COPA, PM E DETENÇÃO
Ontem, em SP, ocorreu o segundo ato de contestação à Copa do
Mundo no Brasil. Protesto muito justo, afinal se gasta montanhas com obras
faraônicas sem retorno social, enquanto os direitos sociais são parcos.
A manifestação contou com um contingente enorme de
policiais, incluindo a “tropa do braço”. Saímos pacificamente da Praça da
República em direção da Praça Roosevelt, viramos à esquerda na Consolação,
sentido o Theatro Municipal. Quando chegamos à altura do metrô Anhangabaú,
ainda não sei explicar o porquê, começou um empurra-empurra mais ou menos no
meio da passeata. Eu e outros grandes amigos estávamos à frente, quando ao
percebermos que a confusão iria se alastrar rapidamente. Não fomos rápidos o
suficiente. Ao corrermos, entramos em um corredor polonês sem saída formado por
duas colunas de policiais militares, que de modo mais do que violento,
comprimiram dezenas de manifestantes (lembremos: estes manifestantes sequer
souberam a razão do conflito) à base de cacetadas, escudadas e spray de
pimenta. Um verdadeiro show de democracia e civilização.
Sob berros ameaçadores, fomos obrigados a sentar no meio da
Xavier de Toledo, um em cima dos outros devido à falta de espaço físico. Quem
levantasse, era lembrado de que deveria ficar sentado com sutis cacetadas, que
foi o meu e o caso de muitos outros. Questionar? Fora de cogitação. Um
policial, no auge da sinceridade, bradou “aqui não há democracia por que vocês
estão detidos”. Claro. Democracia e detenção são termos necessariamente
opostos, pelo na visão da Polícia Militar de São Paulo.
Ficamos ali sentados por duas horas e pouco, de baixo de
chuva. Alguns foram liberados, em especial os que não pareciam “ameaçadores”.
Um oficial falou com todas as letras: “quem tiver referência a movimento
social, será levado para a DP”.
Imagino que o tal oficial levou bem o manual das forças
armadas, que demonstra como lidar com as ‘forças oponentes do Estado’. Médici
deu três mortais para trás de felicidade quando ouviu o policial bem treinado.
Durante todo o tempo na rua, não fomos informados do que se passava, quanto
tempo ficaríamos ali e qual seria o procedimento. Pode o Estado Brasileiro
sequestrar cidadãos por duas horas sob chuva sem ao menos dizer o que estava
acontecendo?
Dei azar e fui levado à delegacia. No ônibus, que horror! Os
policiais são inacreditavelmente mal formados. Reproduzem valores e frases
consolidados na ditadura militar. Provocavam os manifestantes. Insinuavam
abertamente forjar prova contra manifestantes que os irritassem. E isso o tempo
todo e não só no ônibus.
Cantavam as palavras de ordem das manifestações. Um lembrou
de uma: “gambé cuzão, larga a arma e vem na mão”. E em seguida disse “e aí? Não
é isso que vocês cantam? Vem pro pau agora, seus pau no cú? Não aguentam nem um
tapa na cara?”. Ligaram o rádio do ônibus e disseram inaugurar a ‘balada black
bloc’. Tocou Rita Lee.
Fui preso ao som da Rita Lee.
Na delegacia, mais chá de cadeira. Perguntávamos aos
policiais civis qual seria o procedimento e nos respondiam com ironia. As
provocações não cessavam.
O ponto mais inacreditável foi quando uma voz, que não sei
da onde partiu, disse “esse folgado devemos mandar para a sala do choque”. Me
senti muito mal por ouvir isso. Não por acreditar que alguém seria torturado
ali, mas por ter claro naquele momento que o Estado Brasileiro ainda tortura
seres humanos.
Por volta das 23 e 30, chegou um advogado que me tirou da
detenção para averiguação. Não sabia se era o Horácio Neto ou a Virgem Maria.
Fui detido com outros grandes amigos, que absolutamente nada
fizeram. Yuri Scardino, Izaque Jacob e Samuel Jacob, saibam que eu tenho muito
orgulho de ter vocês ao meu lado.
Tudo isso ocorreu porque ousamos questionar a Copa. De fato,
a questão social no Brasil ainda é vista como caso de polícia. Aliás, uma
polícia que age por fora da lei, que é imoral, ilegal e ilegítima. Mais
importante: uma polícia que não pode existir. Uma polícia que promove mais
violência e atentados contra os direitos humanos. Fora PM do mundo!
A melhor resposta que podemos dar é continuar nas ruas. Não
devemos nos intimidar. Não devemos aceitar o atual estado de coisas. “É preciso
não ter medo. É preciso ter coragem dizer”.
Aos amigos que se preocuparam, muito obrigado. A
solidariedade das pessoas foi muito grande. Nos solidarizemos cada vez mais com
as causas de todas pessoas.
5 comentários:
Um militante do PSOL dando o depoimento, agora falta o outro lado.
Qual outro lado Jr? De um PM. Mas não está acompanhando quantos PMs não cumprem ordens e são punidos? Não está acompanhando a orientação dos comandos?
Acho engraçado, um partido que prega Socialismo com Democracia. Será que não passa na cabeça deles, que tem gente que quer a Copa? Não vai ter Copa é democrático? No discurso é tudo muito bonito. Mas gostaria de saber do PSOL, pq até hoje não implantou o passe livre para TODOS em Macapá.
Implicância,
Qual o problema de um partido fazer campanha contra a Copa? Se a maioria quer, menos problema ainda. Acho que você confunde o que é democracia. É justamente isto: independente da maioria, qualquer um pode fazer campanha. Não estão difamando ninguém, nem é imoral.
"Nunca antes na história deste país" se reprimiu tanto. O Povo sai às ruas protestando contra os gastos excessivos do governo com a Copa, em detrimento de ações sociais mais efetivas, e a Polícia age com uma truculência incomum. Não entendo mesmo, pois o governo do PT não deveria, por uma questão de coerência, priorizar o Social em vez de favorecer o Capital? Porque o PT permite que as Forças públicas ajam contra o Povo, quando deveria apoiá-lo? Ou estaria o Povo sendo injusto ao protestar contra a péssima gestão dos recursos públicos? Rudá, me desculpe, mas você demonstra confusão. Ou você se coloca ao lado do Povo ou ao lado do poder público. Lembre-se que a Polícia é um órgão público que age em cumprimento de ordens emanadas do governo. Note: quem gerencia mal os recursos públicos e esbanja com a Copa é o PT e a Polícia, mesmo sendo estadual, mete o cacete no Povo é porque o PT assim o deseja. Do contrário, intercederia em favor do Povo.
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