por nada mais, nada menos, que Lula, o Presidente da República mais citado e discutido do período pós-regime militar.
Segundo, porque estamos tratando do partido que governa o país por 12 anos.
Rui Falcão é uma figura que me parece carregada, lúgubre.
Algo faz projetar o comissariado da Era Stálin. Estou me referindo à estética, o semblante, a cara de poucos amigos e certa desconfiança ou intolerância em relação a qualquer interlocutor. Não sei se foram os anos de VAR-Palmares, mas eu duvido. É que a dureza daqueles dias encarnou em muita gente que endureceu por dentro, pelo medo ou pela necessidade de ter um foco único e agudo, quase eliminando coisas e pessoas da paisagem. Os sentimentos tinham que ser absolutamente domados com ferro em brasa. O sangue lusitano se diluía e, com ele, tal como canta o Fado Tropical de Chico Buarque, o lirismo que herdamos da terrinha ficava cada vez mais opaco. "O meu coração fecha os olhos e sinceramente chora", dizia a música.
Rui Falcão foi o Presidente do PT que convocou a "onda vermelha". Mais adiante, um historiador sincero destacará esta proeza com toda gravidade que ela merece. Um erro político histórico. Grave.
Do alto de seu cargo de dirigente, já em outubro de 2012, Falcão postava:
Em meio às manifestações gigantescas convocadas por jovens em junho de 2013, o dirigente máximo do PT insistiu na convocação de outra "onda vermelha", agora nada virtual. Na convocação, foi além e disse que o PT não teria porque ter medo das ruas. Um equívoco locomotiva, com um vagão engatado no outro, numa fila sem fim de erros.
Convocar uma onda vermelha seria destacar os militantes no interior das manifestações que eram um verdadeiro mosaico de demandas e protestos. Mais: o PT é governo federal e governo na capital paulista. Não se trata mais, portanto, de um partido de protesto, mas o partido que dirige as mudanças desejadas pelas ruas. Se a população sai às ruas em protesto é sinal que seus governos não estão agradando aquela parcela da população que se manifesta. E é aí que o dirigente precisa ser maior que o militante. Tem a responsabilidade política de interpretar o fenômeno, analisar o que de errado ocorreu para criar tal descompasso partido/ruas e procurar reorganizar a tropa. Falcão fez exatamente o contrário: pensou com o fígado. Sabemos que tal operação exige um contorcionismo fisiológico. E colocou muitos militantes em risco porque, ao portarem suas camisetas e bandeiras, se destacavam da massa em protesto. Ao defender o legado dos governos petistas, era como se confrontassem (na melhor das hipóteses, desqualificassem) os que saíam às ruas. O que, afinal, os petistas ganhariam com tal peitada?
O desastre foi tão grande que a direção nacional do PT tentou se distanciar desta convocação estapafúrdia que desaguaria no dia 20 e gerou uma reação que por pouco não foi em cadeia. O diretório municipal do PT paulista (a capital mais polarizada ideologicamente do país), contudo, manteve a chamada aos militantes e em seu site piscava a orientação para os filiados vestirem vermelho para defenderem o legado dos governos federais petistas. Uma irresponsabilidade que, nesses dias em que um cinegrafista foi morto no interior de uma manifestação, devemos agradecer por não ter gerado uma tragédia de grandes proporções.
Rui Falcão, afinal, teria pensado nas consequências? A resposta define, evidentemente, a estatura política do personagem.
Ontem, contudo, Rui Falcão alterou o tom. Para o bem. Em meio à bancada petista do Senado (e alguns parlamentares da Câmara Federal) em pânico que sugeria a votação de uma lei fascista, conhecida como Lei Antiterror, o Presidente Falcão divulgou uma nova nota pública:
Mas ainda assim, fica a dúvida sobre a real capacidade dirigente de Rui Falcão. Os anos de foco nos acordos eleitorais teriam retirado de seu cargo a função de comandar bancadas e filiados? Não haveria um hiato entre a organização partidária e as funções eminentemente eleitorais?
O que teria ocorrido para a bancada petista do mais alto fórum parlamentar do país ter se desgarrado e perdido a cabeça num momento tão crucial para a condução pacífica - a partir de um crime cometido em meio aos protestos de rua que se avolumam no Brasil?
Fui analisar os programas de formação de filiados petistas para entender como o partido vem enfrentando a compactação entre papel dirigente e filiados de base.
Acessei vários documentos e vídeos.
