Artigo publicado no Jornal da Tarde de 14/08/2010, caderno Cidades
Vandalismo, a maior queixa das escolas
Levantamento aponta os problemas destacados por profissionais das escolas municipais de SP
ISIS BRUM
isis.brum@grupoestado.com.br
Ameaça, furto e vandalismo são os tipos de violência mais frequentes nas escolas municipais de São Paulo, de acordo com o estudo Retrato da Rede 2010, realizado pelo Sindicato dos Gestores Educacionais de São Paulo (Sinesp) em parceria com o Instituto TV Cultiva, em 2009, e divulgado neste ano. Entre as unidades distribuídas em 31 subprefeituras, dez delas relataram sofrer com ameaças, nove com furtos e oito com atos de vandalismo, violência que atingiu o maior porcentual: 31% dos entrevistados a relataram em Perus, na zona norte. A Secretaria Municipal de Educação informou que enfrenta o problema com ações como ampliação do horário de permanência do aluno na escola e atividades de lazer com a participação dos pais.
As reclamações foram feitas por uma amostra de 418 profissionais da educação, entre diretores, assistentes de direção e coordenadores pedagógicos da rede municipal e os resultados refletem a situação vivida no ambiente escolar.
A agressão física – a forma mais grave de violência escolar – apareceu em três regiões. A subprefeitura de Vila Mariana, na zona sul, é a segunda no ranking de maior incidência desse tipo de violência, juntamente com o bullying – 16,7% dos entrevistados da região relataram ter presenciado situações de violência física e humilhações.
Para uma coordenadora pedagógica da rede, que pediu para não ser identificada, a situação mais grave do dia a dia é lidar com alunos armados. Geralmente, são estudantes em liberdade assistida (programa da Fundação Casa para reinserir socialmente menores que cometem delitos) ou dos cursos noturnos para jovens adultos (EJA). “Eu já convenci aluno do EJA a me entregar a arma com a qual ele queria matar a professora de Geografia”, conta a educadora, de 47 anos, dos quais 28 dedicados ao ensino público. “A gente sai de casa e não sabe se volta”.
Para uma diretora de uma escola da zona norte, a depredação do patrimônio público é um dos piores problemas de sua unidade. Na análise da educadora Silvia Colello, da Faculdade de Educação da USP, “a escola incorpora valores e tensões da sociedade, mas também gera e fomenta sua própria forma de violência”. Para Silvia Colello, “o aluno, muitas vezes, encontra autoritarismo, professores descompromissados, que faltam o tempo todo, uma escola feia e um ensino que não diz nada para sua vida”.
“A violência contra o patrimônio mostra como o aluno não tem vínculo com a instituição e o quanto não se sente bem naquele espaço”, diz Silvia. Um exemplo disso é a depredação do CEU Três Pontes, na zona leste, alvo de vandalismo em janeiro, após sofrer com o alagamento crônico do entorno.
“Se a instituição não dá nem chance para os filhos de uma determinada comunidade obterem uma vaga, que relação essas pessoas vão ter com a escola?”, questiona o sociólogo Moisés Batista, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP.
Preocupado com os entraves que dificultam o funcionamento da rede, Batista acredita que a reversão desse quadro começa com cada unidade revendo seu projeto político-pedagógico. Na mesma linha, Silvia defende que as escolas abordem os problemas de violência interna, descubram os motivos que levam a ela e proponha soluções específicas para sua unidade.
Presidente do Sinesp, João Alberto Rodrigues de Souza espera que o documento seja discutido pela Prefeitura e ajude a melhorar o cotidiano dos educadores.
Sindicato pretende criar um índice da violência em 2011
Este é o quinto ano em que o estudo ‘Retrato da Rede’, do Sinesp, é elaborado, mas é apenas a segunda vez que o levantamento é quantificado de acordo com métodos científicos. A ideia dos dirigentes do Sinesp é, só a partir do ano que vem, divulgar dados comparativos de um ano para o outro e, dessa forma, formatar um índice da violência escolar com base nos relatos colhidos pelo sindicato.
A entidade representa diretores de escolas, supervisores e coordenadores pedagógicos da rede municipal da capital. O questionário sobre violência é aplicado a esses profissionais. O Sinesp tem um representante para cada subprefeitura da cidade.
Maior participação dos pais ajuda
Ampliação dos turnos diurnos de permanência nas escolas e a realização de atividades de lazer nas unidades, inclusive aos sábados, e com a participação dos pais, são duas estratégias de combate à violência adotadas pela Secretaria Municipal de Educação, de acordo com nota enviada por sua assessoria de imprensa.
Atividades pedagógicas, como passeios monitorados a museus e teatros, distribuição de guias anti-drogas para alunos e professores e palestras dadas por policiais militares e guardas civis sobre o consumo entorpecentes também fazem parte das ações da pasta para reduzir os índices de violência em suas unidades.
Para a SME, o desgaste que os educadores alegam sentir no ambiente escolar deve-se mais “à dificuldade em lidar com conflitos originados num ambiente cada vez mais heterogêneo”, já que a rede cresceu “significativamente nos últimos 20 anos”. “O fato de alguns alunos terem dificuldades no aprendizado, por exemplo, pode gerar frustração em estudantes e professores”, informa a nota.
Condições melhoraram
Os profissionais ouvidos pela reportagem e o próprio sindicato afirmam ser, além da violência, burocracia, falta de infraestrutura e valorização do educador, ao contrário do que destaca a secretaria.
De acordo com o órgão, os salários foram reajustados em 40,9% e receberão mais 33,79% nos próximos três anos. “As condições físicas das escolas melhoraram muito nos últimos anos, com reformas parciais ou totais em todas as unidades.
Vem crescendo também o suporte pedagógico que é dado aos professores, como a adoção das Orientações Curriculares, o segundo professor em sala de aula e o uso dos Cadernos de Apoio e Aprendizagem, melhorando e facilitando assim o trabalho dos educadores”, aponta a pasta.
Também de acordo com as informações da assessoria da secretaria, contribuíram para a melhoria das condições de trabalho dos professores “a autonomia dada às escolas da rede municipal de ensino, a adequação da jornada do professor à do aluno, a garantia de cinco horas de aula por dia e a premiação por desempenho”. Para o órgão, estes são mais alguns dos benefícios conquistados pelos profissionais da educação.
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