terça-feira, 7 de setembro de 2010

7 de setembro é uma invenção política

Do Estadão:
Quando se deu realmente a Independência do Brasil? Porque, quando consultamos os jornais de 1822, não há nenhuma referência ao que se passou nas margens do Ipiranga em 7 de setembro? Porque aquele episódio foi escolhido em detrimento de outros, quando sabe que, em 1822, a data tomada como marco da Independência foi o 12 de outubro, dia do aniversário de dom Pedro I e de sua aclamação como imperador? Essas e outras questões foram respondidas, em artigo de enorme valor acadêmico, porém pouco conhecido, publicado em 1995, pela historiadora Maria de Lourdes Viana Lyra, sócia titular do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Intrigada com o silêncio da documentação e das publicações do ano de 1822 sobre o 7 de setembro, Lourdes Lyra devassou essa história e estabeleceu ponto por ponto o processo e os interesses envolvidos na escolha do 7 de setembro como data da Independência. Um ponto que merece realce é que os documentos que supostamente dom Pedro I teria lido às margens do Ipiranga no dia 7 só teriam chegado ao Rio de Janeiro em 22 de setembro. Outro é que o primeiro relato detalhado do episódio do Ipiranga só foi publicado em 1826, em momento de desprestígio do imperador diante dos brasileiros que tinham feito a Independência e que se indignaram com as bases do tratado assinado com Portugal. A Inglaterra, que representou junto à Corte do Rio de Janeiro seus próprios interesses e os da Coroa portuguesa, pressionara o imperador. Dom Pedro foi convencido a aceitar que, no tratado pelo qual Portugal reconhecia a nossa Independência, ao contrário de todos os documentos do ano de 1822 que a davam como uma conquista dos brasileiros, constasse que esta nos fora concedida por dom João VI. Este era também reconhecido como imperador do Brasil que abdicava de seus direitos ao trono em favor do filho e ao qual ainda tivemos de pagar vultosa indenização. O patente interesse de dom Pedro em conservar seus direitos à sucessão do trono de Portugal, que essa fórmula do tratado revelava, apontava no sentido de uma posterior reunificação dos dois reinos. Um príncipe que se declarara constitucional, que desde o Fico (9 de janeiro de 1821) vinha sendo aclamado até pelos setores mais liberais, que rompera com Lisboa e convocara eleições para uma Assembleia Constituinte, tão amado que recebera da Câmara o título de Defensor Perpétuo do Brasil, fora pouco a pouco se convertendo num tirano. Primeiro, ao dissolver a Assembleia Constituinte, depois, pela forma violenta com que reprimiu a Confederação do Equador e, finalmente, pela assinatura do vergonhoso tratado.
É nesse contexto que a escolha do 7 de setembro como data da Independência ganha sentido. Segundo Lourdes Lyra, até então tinham sido consideradas as seguintes datas decisivas para o processo: o 9 de janeiro, dia do Fico; o 3 de maio, dia da inauguração da Assembleia Constituinte Brasileira; e o 12 de outubro, dia da Aclamação. Foi o esforço concentrado do Senado da Câmara (atual Câmara Municipal) do Rio de Janeiro, durante o mês de setembro de 1822, enviando mensagem à Câmaras das principais vilas do Brasil - num tempo em que eram as vilas e cidades as instâncias decisivas da política portuguesa -, que fez com que, na fórmula consagrada, constasse que dom Pedro fora feito imperador pela "unânime aclamação dos povos". Foi o apoio das Câmaras e de setores da elite e do povo do Rio de Janeiro, de São Paulo e de Minas Gerais que deu forças ao príncipe para se contrapor às decisões de Lisboa.

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