E decidi comentar aqui um deles, o que leva o título de "Sobre a Reforma Política proposta pelo PT". Para melhor juízo do leitor, reproduzo o vídeo ao final desta nota. O vídeo utiliza técnicas de marketing: começa com o diálogo, num ônibus, de uma presumida militante petista e um jovem indignado, mas reflexivo. A militante começa a falar da proposta de reforma política e é retrucada pelo jovem indignado. Até que, num determinado momento, a militante faz a pergunta fatal: "você não sabia nada disto, né?". O discurso oficial interdita o diálogo a partir daí e o jovem indignado vai minguando e se curvando aos argumentos em cascata da militante. Nada menos freireano, que um dia foi filiado ao PT. Não há lacuna, não há diálogo, não há espaço para construção do conhecimento. Apenas, a velha e boa "educação bancária" em que o receptor é visto como saco vazio e o educador, um patamar acima na hierarquia social. O "doutor em política" vai apresentando uma enxurrada de informações e argumentos até que o receptor se torna.... a imagem refletida do "doutor". O PT foi criado justamente para se contrapor a este método que invalida a dúvida e a experiência alheia. Fiquei pensando no impacto deste conteúdo formativo. Que tipo de militante, afinal, está se propondo a formar? Um idólatra, imaginei.
Enfim, Falcão é um personagem de seu tempo.
Do tempo atual do PT.
Um partido que tem em suas fileiras gente que ao dar de cara com o AI-5, tomou um rumo muito mais grave que o dos manifestantes de hoje. Este mesmo partido, composto por gente que agiu assim no passado, é o que precisa dar um puxão de orelha em seus parlamentares tomados pelo pânico (espero, sinceramente, que não tenha sido oportunismo, mas pânico) num primeiro momento de conflito de ruas que não tem seu partido na vanguarda.
Um apagão ideológico ou de memória.
Um apagão partidário.
Um apagão na direção do partido.
Mas no caso do PT, a regra deveria ser outra.
Primeiro, porque este partido já foi presidido por nada mais, nada menos, que Lula, o Presidente da República mais citado e discutido do período pós-regime militar.
Segundo, porque estamos tratando do partido que governa o país por 12 anos.
Rui Falcão é uma figura que me parece carregada, lúgubre.
Algo faz projetar o comissariado da Era Stálin. Estou me referindo à estética, o semblante, a cara de poucos amigos e certa desconfiança ou intolerância em relação a qualquer interlocutor. Não sei se foram os anos de VAR-Palmares, mas eu duvido. É que a dureza daqueles dias encarnou em muita gente que endureceu por dentro, pelo medo ou pela necessidade de ter um foco único e agudo, quase eliminando coisas e pessoas da paisagem. Os sentimentos tinham que ser absolutamente domados com ferro em brasa. O sangue lusitano se diluía e, com ele, tal como canta o Fado Tropical de Chico Buarque, o lirismo que herdamos da terrinha ficava cada vez mais opaco. "O meu coração fecha os olhos e sinceramente chora", dizia a música.
Rui Falcão foi o Presidente do PT que convocou a "onda vermelha". Mais adiante, um historiador sincero destacará esta proeza com toda gravidade que ela merece. Um erro político histórico. Grave.
Do alto de seu cargo de dirigente, já em outubro de 2012, Falcão postava:
Alô, alô militância – A campanha na internet continua, vamos fortalecer a #Ondavermelha
No dia 20 de junho, uma nota da direção nacional, assinada por Rui Falcão, trazia conteúdo similar:Do PT Nacional – As manifestações realizadas em todo o País comprovam os avanços democráticos conquistados pela população. São manifestações legítimas e as reivindicações e os métodos para expressá-las integram o sistema democrático.
É papel dos partidos, do Congresso e dos Governos em todos os níveis dialogar com estas aspirações.
As transformações promovidas no Brasil nos últimos 10 anos, pelos Governos Lula e Dilma – com a ascensão social de 40 milhões de pessoas, a redução das desigualdades sociais, a geração de mais de 20 milhões de empregados com carteira assinada, o ingresso de milhões de jovens nas universidades, a ampliação de oportunidades para todos, enfim o surgimento de um novo País – colocam na ordem do dia uma nova agenda.
Avançamos e podemos avançar ainda mais. Na área de mobilidade urbana, que agora catalisa manifestações em centenas de cidades, várias conquistas ocorreram em governos do PT, como o Bilhete Único, pelo Governo Marta em São Paulo, que resultou na redução de 30% no custo do sistema. Bilhete este que será agora ampliado pelo prefeito Fernando Haddad, com validade mensal e novos ganhos para os usuários que ainda serão beneficiados com a decisão da abertura de corredores e duplicação de importantes vias de acesso à periferia.
O Governo Dilma, que destinou R$ 33 bilhões para o PAC da Mobilidade Urbana, editou Medida Provisória que zerou as alíquotas de PIS/PASEP e Cofins incidentes sobre as empresas operadoras de transporte coletivo municipal rodoviário, metroviário e ferroviário de passageiros, possibilitando a redução das tarifas.
O PT saúda, pois, as manifestações da juventude e de outros setores sociais que ocupam as ruas em defesa de um transporte público de qualidade e barato.
Estamos certos de que o movimento saberá lidar com atos isolados de vandalismo e violência, de modo que não sirvam de pretexto para tentativas de criminalização por parte da direita. Nesse sentido, repudiamos a violência policial que marcou a repressão aos movimentos em várias praças do País, sobretudo em São Paulo, onde cenas de truculência, inclusive contra jornalistas no exercício da profissão, chocaram o País.
A presença de filiados do PT, com nossas cores e bandeiras neste e em todos os movimentos sociais, tem sido um fator positivo não só para o fortalecimento, mas, inclusive, para impedir que a mídia conservadora e a direita possam influenciar, com suas pautas, as manifestações legítimas.
A insatisfação de parcelas da juventude em relação às instituições e aos partidos políticos revela a necessidade de uma ampla reforma do sistema político e eleitoral em defesa do que vêm se batendo o PT e outras organizações da sociedade.
Do mesmo modo, as manifestações têm mobilizado sua inconformidade contra o tratamento dado pelo mídia conservadora aos movimentos, inclusive pelo fato de, num primeiro momento, ter criticado a passividade da polícia.
Diante das demandas por transporte de melhor qualidade e barato, o Diretório Nacional do PT recomenda aos nossos governos que encontrem uma resposta necessária, que, no curto prazo, reduza as tarifas de transporte e, num médio prazo, em conjunto com os governos estadual e federal e com ampla participação popular, discuta soluções para um novo financiamento público da mobilidade urbana.
A direção do PT conclama a militância a continuar presente e atuante nas manifestações lado a lado com outros partidos e movimentos do campo democrático e popular.
São Paulo, 19 de junho de 2013.
Rui Falcão
Presidente Nacional do PT
Em meio às manifestações gigantescas convocadas por jovens em junho de 2013, o dirigente máximo do PT insistiu na convocação de outra "onda vermelha", agora nada virtual. Na convocação, foi além e disse que o PT não teria porque ter medo das ruas. Um equívoco locomotiva, com um vagão engatado no outro, numa fila sem fim de erros.
Convocar uma onda vermelha seria destacar os militantes no interior das manifestações que eram um verdadeiro mosaico de demandas e protestos. Mais: o PT é governo federal e governo na capital paulista. Não se trata mais, portanto, de um partido de protesto, mas o partido que dirige as mudanças desejadas pelas ruas. Se a população sai às ruas em protesto é sinal que seus governos não estão agradando aquela parcela da população que se manifesta. E é aí que o dirigente precisa ser maior que o militante. Tem a responsabilidade política de interpretar o fenômeno, analisar o que de errado ocorreu para criar tal descompasso partido/ruas e procurar reorganizar a tropa. Falcão fez exatamente o contrário: pensou com o fígado. Sabemos que tal operação exige um contorcionismo fisiológico. E colocou muitos militantes em risco porque, ao portarem suas camisetas e bandeiras, se destacavam da massa em protesto. Ao defender o legado dos governos petistas, era como se confrontassem (na melhor das hipóteses, desqualificassem) os que saíam às ruas. O que, afinal, os petistas ganhariam com tal peitada?
O desastre foi tão grande que a direção nacional do PT tentou se distanciar desta convocação estapafúrdia que desaguaria no dia 20 e gerou uma reação que por pouco não foi em cadeia. O diretório municipal do PT paulista (a capital mais polarizada ideologicamente do país), contudo, manteve a chamada aos militantes e em seu site piscava a orientação para os filiados vestirem vermelho para defenderem o legado dos governos federais petistas. Uma irresponsabilidade que, nesses dias em que um cinegrafista foi morto no interior de uma manifestação, devemos agradecer por não ter gerado uma tragédia de grandes proporções.
Rui Falcão, afinal, teria pensado nas consequências? A resposta define, evidentemente, a estatura política do personagem.
Ontem, contudo, Rui Falcão alterou o tom. Para o bem. Em meio à bancada petista do Senado (e alguns parlamentares da Câmara Federal) em pânico que sugeria a votação de uma lei fascista, conhecida como Lei Antiterror, o Presidente Falcão divulgou uma nova nota pública:
O Partido dos Trabalhadores acompanha com atenção os debates no Congresso Nacional sobre a adoção de uma legislação antiterror, especificamente no cenário das manifestações que têm ocorrido no País.Entretanto, o PT não pode aceitar qualquer texto legal que não tipifique - com clareza, objetividade e precisão - crimes eventualmente ocorridos no contexto dessas manifestações. Uma lei vaga nessa caracterização penal atenta contra os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição e poderia servir à criminalização de movimentos sociais, o que seria um inaceitável retrocesso democrático. Em que pese nenhum parlamentar seu estar ligado à autoria de projetos dessa natureza, o PT acha que o Brasil precisa aperfeiçoar seus textos legais com vista a ter dispositivos cíveis e penais que coíbam atos contra o patrimônio público, o patrimônio privado e, principalmente, a integridade das pessoas, provocados por aqueles que se aproveitam de legítimas manifestações populares para cometer ações de violência.
Com a proximidade da Copa, a sociedade brasileira exige segurança para exercer seus direitos de liberdade de expressão, de pensamento e de reunião. O Poder Público necessita de um marco legal atualizado para lidar com novas situações que ocorram nesses eventos.
Por isso, o PT tem orientado seus parlamentares a terem o máximo cuidado com projetos dessa natureza para que uma lei em defesa da sociedade não se transforme em lei contra a sociedade.
Rui Falcão
Presidente nacional do PT
OP
Ao menos, o bom senso imperou desta vez.Mas ainda assim, fica a dúvida sobre a real capacidade dirigente de Rui Falcão. Os anos de foco nos acordos eleitorais teriam retirado de seu cargo a função de comandar bancadas e filiados? Não haveria um hiato entre a organização partidária e as funções eminentemente eleitorais?
O que teria ocorrido para a bancada petista do mais alto fórum parlamentar do país ter se desgarrado e perdido a cabeça num momento tão crucial para a condução pacífica - a partir de um crime cometido em meio aos protestos de rua que se avolumam no Brasil?
Fui analisar os programas de formação de filiados petistas para entender como o partido vem enfrentando a compactação entre papel dirigente e filiados de base.
Acessei vários documentos e vídeos.
E decidi comentar aqui um deles, o que leva o título de "Sobre a Reforma Política proposta pelo PT". Para melhor juízo do leitor, reproduzo o vídeo ao final desta nota. O vídeo utiliza técnicas de marketing: começa com o diálogo, num ônibus, de uma presumida militante petista e um jovem indignado, mas reflexivo. A militante começa a falar da proposta de reforma política e é retrucada pelo jovem indignado. Até que, num determinado momento, a militante faz a pergunta fatal: "você não sabia nada disto, né?". O discurso oficial interdita o diálogo a partir daí e o jovem indignado vai minguando e se curvando aos argumentos em cascata da militante. Nada menos freireano, que um dia foi filiado ao PT. Não há lacuna, não há diálogo, não há espaço para construção do conhecimento. Apenas, a velha e boa "educação bancária" em que o receptor é visto como saco vazio e o educador, um patamar acima na hierarquia social. O "doutor em política" vai apresentando uma enxurrada de informações e argumentos até que o receptor se torna.... a imagem refletida do "doutor". O PT foi criado justamente para se contrapor a este método que invalida a dúvida e a experiência alheia. Fiquei pensando no impacto deste conteúdo formativo. Que tipo de militante, afinal, está se propondo a formar? Um idólatra, imaginei.
Enfim, Falcão é um personagem de seu tempo.
Do tempo atual do PT.
Um partido que tem em suas fileiras gente que ao dar de cara com o AI-5, tomou um rumo muito mais grave que o dos manifestantes de hoje. Este mesmo partido, composto por gente que agiu assim no passado, é o que precisa dar um puxão de orelha em seus parlamentares tomados pelo pânico (espero, sinceramente, que não tenha sido oportunismo, mas pânico) num primeiro momento de conflito de ruas que não tem seu partido na vanguarda.
Um apagão ideológico ou de memória.
Um apagão partidário.
Um apagão na direção do partido.
quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014
Minha entrevista sobre Black Blocs
A manchete vai além do que disse. E há dois pequenos erros (não me referi a movimentos do século 20 ao responder a segunda pergunta, mas século 21; e não acredito que o rapaz que preparou o torpedo que atingiu o cinegrafista seja Black Bloc). Mas o "conjunto da obra" é fiel ao que penso. Estou preocupado com este clima de oba-oba pré-eleitoral que procura diminuir ao máximo os espaços para situações imponderáveis. A história da lei fascista (a tal anti-terrorista) em função de um crime cometido no Rio de Janeiro e que pretendem nacionalizar como risco à Nação ao menos contou com a postura firme de Nilmário Miranda, afirmando que o Brasil não precisa de novo AI-5. Gente com história para resguardar age assim.
Rudá Ricci: Atos violentos desmentem manual black bloc
Renata Galdino - Hoje em Dia
Eugênio Moraes/Hoje em Dia
“O tempo inteiro há manifestações dentro das periferias das grandes cidades”, lembra Rudá
O mundo inteiro está de olho no Brasil no que diz respeito às manifestações registradas no país nos últimos meses. O que seria algo pacífico, ganhou um grau de violência e hoje ocupa as discussões. Na última quarta-feira (12), no programa “Central 98”, na rádio 98 FM, o cientista político Rudá Ricci abordou o assunto. Alguns trechos da entrevista você confere a seguir:
Pelo o que vimos das manifestações do ano passado para cá, o “Gigante” realmente despertou ou os atos perderam o foco?
Ele nunca dormiu. O tempo inteiro há manifestações dentro das periferias das grandes cidades, lutas pela questão da terra, por qualidade de vida.
Mas estão bem diferentes, maiores...
Dessa vez os jovens saíram de novo às ruas. A diferença entre os manifestantes de agora e os do século 20 é que os atuais não são organizados sob uma liderança. Cada um participa se percebe que não vai ser usado por alguém. Ao falar de jovens na multidão, fala-se de adrenalina pulsando dentro dele. Manifestação com a juventude é uma situação específica e exige muita preparação técnica da polícia.
No Brasil, as manifestações têm um poder de mudança ou só existem para mostrar que a sociedade está indignada?
Infelizmente, da forma como estão ocorrendo, elas não mudam a estrutura de poder, mas demonstram o que o país pensa. Isso ocorreu nas manifestações pelo mundo todo no século 20. Nas mais interessantes, eles mudaram a Constituição e derrubaram o governo. Dois anos depois, quem saiu voltou pela eleição. Esse tipo de organização e manifestação na rua não tem proposta política, não muda a estrutura. É como se eu estivesse reclamando e não me cobrar pela responsabilidade de mudar o que eu não quero. É como chegar até a porta e não entrar.
Pode-se dizer que há quatro perfis de manifestantes: o cidadão que vai para reivindicar algo, o jovem da periferia cansado de ser desrespeitado pela polícia, o black bloc que solta morteiro...
Black bloc não solta morteiro. No caso do cinegrafista, o suspeito de ter atirado o rojão disse que não usa a tática. Acho muito estranho se ele fizer parte dessa ação. Mas vamos ver, pode ser que realmente seja. E quem praticou crime tem que pagar por isso.
E falam também do crime organizado infiltrado nos protestos...
Isso está mais forte no Rio de Janeiro, mas em Belo Horizonte houve alguns deles no dia 26 de junho. Aproveitam os manifestos para, armados, atacar a polícia.
Qual a diferença entre black blocs e os manifestantes?
Os dois são manifestantes. Na verdade, o primeiro não é um grupo. É um manual tipo “faça você mesmo”, leia e, se quiser, use a tática.
Você conversou nos últimos meses com vários adeptos ao black bloc. Quais as táticas deles?
No manual é informado como agir. Todos vestem roupas pretas (as cores do anarquismo) e se postam na frente dos manifestantes, não deixando a polícia avançar. A segunda ação é contra empresas que, na opinião deles, exploram trabalhadores e animais.
E por que a violência?
Eles respondem que não são violentos, não atacam pessoas. Atacam, no máximo, a fachada de uma empresa.
Mas isso não é violência?
Eles não atacam pessoas.
Por causa de prejuízos por conta das depredações, alguns empresários tiveram que demitir funcionários. Não acaba sendo uma violência contra o trabalhador? E a depredação, violência?
O resultado disso vai afetar a vida das pessoas, mas na apostila há o princípio de não atacar vida humana. É obvio que eu acho que uso de violência contra vidro não tem sentido. Na política, o resultado foi catastrófico toda vez que houve um ato violento para mudar uma situação do país.
E os justiceiros, homens comuns agindo por conta própria contra criminosos? Casos no Rio de Janeiro e em Fortaleza...
Eles fazem de maneira pior o que o rapaz fez com o rojão que matou o cinegrafista, no Rio. É crime e os justiceiros têm que ir para a cadeia, e rápido. Quem tem poder para prender um ladrão é a polícia. Não é cada um com a sua mão.
Assinar:
Postagens (Atom)